Verso & Reverso
Sabe aquele dia que te bate alguma coisa e você fica sem saber o que fazer?
Saio do trabalho e não tenho paciência para esperar o ônibus. Sigo o meu trajeto a pé, observando. É assim que venho construindo os meus textos, com cenas do cotidiano.
Atravesso nas faixas, respeitando os semáforos, paro e vejo dois homens se engalfinhando, na pressa de derrotar um ao outro, perdem sacolas. Nada posso fazer. Como medir forças com dois brutamontes? Mas, vigio as sacolas para os transeuntes não as levarem. Quando percebo que ninguém ajuda, grito: "moço, suas sacolas". Aí eles se levantam do chão sacudindo a poeira da roupa e seguem seus caminhos.
Qual seria o motivo da briga? Não sei.
Venho caminhando pela longa avenida arborizada num frio de 18°C, mas não faz mal o corpo está aquecido pelo casaco. Passo em frente ao Cenáculo e elevo meus pensamentos a Deus, em oração, pedindo para que acalmem o coração dos homens...
Entro no mercado, compro pão e o queijo para o café da manhã. Espero na fila do caixa-rápido, mais de quinze minutos, e eles não têm vergonha da placa...
Passo em frente ao posto de gasolina onde todos os dias ficam dois palhaços que para ganharem o dia fazem ‘malabares’, usando tochas de fogo que iluminam a noite de inverno. De repente, da janela de um carro uma cabecinha de criança aparece e diz: "oi palhaço" e acena inocentemente...
Logo à frente há um Mc Donald's. De um lado estão jovens de classe média fazendo seu lanche feliz; do outro, estão pivetes entre os arbustos cheirando cola, fumando craque...
Então vejo a futilidade caminhando junto com a marginalidade. Outra vez, nada posso fazer.
Agora é só virar a esquina e ganharei o rumo certo de casa... Mas meus olhos se adentram para o lindo salão Jacques Janine, madames sentadas em altas cadeiras, cuidando de sua beleza, na rua passam as catadoras de papéis...
No Shopping os manequins todos vestidos com lindos agasalhos, ao seu lado, botas e vários tipos de acessórios, convite à compulsão. Do lado de fora, mendigos com fome e sem agasalhos, tremendo de frio... Mais uns passos e não verei mais estas cenas, penso, e ando mais depressa.
Na rua principal perto da minha casa, bares famosos, Armazém, Churrasqueira, Spetin, todos cheios em plena quarta-feira; homens tomam seu chope, flertam descaradamente, para dali sair para alguma cama quente.
Chego a casa enfim...
Abro a portaria, desativo o alarme e faço caretas para a câmera. Pareço louca, mas o vizinho que estiver monitorando, por certo se alegrará com aquele ‘mico’. Subo as escadas vagarosamente, ouço os gritinhos e risos de Jaqueline, o anjo doce que veio iluminar o meu dia. O sorriso das minhas filhas é o incentivo que preciso para pensar no cardápio do jantar...
Aí, vem o inesperado e você diz: "Veio de ré? Já faz quase duas horas que saiu do trabalho?!”.
Não entendo a brabeza do meu homem... Levanto a sobrancelha para as meninas num pedido mudo: O que houve? O que há? Elas sorriem e falam: "deixa pra lá!”. Troco à roupa, vou para o fogão preparar o jantar...
Não sabem que minha reunião foi dura, que tive que apaziguar as companheiras. Não sabem que mal saí do trabalho, fui para Câmara, discutir os planos de ações para executar... Nessas divagações, tudo se encaixa, volto a sorrir e brincar.
Depois do jantar, ele sai e vai trabalhar. Novamente peço a Deus, agora para iluminá-lo, guiar suas mãos e nenhum mal lhe causar...
Depois fui para um dos meus maiores prazeres: ler os e-mails dos amigos e escrever meus poemas. Mas hoje, tudo foi tão diferente... Por que não descrever o meu trajeto?
E à medida que o tempo passava não percebi o dia nascer, a manhã estava escura, levantei-me, coloquei a água na cafeteira enquanto esperava o computador enviar o comando para se desligar...