FILHA DE UM DEUS MENOR

Quando me chamam poeta
Sorrio e penso:
... mas filha de um deus menor.
Calo o espanto
De me ver descoberta sem esforço

Por outro lado,
Se existe um Deus Menino
E tudo o que vive cresce,
É justo que Deus
Também assuma a idade
Que eu assumo quando cresço,
Para me assemelhar à imagem
Da qual o Homem foi feito
Ou que o Homem cria
No lado bom de si mesmo.

Fico no desconforto
esperando
Encontrar um braço do rio
Do conhecimento,
Um cais de onde me lance
no encontro
e me seja permitido beber um pouco

Ah ao menos um pouco,
Matar esta sede que sinto!

Maria Petronilho

***

LIVE - 8

Tenho a cara pintada de azul
Têm novas falas pelas vias
De todas que se possam ouvir
A voz não cala por omissão
Da confusão & outros caos genéricos
Tudo que se canta contra a fome...
Parem agora, esses varões
Que apenas olham o próprio ravo
Cartas que assinam outras vergonhas
Olhar do lado para ver o que se passa
Passado também conta sua história
Correram para bater nas portas do futuro
E pouco se importam, mesmo
Com as cabeças que ficaram pisadas
Se o novo merece a sua vez
Eu, quase velho, vou ter que passar fome então!
Tem um mundo morrendo de inanição
E estas também estão nas idéias
Têm muitas cabeças pensando em nada
Engolindo o pó de suas trincheiras
Achando graça na esperteza
Quimeras para quem só pensa em levar vantagens...
Queimaram florestas no mundo inteiro
Abriram as comportas da vergonha
Enquanto a nau navega procurando...
Cortaram línguas, dedos, mãos & cabeças
Batatas podres, anéis do poder
Matracas aflitas expondo suas mesquinharias
Das moedas que recolho pelo chão
Todas perderam sua mais valia
Caroços para implantes cibernéticos
Ninguém, é como sou chamado
Velho pirata que grita na calada da noite
Dos Jardins suspensos da Babilônia
Sobrou o pó em migalhas na nova Babel
Crentes para ofícios & vícios
Viúvas de Cartagena tomada
Os Urais na fornalha de Blake
À Mitra, fogos-fátuos & Curupiras
Nas lendas, outros uivos ainda latinos
A nave desceu no morro Inca
Cornucópias nas páginas sintéticas
Entre ciborgs que não ficaram maltrapilhos
50 mil morrem de fome por dia
Hipocrisias de nações sorrateiras
Eu choro por cada morte, a cada segundo
O coração está apertado com cada porta fechada
Mesmo rindo para manter a dignidade
A lágrima corre a face, enquanto vivo
Essa impotência por fazer tão pouco
Apenas soltar mais um grito
Rasgando a garganta na selva de asfalto
Luzes acessas, fofocas provincianas
Enquanto a lava desce da boca do vulcão
Quantos fizeram obscenas fortunas
Em cima da desgraça de muitos
Idolátras apenas do vil metal
Minha cara está azul de novo
Não tenho balas no canhão
Mas a nau está pronta para a luta
Mesmo tendo que tocar o barco sozinho...

Chorei o tempo que o vento demorou para enfunar a vela!

Peixão89