Manicômio da Poesia

Manicômio da Poesia

Capítulo do meu livro: "Jardim de Poesias" não publicado.

Se quizerem podem assistir o vídeo no you tube pelo link:

http://br.youtube.com/watch?v=YDAvalW3wrM

Brechó Espelho Meu

Quem sou eu?

Se o que vejo é o que sou

E o que penso mostrar é fantasia.

Quem me olha no espelho vê a mim ou a ti?

Como num jogo de indentificação, eu escrevo. A imagem que passo pode ser de mim ou de alguém. Cada um pode escolher o que vê: ou a mim ou a si. Um brechó funciona dessa maneira. As pessoas vestem suas fantasias e se vêem nelas. O espelho revela a alma. E é nela que estão as fantasias. Cada um olha para a sua e para a de outras pessoas. Pois elas já vestiram muita gente. E podem continuar vestindo. Uma poesia veste fantasias da mesma forma, uma imagem a revela, uma música a toca.

Ouvindo Cássia Eller em meu brechó, “Estamos indo de volta para casa”, sinto-me só. Ninguém adentra. Mas toca na minha alma a campanhia de uma voz que escreve junto comigo, uma voz interna pedindo para exteriorizar. Então, saí em forma de poesia:

Imensa solidão

Dói, dói, dói

É o amor...

E é bonito.

Angústia presa

Solta na voz cantada

Que alivia...

Que embriaga...

E deixa ver um paraíso

Deixa uma fome satisfeita...

Era.... um gozo interrompido

Pela distância...

Minha cara, enxugava

Hoje, meus olhos

Despem.

Perco o enjôo de mim.

Divirto da dor

E ela fica mais bonita ainda.

Exponho no papel

Para que Ninguém, sinta

E de volta para casa me sinto. A letra da música me diz isso. Antes de escrever a poesia, eu a tinha em minha mente de outra forma pois algo em mim doía. Ao ouvi-la me transformei e a dor realmente aliviou. Então eu a mudei também. Onde havia não, eu coloquei sim. E onde o verbo era, é onde fiquei. Ninguém pôde senti-la no “dói” mais prazeroso. E eu nesse gozo me instalei. Nessa solidão eu fui até a ilha de outra pessoa. Eu sou assim, tudo me transforma, uma música, uma poesia, uma imagem de uma ora para outra. Foi num baile de máscaras: “Behind The Mirror, por exemplo que eu percebi tudo isso ao me ver filmada. Antes de apresentar minha performance: “Feitiço do Sol e da Lua” eu tinha a idéia de mostrar uma fantasia. E no filme eu vi que me mostrei, minha timidez, meu embotamento, minha voz que custa a sair mas também minha coragem, minha força e poder de me curar. Para quem tinha medo de falar em público, eu me superei. E aí, a transformação se deu em mim. Encontrei meu poder, principalmente de me revelar como sou. O tema da festa inclusive era este: esconda o rosto e revele a alma.

Com este poder no rosto e nas mãos, eu escrevi o roteiro da Poesia com algumas de minhas mais fortes poesias. A idéia inicial era que eu mesma atuasse em um DVD com elas. Mas achamos melhor uma atriz. Ninguém tem limites ou tem? Foi isso que me perguntei. Numa ilha, num mar inconsciente, navegamos. Vamos ao encontro de outros limites, outra ilha.

É isso que tento mostrar nessa poesia:

Numa ilha isolada navegante, nos encontramos.

Estamos sós ou no barco de alguém.

Que seja ninguém.

Eu ou você.

Você em mim

Eu em você.

Eu por mim.

Você por ti.

Aqui ou alí.

Aqui quem sabe.

Sabe de mim?

Estou aí.

Você me vê?

Eu te escrevo.

Escrevemos juntos por fim.

Nesse mesmo jogo de indentificações, os limites de cada um se perdem. Podemos ter uma atriz para representa-lo ou estamos nela. Nessa união de almas está A Poesia. A criatividade passa de um para outro, vamos transformando desde início e no fim vira um espetáculo. Minhas poesias são assim também: quando começo a escrever é de um jeito e conforme elas vão saindo de mim e sendo transformadas, vou me transformando também. Ao escrever a poesia acima, eu estava de um jeito, sentindo solidão. E no fim, olha só no que deu. Pensava inicialmente numa imagem de um e-mail que recebi, numa ilha navegante. Olhei para a imagem e vi a solidão de alguém, da pessoa que a fez. Eu me vi na imagem também, fui até o outro e passei a escrever o que via.

