Ambientalismo angelical? Será?
Tenho me abstido de discutir. Mas, quanto a esta história de homem pervertendo a natureza, bem aí não resisto.
Outro dia li um artigo do Boff que, meu Deus do céu! Hoje, todo mundo opina sobre meio ambiente. É incrível como o senso comum acaba criando desvios em temas que precisam de mais reflexão e, sobretudo, de mais pesquisa e, especialmente, conhecimento histórico para que se possa construir uma visão crítica sobre o assunto.
Basicamente há três posturas na relação humana - e aqui vou tratar o homem como um animal também, que pode também estar
harmonizado com a natureza, ainda que tenha um componente diferencial em relação ao resto da fauna, que é a tecnologia que usa - com a natureza: a primeria é o homem lutando contra a natureza para sobreviver (submissão à natureza); a segunda é a natureza sendo agredida predatoriamente pelo homem (nas guerras antigas isso acontecia muito e hoje então, a tecnologia industrial está
detonando mesmo); a terceira é a harmonização do homem e natureza.
Esses três tipos de relação do homem e natureza ocorreram ao longo da história e se alternaram. Mas na pré-história prevaleceu a primeira, ou seja, a submissão do homem pela natureza; o homem sobreviveu a duras penas. Imagine um tatú do tamanho de um fusca, uma preguiça de seis toneladas e você passando inadvertidamente no momento em que alguma, no topo de uma elevação, tem um surto de incontinência intestinal... Vida dura a humana nos tempos idos da fauna
gigante, há cerca de 10 ou 12 mil anos atrás. Enfrentar um tigre dente de sabre não era prá qualquer um; disputar com ele abrigos para se proteger das intempéries, então, exigia uma destreza espetacular. É tanto que não creio haja havido um salto evolutivo em termos de inteligência e capacidade cognitiva entre o homem pré-histórico e o homem histórico, mas apenas uma alívio experimentado por este último relativamente à perversidade do ambiente natural, o que possibilitou condições favoráveis à atividade cultural. Terminada essa fase, a tônica da relação homem/natureza passou a sofrer alternâncias entre os três tipos.
Há algum tempo, vivenciamos a destruição provocada pela onda gigante lá naquela região da Tailândia, uma fase inpiradora de reflexôes sobre a submissão do homem às forças naturais.
O xamanismo, por exemplo, surgiu há algumas dezenas de milhares de anos, dizem alguns que 50.000 anos, portanto, como revelam as pinturas rupestres, o tema que absorvia o imaginário do homem era o mundo animal, os tais animais de poder e bote poder nisto. O
xamanismo moderno é apenas uma sombra, um eco, e jamais pode ter as mesmas conotações que o antigo, não pode ser autenticamente vivenciado pelo homem moderno, cujo principal referencial de relação com a natureza é justamente o contrário, a submissão da natureza pela tecnologia predatória da sociedade industrial.
Por tudo isso é que os ambientalistas mais conscientes, e não simplesmente modistas e palpiteiros, buscam não um alijamento do homem do meio natural em defesa deste último, mas o desenvolvimento de tecnologias inspiradas no conhecimento tradicional das tribos e povos que estão sendo marginalizados tanto
pelos grandes empreendimentos (como as hidrelétricas) quanto pelas grandes reservas intocáveis (parques nacionais, estações ecológicas coisa etc.). Há experiências muito bem sucedidas como agrofloresta e outras, em que se experimenta uma harmonização da produção de alimentos e promoção da punjança ambiental.
O binômio empreendimentos de alto impacto e ambientalistas de alto fanatismo é perverso, isto sim. Yellowstone, nos USA, século XVIII é o modelo que se copia até hoje e não é útil nem nos trópicos (e principalmente), onde muitas comunidades vivem em áreas "selvagens", nem em lugar nenhum. Primeiro, depois de se ter matado todos os índios, criou-se aquela primeira reserva de proteção integral - Yellowstone. E a lenda da natureza intocada - ora os ameríndios do norte haviam circulado e vivido ali por séculos, numa suposta relação de equilíibrio com o meio natural proporcionada por uma tecnologia de baixo impacto. E agora se quer
reproduzir esta lenda da intocabilidade da natureza em toda parte, criando conflitos, expulsando pessoas que podiam seguir ali cultivando seus saberes para serem estudados e integrados com as pesquisas científicas sobre abordagens e manejo adequados para benefício de todos os seres da criação, totalidade em que está presente a espécie humana. Desses estudos derivam tecnologias apropriadas para serem legadas para as futuras gerações. Mas o que se acha o supra-sumo da maravilha é criar reservas intocáveis, onde só as pessoas privilegiadas pela situação urbana podem ir com suas máquinas de fotografia digital para contemplação das belezas naturais. Ambientalismo de final de semana e cientistas privilegiados que alí podem estar a fazer pesquisas de cogumelos a moscas. Muito dinheiro gasto e tudo continua igual: monoculturas, agronegócios e outras práticas geradoras de devastaçao. Nas unidades de conservação o Estado investe para servir o deleite de visitação a muitos que auferem lucros e proveito desse sistema devastador. E os excluídos?, vão prás favelas, perde-se o conhecimento tradicional e babau futuro
da humanidade. Isto sim que é predação do "todo ambiente"; das boas e muito divulgadas e "bem aceitas".
Experiências demonstram que esse mito da tal natureza intocada nada tem de científico: ao retirarem os massai e seu gado das pradarias africanas, a savana sofreu muito, pois o capim se alastrou e inibiu a reprodução do extrato arbóreo. Portanto, o que é perverso mesmo é a sociedade mega-industrial, que hoje substitui a mega-fauna. Nossas mega-armas e mega-máquinas, explodindo, soltando
fumaça tóxica e carbono, são o grande empecilho para que voltemos a desenvolver formas de cultura mansas e humildes. Pois afinal, a guerra moderna, que os ambientalistas não abordam com muita freqüência, é a forma mais devastadora e predatória de desrespeito, tanto ao ser humano quanto à natureza, porque, afinal, esses dois elementos são indissociáveis. Não passamos de mamíferos racionais, e só.