As implicações do vocábulo cativar no processo de ensino-aprendizagem

A ambigüidade semântica implícita no vocábulo cativar é, potencialmente, capaz de esclarecer uma das etéreas dicotomias presentes no processo de ensino-aprendizagem brasileiro: a conciliação pacífica entre os, aparentemente, longínquos elementos cognitivos e afetivos.

Conforme o Mini-dicionário Aurélio de Língua Portuguesa, o vocábulo cativar semeia as seguintes semânticas: 1.Tornar cativo; capturar. 2.Ganhar a simpatia, a estima de. 3. Tornar-se cativo, ficar sujeito. 4. Apaixonar-se. Infelizmente, a primeira e a terceira se constituemcomo caracteres peculiares do ensinar à brasileira. Explico-me!Há anos, décadas e, possivelmente, séculos, a educação tupiniquin vem escravizando mentes à vácuo, munindo-se, simplesmente, de um universo limítrofe de dados cognitivos que são postos diante dos educandos como penas a serem cumpridas em um prazo, deveras, determinado. A maiêutica socratiana era, sim, feita, mas não por meio de um monitorado parto, e sim, por um brutal e insensível aborto, que não utilizava pacientemente de Gabriel Chalita para “fazer o parto das idéias”.Destarte, os educandos, violentamente, capturados, se viam diante do cativeiro educacional, onde, o não pensar se constituia decreto jurídico e o assimilar irracional, um dever.

Emerge-se, pois, a primeira incoerência do ensino de Língua Portuguesa brasileiro: há um calamitoso desentendimento entre a lunar Gramática normativa e as inúmeras variedades lingüísticas que permeiam o universo dos falantes. O que torna, pois, a primeira abstrata, distante e inaplicável às necessidades empíricas e pragmáticas de cada falante e condena, as últimas, como errôneas aberrações lingüísticas.

Além de tais maléficas idiossincrasias, a persistência da tradição gramatical corrompe e obstrui o aprendizado dos falantes ao se constituir como tal antiquada diante do universo metacomunicativo dos falantes. Em oposição à época grega, a contemporaneidade possui inúmeros recursos tecnológicos capazes de corroborar, positivamente, para com a harmoniosa construção lingüística dos falantes. Contudo, tais poderosos meios de comunicação de massa não estão sendo inseridos, conforme Lívia Suassuna, no processo de ensino aprendizagem. Interessante, seria, se a hegemonia dos mesmos fossem manuseadas a fim contextualizar o falante à sua realidade circundante, tornando, pois, a competência lingüistica chomskiana em efetivo desempenho lingüístico, uma vez que, Suassuna, implacavelmente, sentencia que o conhecimento das idiossincrasias lingüístico-gramaticais não determina o bom falar e escrever dos falantes.

Logo, há contemporâneos e eficazes caminhos anseiosos por serem incorporados à prática lingüístico- pedagógica. A incoerência e ineficácia do Estudo do certo e do errado se constitui como valioso vestígio da necessidade de mudanças. Veja, pois, uma legítima corporificação da catástrofe lingüística apenas ao visualizar as redações de alguns falantes de Língua Portuguesa. Inconsistência argumentativa, amistosidade entre as idéias, ausência de criatividade, circularidade, contaminação com a modalidade oral, fundamentação crítica, reprodução irracional do que é dito, artificialidade estrutural e correção à tradicional constituem visíveis indícios de uma ignorante insistência em uma norma lingüística que nem ao menos coopera para com um real desempenho dos falantes.

Ocorre que os educandos não são mais os mesmos! Já foram os tempos de se ter decretado a abolição da escravidão educacional. As exigências são outras, o mundo é outro... e a educação, a mesma. Onde está o darwinismo? Onde estão aqueles que, dentre bilhares, venceram as espécies “inferiores”? Onde está a imprescindível correspondência entre o saber e o social? Ora, todas as respostas residem na sedução proposta por Chalita.

Partindo da premissa que aprender pressupõe o etéreo cativar, Chalita constata que há anos, décadas e séculos vem-se pecando por ignorância semântica, posto que, além do pejorativo escravizar, cativar, também, significa “ganhar a simpatia , a estima de”. Logo, o ensinar deveria conter o afetar, o seduzir, o eludibriar o outro diante do universo cognitivo, e não implantá-lo no educando. Cesse-se, pois, os implantes!E, semeie-se uma tal sonhada educação envolvente.

Inúmeras experiências comprovam a eficácia da presença da afeição na pontecialização do processo de ensino-aprendizagem. José Carlos Libanêo diz que o educando deve ser, primeiramente, escravizado nos envolventes braços da afeição. Educar pressupõe, portanto, seduzir! E ensinar requer constantes partos afetivos. Substituam-se, pois, os abortos de idéias ! E convoquem todas as parteiras conscientes que sua missão é, literalmente, dar a luz àqueles que se encontram na escravidão. Apaixonemos, pois, nossos educandos no cativante universo cognitivo munidos pelas imprescindíveis ferramentas afetivas. Assim, instrumentalizados, eles estarão aptos para cativar, em todos as semânticas, o mundo!