E quando finalmente a campainha toca, eu atendo: É a Poesia que chega:

Oi, vim te buscar....Quer ir?

Eu gosto daqui.

Por que?

Estamos protegidos.

Mas você não quer sair? Ver o mar?

Ah, as esmeraldas?

Silêncio...

E vocês, gostam daqui?

Gostamos, sim.

Mas não querem casar, ter filhos?

Escuridão...

Ei, psiu...., eles já foram...

É assim: vejo-me num manicômio, presa, isolada com meus pensamentos. Falta-me coragem para sair. Olho para um outro preso também e sinto empatia. Quero ter uma esperança. Fiz tantos pedidos...A flor queria ser estrela... Agora, ela vai de um por um mostrar um caminho: o da própria Poesia. Então, se a campainha tocar dessa vez, que tal abrir a porta?

Inspirada num PPS: “a knoic at the duir”, depois de me ver entre loucos e pirados, achei uma forma de sair de lá: basta abrir a porta. Sai eu, sai qualquer um que queira sair. A “Poesia” é um dos guias....

Quando a Poesia chegou, foi visitar lugares. Se viu trabalhando no brechó e quando a campainha não tocava, ela abriu a porta e saiu. Uma fada-bruxa se aproximou e tremendo acendeu um fósforo. Com o coração batendo como de um leão, várias pessoas deram-se as mãos e numa fileira foram acompanhando a Poesia. Chegou primeiramente num manicômio. Lá, perguntou se eles gostariam de sair. Foi convencendo-os e acabaram saindo de lá. Mas ainda no manicômio restava uma pessoa, um taradinho. Ele me vê e quer fazer algo em mim: Eu pergunto:

E você, quem é?

Silêncio....

Quero você.

Deixa ele, uma voz me diz.

E ele como uma criança pede:

Você pode me lavar?

Você é bem grandinho...

Silêncio...

E eu digo: Como você é divertido...

Luzes...

Se foi....

Pergunto para voz: quem era ele?

A voz: um anjo.

Mesmo na escuridão, uma voz me guia. Aqui no brechó ouço: “Velha Infância”. A fada-bruxa, com sua voz infantil tremia feito uma velhinha. Acendeu outro fósforo. E me vi num outro lugar. Apenas ouvia uma voz rezando forte, quase gritando o Pai Nosso. Ela rezava initerruptamente seguidas vezes. Eu perguntei:

Para quem está rezando?

Pai Nosso, que está no céu. Para mim, para você. Para todos nós.

E a música toca no CD do brechó: “Passa em casa”. Estou implorando socorro” A voz espantada:

Você vai levar essa mulher para casa?

“Tô te esperando, tô te esperando”. “Tô esperando visita”

Você sabe de quem era aquela voz que rezava?

Não, eu não vejo nada, você sabe. De quem era?

Uma prostituta.

Eu pensei que estava num convento e ela fosse uma freira.

“Vida sem graça se você não passa”

Tédio.... No rádio toca tribalistas:

“É você

Só você

Que na vida vai comigo agora

Nós dois na floresta e no saguão

Nada mais

Deita no meu peito e me devora

Na vida só resta seguir

Um risco, um passo, um gesto rio afora

É você

Só você

Que invadiu o centro do espelho

Nós dois na biblioteca e no saguão

Ninguém mais

Deita no meu leito e se demora

Na vida só resta seguir

Um risco, um passo, um gesto rio afora

Na vida só resta seguir

Um ritmo, um pacto e o resto rio afora”

A voz foi embora

Chora

Só me resta escrever:

“Já nasceu o Deus menino”

Filho, lindo...

Anjos cantam em comemora

Lá no céu

Mel, Mel...

E eu fico aqui no meu brechó lembrando das gotas de orvalho, ouvindo: “Anjos da Guarda”. Tudo nesse CD me serve como inspiração. Tudo parece se encaixar. Estou montando um quebra-cabeça. É tudo invertido, tudo se inverte: mel em orvalho, orvalho em mel, música em poesia, poesia em música. Não dever ser tão difícil assim. É onde busco inspiração. Nesse mar. Não é do que o mundo necessita? Arte. O belo e o divino. Dá vontade de dançar. Dá emoção. Uma emoção calma, gostosa. Paz.

Mas tem uma pecinha que não se encaixa. Seria uma peça teatral? A voz diz:

Eu vou encaixa-la no final.

