O Trovador

com Odran

Música ensangüentada escorria sem parar,

Voraz aborto arrancava melodia do ventre da sua canção.

Na infância ainda clamava para o ajudarem a estancar,

Mas voz vazia não costuma chamar atenção.

Marchava em linha reta, mas sentia seu corpo inclinar.

Era como velhas notas rabiscadas no chão,

Confusa existência a o pisotear.

Era alaúde silenciado em meio à multidão.

Sinuosa natureza turbulenta a o guiar,

Içava as velas rumo a devaneios e ilusão.

Vagava sempre nas madrugadas em alto-mar

Perpetuando o desacerto de sua situação.

Fazia-se selvagem quando o mundo insistia em lhe aprisionar,

Condição que o desnorteava com farpante precisão.

Como ele passaria a vida inteira a trovar

Se quatro versos em uma estrofe era tudo que ele tinha nas mãos.

Via suas lágrimas em flor desabrochar

No jardim sombreado de sua frondosa solidão.

Sua esperança sufocada por acúleos a lhe machucar

Ritmava suas dores resvalando para uma profunda aflição.

De tal sina sua voz não conseguia se desgarrar.

Aquela dor já conhecida era sua própria prisão.

Lançava-se na busca tentando sobre a vida divagar,

Errante por entre os espinhos, mas em plena contemplação.

As flores soturnas acolhiam docemente seu incessante vaguear

por entre as sombras do antigo jardim de sua então desolação

com outros tantos mortos versos a velar

enterrados na tristeza das folhas em decomposição.

Com aromas estranhos e exóticos começou a se deparar

Admirando as flores silvestres de seu existir em grande profusão.

Em profundo delírio seus dedos ansiosos começaram a dedilhar

O vento tempestuoso que desdobrava-se em sua direção.

Queria a amplitude de seus horizontes desvendar,

Permitindo-se contemplar sua própria natureza para além da confusão

Dos tortuosos e desatinados caminhos que se pôs a trilhar

Na busca incessante de sua mais nobre canção.

Nascia assim uma gota de ostentação tímida e particular

Que escorrendo coloriu o breu de seu admirável sertão,

Relevando enfim os rascunhos que adquiria ao caminhar,

Mas que outrora não via por conta de sua dissonante condição.

Rebuscava a aurora ardente de seu próprio cantar,

Que rasgava-lhe a alma em imensa inquietação.

As velhas folhas mortas começavam a sangrar,

Libertando a sua poesia daquela assoladora escuridão.

E de todo o arcabouço de seu viver teve início o despertar

Dos solenes versos tão aguardados de seu digno refrão,

Que das silenciosas profundezas do seu ser começava a brotar

O seu canto poético na sua mais graciosa estação:

“Nos meus próprios idealismos e abismos raízes fiz deitar

Com a flor serena que calmamente envolveu minha respiração.

Num sopro de originalidade o meu viver fez cantar

As nuances particulares de uma nova percepção.”

Leitora BNFS
Enviado por Leitora BNFS em 31/12/2011
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