DE MÁRIO QUINTANA OS VERSOS QUE ME PRENDERAM AOS LIVROS

Se as coisas são inatingíveis...ora!

Não é motivo para não querê-las...

Que tristes os caminhos, se não fora

A mágica presença das estrelas!

(Mário Quintana)

Esta minha história de leitura – devo reconhecer antes de mais nada – não é mero capricho do acaso. Tudo parece ter culminado para esse ponto como duas realidades nada opostas entre dois seres desconhecidos; eu e o livro. Posto isso cabe então uma primeira pergunta: em que a leitura contribuiu para minha formação como leitor e como pessoa?

A leitura será algo que sempre envolverá certa complexidade. Não é fácil, portanto compreender essa relação entre leitor e texto. É exatamente isso! Leitura é nada mais, nada menos que uma relação entre essas duas grandezas.

Vale então dizer que tudo começou com um pequeno livro de Mário Quintana (meu primeiro poeta e escritor). Era uma antologia poética, bem lembro. Seus versos me diziam palavras vivas e límpidas, muitas delas incompreensíveis. Mas eu não queria apenas compreender! Antes queria sentir o mistério delas. Foi a partir disso inquestionavelmente que nasceu em mim uma espécie de paixão pelas palavras como o desfecho alegre em uma límpida tarde de outono.

Minha terra não tem palmeiras...

E em vez de um mero sabiá,

Cantam aves invisíveis

Nas palmeiras que não há.

(Quintana)

Então aquilo era o que todos chamavam de poesia? Agora eu poderia escrever uma? Comecei a perguntar para Quintana eu um diálogo que somente eu compreendia. Suas poesias pareciam desenhos. Todos os poemas em suas formas sugeriam imagens que eu não relutava em formar. Os poetas são antes de tudo desenhistas de palavras.

Os poemas são pássaros que chegam

não se sabe de onde e pousam

no livro que lês.

Quando fechas o livro, eles alçam vôo

como de um alçapão.

Eles não têm pouso

nem porto

alimentam-se um instante em cada par de mãos

e partem. (...). (Quintana)

Dessa forma, meu primeiro contato com a leitura foi marcado pelo espanto. O “espanto original” parecido talvez com o que foi experimentado pelos primeiros filósofos da Grécia Antiga.

Por que não dizer também que a experiência de leitura é marcada pela aventura? Pelo desconhecido? Pela busca de uma felicidade própria ou pelo reconhecimento de si mesmo?

Depois de um tempo comecei a pensar que a liberdade é o que há de mais sublime no mundo da leitura. Não que isso justifique uma fuga ou um desprezo no isolamento de um quarto escuro. Mas porque quando se quer ler quer-se também escolha, fruição, nostalgia. Poder vagar na transitoriedade da vontade e da representação. No tempo indefinível da poesia, na hora ensimesmada do pensamento questionador procurando uma dinâmica em um ponto específico de desobrigação e de prazer.

Minhas primeiras leituras envolvem inevitavelmente todo esse processo. Hoje leio como busca. Minha relação com o texto se configura a partir disso. Prazer, liberdade, nostalgia, fruição. E assim vivemos a vida, esse livro que nós mesmos escrevemos com ponto e vírgula juntando em um todo conteúdo e contexto.

Referência bibliográfica

QUINTANA, Mário. Nova Antologia Poética, 2a. ed, Rio de Janeiro, Editora Codecri, 1981.

Leon Cardoso
Enviado por Leon Cardoso em 10/10/2008
Reeditado em 12/10/2008
Código do texto: T1220987
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