Antes, gostaria de dar um nome para você. Como você quer se chamar?

“Louco por você”

Por mim, amor.

Por você, amor.

Amor...

Você e eu

Loucos?

Eu fico cá com meus botões: É, somos todos loucos. Loucos de amor, como havia dito antes. Essa euforia pode cheirar mal mas também faz parte. Por isso aquele anjo do manicômio se borrava e pedia para eu lavá-lo.

Vamos dar as mãos? Fazer um círculo. Acender uma fogueira. Ela não vai queimar. Ela vai apagar. E podemos casar. Dois passos pra lá. Dois passos pra cá. Halleluya!

Cigana Ana, uma voz chama. Posso contar sua história?

Conte sobre a poesia que escrevi depois que assisti um filme.

A Cigana Ana passou por minhas veias?

Não, a Arcaica Cigana. Arcaica vem de Arca. Arca russa, o nome do filme.

A Arcaica Cigana esconde um tesouro de mil e uma ondas. Por onde passa, deixa suas pegadas...? E elas apagam com os ventos?

Não, os ventos as levam como sementes.

E lá elas germinam como capim?

Sim, pelos campos da imaginação.

Nesse meu campo imaginário, apenas uma coisa me mete medo: A perseguição.

Não , você não vai ser perseguida, a voz diz. Você vai causar emoção. É só não dizer quem você é.

Posso dizer o meu nome?

É tudo o que as pessoas querem ouvir. Não diga Ana, diga Deborah.

Continue sua história, Deborah.

Como ia dizendo: eles, os ventos as levam como sementes para a Cidade perdida. E lá, elas germinam como capim, pelos campos da imaginação. Dizem que quem as consegue ver crescer, são aqueles que tem plantado em sua alma, o poder do silêncio de Deus.

Silêncio....

Tá tudo invertido, tudo errado. Para, para. A voz diz. Essa história é a minha, a do eremita. Conte a da Cigana.

Ok. Era uma vez uma história . Uma história que se repete ao longo dos anos... É essa?

Sim, acho que é.

São nascimentos de pedras, de árvores, de homens, de uma cidade. E em cada pedra, em cada árvore e em cada homem, nasce uma cidade.

Termina aí?

Sim.

O que acontece com a Cigana?

Ela dá um chá de sumiço.

Um chá envenenado?

Da sedução, da ilusão.

Devora-me, Deborah

Sim, é esse o meu nome em Hebraico: Dvorah.

Dvorahfree? Aquele cigarro?

É, é esse que fumo.

Agora deixa eu voltar para a realidade e fumar um cigarrinho aqui no meu brechó.

Mas não vai empestiar as roupas?

Não importa. Aqui não. Aqui sou a Deborah, professora de ginástica. Até estou vestida com minha roupa predileta de dar aulas, a de capoeira. Saindo daqui vou para a Hebraica. Dou aula para a Idade de Ouro hoje.

E fumando Deborah?

Ah! Dane-se!

Tempo....

Pronto, já fumei. Sou a Poesia agora, sem os cabelos da deusa. Preciso tomar água para navegar nas estrelas. Navego nas estrelas como quem uiva ao som de uma melodia, pedindo a lua que acalme meus sentidos e aquele que está por perto...Lua, lua. Perdi a poesia. Vou chamar meu cavalo alado para me levar de volta:” Pegazuz”. Leve-me leve. Para o anil viril. Cavalgue!Trote!Balance! Sinta minha solidão e me leve em pensamento... Navego nas estrelas como quem sente um pensamento. Isso é Fernando Pessoa: “Ando como quem sente...”

Ande, ande, escreva logo.

Você está me pressionando?

Estou, vai, vai. Saí daí.

Para onde vou?

Para onde sua mente viaja.

Ponto. Final. Não, não daqui a pouco eu volto.

O que vai fazer agora?

Que tal ler um verso? “Sorte é aquilo que acontece quando a preparação encontra a oportunidade. “ (Elmer Lithman).”. Sim, acho que estou preparada.

Fale, louco de Amor.

Não tenho nada para falar agora.

Mas eu tenho.

Então fale:

Acho que a Poesia ficou louca mesmo.

Não, não, vou dar um jeito nisso.

Risos...

Chora, Deborah

Caiu uma lágrima

Uma gota de orvalho

Meu mel está aqui.

Voltei, Sou a Poesia.

Sacrifiquei minha vida

Para te dar essa alegria.

