Sobre uma das facetas do Desejo
No pensamento vivo da mente que deseja ardentemente alguma coisa, não existe desesperança. Mesmo que a busca não resulte em nada, dia após dia, ano após ano, o desejo está ali, escondido, mandando memorandos insistentemente para que não haja desistência.
A procura por lugares-comuns ao desejo insano, torna os primeiros anos insuportáveis. Cada vez mais atento ao menor sinal de um começo de realização, os níveis de adrenalina sobem tanto que a tontura e o mal estar tomam conta do corpo.
Começar a conhecer esse desejo surdo, após tantos revezes, é um desculpar-se à vida, por tanto tempo perdido. Abrir a cabeça e engolir as teorias sem pensar em criar especulações, a teoria nua e crua, a esperança de amansar esse monstro que insiste em vir para fora num rompante qualquer. Esse desejo empedernido já não tem luz alguma, mas é tão forte que a boca não fala mais e na tentativa imunda de esquecer, ele toma corpo e se funde na alma.
Tão fundido na lama das entrelinhas, adormece como um bicho acuado. Enlouqueceu no silêncio do aprendizado autodidata, alegrou-se nas palavras de desconhecidos e esperou.
A sandice insurgida deu lugar à calmaria doente. Apático e sem forças para lutar, continuou esperando.
Acostumado ao hábito do desejo não realizado, acontece o que mais temeu: O piscar de luzes da concretização do ideal estava muitíssimo longe, mas estava lá e visualizou o monstro esperançoso levantar-se do sono invernal.
Tão quieto ficou quando finalmente o desejo ardente e inumano chegou aos seus olhos, uma pálida luz tornou-se estrela guia de sua alma sofrida.
Esqueceu porque desejou.
E desejou o esquecimento.
Saiu com os olhos vendados, alma de minha alma, a outra parte de ti desejou que nunca tivesse desejado, porque saiu dali confiando no desejo.
A outra parte chorou lágrimas sufocantes porque o entregou sem lutar. Porque o deixou partir para sempre.