O Ministro Tinha Razão

Caro leitor!

Lamento informar que o título deste ensaio não corresponde à realidade. É difícil acreditar que o Ministro pudesse estar certo. Afinal, todos os Ministros procuram sempre apresentar uma visão otimista, tentando convencer a população de que suas teorias são infalíveis. Não o censure. Procure aceitar a idéia de que ele acreditava que estivesse certo. Se nem mesmo ele acreditasse em suas previsões, quem o faria?

Assim, estando o título esgotado, relaxe e distraia-se com as próximas páginas. Espero que até o final da leitura você possa esquecer a tristeza de ter adquirido este livro pensando encontrar um Ministro certo.

O autor.

AVISO URGENTE!

Informamos aos senhores leitores que o Ministro redimiu-se de suas palavras. Neste sentido, reconheceu que suas previsões eram excessivamente positivas, admitindo uma mudança no resultado esperado.

Diante de tal declaração, retomamos o título do livro, uma vez que existe a possibilidade de o Ministro estar certo.

Voltaremos a qualquer momento com novas informações.

Enquanto você se distraía com as páginas anteriores o Ministro pôs em prática seu plano.

Os primeiros resultados apontam para o sucesso. A população aceitou bem as medidas. Fontes bem informadas confessam que há necessidade de ajustes.

Foram desmentidos os boatos de que o Ministro seria candidato às próximas eleições presidenciais.

A popularidade do Ministro é cada vez maior. Depois do impacto inicial, a população começa a sentir os efeitos positivos de sua política.

Especialistas na área recusam-se a acreditar que a solução do problema era tão óbvia. Empresários começam a investir na modernização do parque industrial. O capital estrangeiro está de volta.

O Governo parece estar vivendo sua lua-de-mel com a população. A criminalidade diminuiu a níveis baixíssimos. O desemprego sumiu. Há perspectivas de solução dos problemas de habitação, saúde e saneamento básico de forma definitiva nos próximos meses.

O Ministro voltou a afirmar que seu propósito imediato é tão-somente levar a termo o seu plano. Desmentiu categoricamente que seja candidato à Presidência da República.

NOTÍCIA DE ÚLTIMA HORA

O Ministro convocou a imprensa esta manhã para informar que as esperadas medidas de ajuste do plano não serão postas em prática, em virtude da estabilidade alcançada, não havendo necessidade de modificação imediata.

Disse, ainda, que a corrente que defende o seu nome para a Presidência da República pode levá-lo a reconsiderar o assunto, caso o plano mantenha os atuais resultados.

Especialistas na área lamentaram o adiamento dos ajustes, temendo que a inércia possa prejudicar o sucesso alcançado, culminando com o descrédito do Governo.

O ligeiro desvio nos resultados do plano no último mês não abalaram o Ministro, que disse estar satisfeito. Não se deve abandonar um bom plano só porque o último resultado foi desfavorável, advertiu. Embora pior que Nos meses anteriores, este resultado está longe do que havia antes do plano. Não haverá ajustes, reforçou o Ministro. Nos próximos meses a situação tende a estabilizar-se ao nível dos meses anteriores. Especialistas temem que a teimosia do Ministro em retardar os ajustes esteja ligada às próximas eleições, quando será renovado o Poder Legislativo. Fontes ligadas ao Governo estimam que a "situação" conseguirá a maioria das cadeiras do Congresso Nacional. Temem que o resultado negativo seja repetido nos próximos meses, culminando com o fracasso do plano antes das eleições.

Assessores do Ministro sustentam que a possibilidade de sua candidatura à Presidência da República não está afastada, apesar do susto do último mês.

Não se pode retardar mais o ajuste do plano. Experts exigem que o Governo edite imediatamente as medidas necessárias. Líderes da oposição denunciam o maior "estelionato eleitoral" da História.

Assessores do Ministro confirmam que a iniciativa de não ajustar o plano antes das eleições é do Palácio Presidencial, contra as recomendações do ministério.

O Ministro será candidato à Presidência nas próximas eleições.

Passadas as eleições foram editadas as medidas de ajuste do plano. O ajuste veio como a "pedra no feijão" para a população, que se deliciava com as facilidades que recebera no plano originário e elegeu em massa os candidatos da situação, que obtiveram maioria no Congresso Nacional.

A oposição está enfurecida e exige a demissão do Ministro.

Pessoas ligadas ao Ministro confidenciaram que tudo não passou de um complô para deter sua candidatura à Presidência, que foi desmentida esta semana.

O Ministro afirma que estava certo, e que seu plano falhou somente por intervenção de terceiros.

O Ministro foi exonerado de seu cargo. Para seu lugar foi designado seu principal assistente (como em todas as traições).

Em entrevista coletiva, o ex-ministro confessou estar desiludido com sua atuação no Ministério, afirmando que tudo faria para provar que estava certo, sendo impedido por forças alheias à sua vontade.

Certo ou errado, o Ministro está desempregado, e prometeu contar tudo que aconteceu nos bastidores tão logo consiga um emprego. Algumas empresas já lhe ofereceram colocação, mas o Ministro as recusou, afirmando que ainda tem algum dinheiro para gastar antes de aceitar um emprego como garçom.

O ex-ministro conseguiu um novo emprego. Após rejeitar várias ofertas, acabou sendo nomeado como escriturário na EEEP - Empresa Estatal de Estepes e Pendências.

Como a empresa pertence ao Governo, o ex-ministro cancelou a entrevista coletiva que daria, temeroso em perder o seu emprego. Disse, no entanto, que pretende provar que estava certo tão logo se aposente, o que deve acontecer nos próximos três anos, computados como tempo de serviço as seis férias e três licenças-prêmio, que não pretende gozar.

Dois meses depois de se empregar, o ex-ministro foi licenciado por motivo de saúde, vítima de complicações cardíacas, as quais adquiriu no exercício do serviço público, mas que foram agravadas depois que perdeu a eleição para síndico no condomínio em que reside.

Diante da possibilidade de ser aposentado precocemente, o ex-ministro prometeu para logo a prova de que estava certo, com revelações que vão surpreender a todos.

Lamentamos informar que o ex-ministro faleceu esta manhã, vítima de queda de cavalo, na fazenda de um amigo deputado.

Testemunhas afirmam que o Ministro sentiu tonturas quando caiu do animal. Outros sustentam que o "de cujus" já estava tonto a muito tempo atrás, mas que somente hoje é que apareceu um cavalo para que pudesse cair.

Os segredos tão ansiados o acompanham para seu repouso eterno. Jamais saberemos porque se atreveu a dizer que estava certo quando todos o julgavam errado.

Será que o Ministro tinha razão?