Salve o leão

O que se pode acrescentar ao mundo psicológico do homem culto? Os saberes que temos não estão de todo ultrapassados. Nossos sábios ainda têm muito valor. São tantos livros produzidos que não há quem os possa absorver. Alguns são irrelevantes, outros desnecessários, já outros são obrigatórios.

O papel de um escritor, a meu ver, deve ser não apenas distrair ou confundir o leitor. E quais são os livros que distraem? São aqueles que o leitor não compreende. E os que confundem? São aqueles que o leitor não tem intelecto suficiente para tirar o proveito correto, como os dos grandes pensadores. Os pensamentos dos sábios do passado não podem ser aceitos por uma humanidade que a cada dia perde sua referência moral. Não há prazer em adquirir conhecimento para aqueles que não têm capacidade para aplicá-lo na vida prática. Por isso, os poucos que dizem gostar de boa leitura lêem livros santos ou místicos, no máximo os de auto-ajuda.

O homem está no cadafalso e o que lhe resta de inteligência foi condenada à morte lenta. O que deve ser feito para resgatar os homens do abismo da ignorância e da automutilação? Tudo já foi dito: buscai o autoconhecimento para auto-aceitação. Todavia, a pouco, digo há dois mil anos, os homens tentavam descobrir o que sabiam e o que pensavam seus vizinhos de outro continente. Hoje, porém, não há mais esta curiosidade social natural dos primatas. Agora queremos apenas consumir e usufruir os prazeres dos nossos irmãos de terras longínquas (globalização). Perdemos o interesse até pelo que se tinha outrora, como o céu, por exemplo (religião). Os mitos não nos causam mais perplexidade nem reverência. Estão todos mortos e os ídolos não nos influenciam mais. Descobrimos até o que não há em outros planetas. Sabemos o enigma do DNA. Somos capazes de produzir a vida em laboratórios, mas optamos por produzir a morte em tolas guerras. Temos agora um interesse além do incomum pela tragédia, a comédia dos nossos co-autores perdeu a graça. Mesmo hoje, depois de tanto estudo e evolução científica, nos embriagamos com orgias naturais como faziam os governantes romanos há dois milênios. Só as trocamos pelo carnaval.

Os poderosos não buscam a poesia ou a filosofia como fazia Marco Aurélio e outros sábios gregos. O poder não tem poder para se autogovernar. Os grandes homens querem a melancolia do fim da tragédia, o caos para terem do que se lamentar no futuro.

O homem é um animal inconformado com seu instinto, por isso persiste na crença de que possui a caixa de pandora, um poder mágico para criar e destruir com a mesma intensidade, com máxima inteligência. Todavia o instinto natural só pode destruir.

Se fores humano, prove-me o contrário. Digo, não com discurso, precisamos de ação. Salvemos o leão que habita dentro do homem, já que o homem dentro do leão já foi subjugado. Salve, portanto, a natureza. Quem sabe ela no futuro não produzirá um ser melhor, mais racional que humano.

Evan do Carmo
Enviado por Evan do Carmo em 01/04/2009
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