Ah! Deborah. Essa foi a poesia mais linda que já ouvi.

Por que, você não gosta das outras?

Sua cachorra, ladra!

Não me chingue. Eu só roubei...

O que, o que? O meu coração?

Não, não, o mel e o limão da sua casa.

Você roubou alguma coisa da minha casa quando veio aqui?

Não vou contar...

Então, conte a sua história.

Está bem, vamos lá: eu era um menino levado

Quando te conheci

E só faltava você na minha história

Estou aqui para te contar.

A minha ou a sua?

A sua.

Você vai se revelar?

Vou, para você. Eu vou ser aquele psiquiatra famoso que cuspiu na sua sopa.

Ai, não. Isso não vai dar um livro, vai?

Não me pergunte, responda você.

Eu não vou ter coragem de publicar isso.

Vai sim, Deborah.

Então, vamos voltar ao normal. Isso parece uma bola de neve.

Bola de neve

Cresce, cresce

É um livro.

Vive, renasce em meu ventre.

Sou tua

Leve-me, leve.

O livro é teu.

Agarra-o

É tua chance

Leve-me

Leve....

Vento, mar, relva, sol calor. Esse é o mundo, nossa casa, nosso paraíso. As cores nunca poderão desbotar enquanto na liberdade de expressão, nos acharmos. Dizem que as cores, no futuro serão neon. Dizem que as pessoas conversarão em silêncio. Mas e o horizonte, onde vai dar? Essa é uma pergunta para a Cigana Ana responder:

A arcaica cigana esconde um tesouro de mil e uma ondas.

Por onde passa, deixa marcas salgadas de estrada.

São moedas acobreadas, entrelaçadas numa rede espaça.

Cobrindo a cabeça de astros cósmicos e luminosos.

Eles dizem o que a vida significa:

Um eterno navegar, em obras de arte.

Música, letra e pintura, encenados em palco aberto, e encerrados em grande baile. Todos são convidados.

A entrada é a mesma da saída, Uma bela vida.

Nunca se sabe quando se chega ou quando se sai.

Só se sabe que existem portas e portais.

Guardas, anjos e mortais.

Uniformes, máscaras, lenços ou chapéus.

Cada um escolhe o seu visual..

Eu agora, neste momento escolhi o meu:

Sigo a Ana e boto fé que o horizonte acaba numa arca manhã.

Cigana Ana, o que você faria se apenas lhe restasse um dia?

O dia seguinte é onde o horizonte acaba. Ele renasce, sol a sol. Se eu estivesse presa num manicômio qualquer ou se eu fosse morrer queimada, meu último pedido: Quero ver a luz do sol. Sou como a lua que mira a terra pela luz do sol. Sou como a terra que mira o sol, quando a lua se põe. Ele, o anjo que me guia é como o sol que ilumina a face da lua e o corpo da terra quando me vejo em calor sensual. Meu corpo esquenta, minha face reluz.

Cigana Ana, fale da Mãe do Universo, quando ela passou por suas veias...

A Mãe do Universo passou por minhas veias para infiltrar no meu querer a vontade de ser filho(a) sem sexo. Experimentar gozar ao vento e criar no fogo. Abrir as comportas do ventre para aquele que couber nele. Nesse ritual sou virgem com filhos, tenho coroa de espinhos. Sangro na testa aquela que fui para renascer das cinzas....

Minha cara Deborah, você não sabe contar histórias. A cigana não leu o meu destino...

E você sabe qual é o seu destino?

É bater na sua porta. Toc, toc...

Entre....

Leve-me com você nessa sua viagem na maionegues.

Não me negue três vezes. Sou como Baco. Mas quem abre a porta sou eu.

Então não precisa bater?

Não, eu abro as comportas do ventre.

E vai resnascer três vezes?

Quantas Deus mandar.

Quantas você já morreu, Cigana Ana?

Duas, uma na prisão e outra na solidão

Só resta saber quantas vezes vou ter que....

Quem bate?

É o vento...

Não deixe o vento entrar, Deborah.

Ok, ok, você venceu. Deixe o meu peito chorar.

É gostosinho ficar nessa conversa maluca, né Deborah?

É, mas eu tenho que ir dormir. Amanhã acordo cedo para trabalhar. Vou escrever e cantar:

Começar de novo e contar comigo

Vai valer a pena, ter enlouquecido....

Deborah Schcolnic
Enviado por Deborah Schcolnic em 11/08/2008
Código do texto: T1123084
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