A Dialética de Hegel em nossas Pesquisas

O método dialético pensa tanto as diferenças entre as partes como a união entre elas. O ponto de partida não é um conceito rudimentar, pois uma certa compreensão do todo precede a própria possibilidade de aprofundar o conhecimento das partes. Assim, a análise só pode ser orientada com base em uma síntese preliminar, ainda que confusa, de uma realidade complicada. Para reconhecer as totalidades em que a realidade está efetivamente articulada, sem inventar conceitos e procurar enquadrar a realidade dentro deles, o pensamento dialético é obrigado a identificar gradualmente as contradições concretas e as mediações específicas que constituem cada totalidade. Essas contradições são criadas pelas conexões que existem entre realidades diferentes, que são como duas faces da mesma moeda, e são reconhecidas pela dialética como princípio básico do movimento pelo qual os seres existem (CHAUÍ, 2004). A acepção moderna de dialética significa o modo de compreender a realidade como essencialmente contraditória e em permanente transformação (SINGER, 2003).

No contexto do pensamento filosófico, encontra-se uma realidade formada de situações plenas de contradições, conflitos e constante mudança. Hegel afirma que a História é o modo de ser da razão e da verdade, o modo de ser dos seres humanos e que, portanto, somos seres históricos (CHAUÍ, 2004). Como pesquisadores, sabemos que é metodologicamente recomendável abrir o entendimento e as interrogações à realidade, do mesmo modo que ela os interroga e desafia no seu dia-a-dia, ao considerar dialeticamente que mudança e a permanência são categorias reflexivas, que não podem ser pensadas uma sem a outra, pois todas as coisas estão sujeitas a passar de uma mudança a outra e o todo está sempre mudando (KONDER, 1981). Por isso, Hegel critica o inatismo, o empirismo e o kantismo, porque não compreenderam que a razão também é histórica, e a realidade não é senão a história do Espírito em busca da identidade consigo mesmo (WEBER, 1999).

A contradição dialética mostra um sujeito que surge, se manifesta e se transforma graças à contradição de seus predicados. Em lugar de a contradição destruí-lo, como julgavam todos os filósofos, ela o movimenta e o transforma em uma síntese ativa dos predicados que ele afirma e nega (KOJÈVE, 2002). Nesse sentido, um pensamento crítico evidenciar as contradições lógicas e práticas e assim pode agir criticamente e questionar no sentido de pensar o mundo, e não ser pensado por ele (KONDER, 1981). E segundo uma lógica dialética, ontológica, o Espírito começa como um sujeito que se exterioriza no predicado Natureza, manifestando-se como coisa (substância, qualidade, quantidade, relações de causa e efeito, etc.), e se manifesta no predicado Consciência. As coisas passam a ter um sentido pela sua existência na experiência desse sujeito.

Graças a tais conflitos, graças às contradições entre as filosofias, a Filosofia pode chegar à descoberta da razão como síntese, unidade ou harmonia das teses opostas ou contraditórias (CHAUÍ, 2004). A realidade é sempre mais rica do que o conhecimento que se tem dela, e sempre existe algo que escapa às sínteses, pois cada totalidade tem sua maneira diferente de mudar, e as condições da mudança dependem do caráter da totalidade e do processo específico do qual ela é um momento (KONDER, 1981). Hegel defendeu que a dialética é a única maneira pela qual podemos alcançar a realidade e a verdade como movimento interno da contradição, e segundo ele, Heráclito tinha razão ao considerar que a realidade é o fluxo eterno dos contraditórios. Assim, a História é a vida, o movimento pelo qual o Espírito se exterioriza como Natureza e Cultura e pelo qual retorna a si mesmo como interioridade de ambas, e assim produz o mundo, conhece sua produção e se reconhece como produtor (PERTILE, 2000).

Assim como o filósofo examina constantemente o mundo e se dispõe sempre a rever as interpretações em que se baseia para atuar, o pensamento e o espírito crítico e autocrítico (WEICK, 1995), dentro da característica essencial da dialética, originam também uma busca de conciliação de uma e outra visão, de conhecimentos, percepções e construções diferentes, que trazem crescimento e desenvolvimento dos saberes para o sujeito e o grupo social em que se (auto)desenvolve (WEICK, 1995). O Espírito se reconhece como esse sujeito que se (auto)produz a si mesmo e que é o movimento de produção de si mesmo, que se reconcilia consigo mesmo e é, ao mesmo tempo, em si e para si (PERTILE, 2000).

Uma questão que poderia incentivar o debate sobre o tema seria:

Pode-se considerar que as grandes rupturas de paradigmas das ciências ditas exatas ou naturais resultaram também de um processo histórico dentro da dialética do pensamento crítico, que teve efeito sobre a epistemologia da época?

Referências

* KOJÈVE, Alexandre. Introdução à leitura de Hegel.RJ:Contraponto:EDUERJ,2002,p.11-31;421-494.

* PERTILE, José Pinheiro. Dialética do reconhecimento: consciência e consciência de si. In: Cruzamentos: psicanálise, filosofia, política e ética. POA: Criação Humana, 2000, p. 67-81.

* CHAUÍ, Marilena. Convite à filosofia. 13.ed. 2.reimpr. São Paulo: Ática, 2004, p. 60-87.

* KONDER, Leandro. O que é Dialética. 25.ed. São Paulo: Brasiliense, 1981.

* WEICK, Karl. Sensemaking in Organizations. New York: Sage, 1995.

* SINGER, Peter. Hegel. São Paulo: Edições Loyola, 2003.

* WEBER, Thadeu. Razão teórica e razão prática em Kant. In: Ética e filosofia política: Hegel e o formalismo kantiano. Porto Alegre: EDIPUCRS, 1999, p. 13-25.

30 outubro 2008