Paradoxo

A lua e a noite, co-irmãs, sentadas lado a lado, começam a sua conversa com o sol e o dia. As primeiras são Dioníso e os segundos, Apólo.

Lua: Certamente que os homens amam mais a mim do que a vós, poderoso Sol. Pois quanto ao que me cabe saber, conheço todos os suaves suspiros noturnos do amor, da luxúria imanente à minha natureza...

Sol: Pois, irmã, dizeis a mim o que seria de vós acaso não houvesse a mim. Sois apenas um reflexo, ainda que muito belo, da minha própria luz.

Noite: Vós, poderoso Sol, de modo contumaz tem se mostrado insolente. Sua arrogância deve vir das adorações que os humanos, tolos em sua sabedoria das coisas altas, lançam a vós. Eu, pelo contrário, sou sempre colocada como soturna, maligna. À treva sempre me é lançada a identidade!

Dia: Pois não seria de todo o engano dos humanos. As coisas mais abomináveis ficam sempre sob o manto negro da treva. Se meu irmão Sol e eu não aparecêssemos, tudo subsumir-se-ia nas suas ardilosas esquinas. Quando, ao contrário, mostramo-nos, imprimimos a clareza do vislumbre.

Lua: Pois bem, concordo que não são todas boas as ocorrências em meus domínios. Mas do que serviriam os boêmios, as cantigas e os amores sem a carícia que minha irmã e eu derramamos por sobre os corpos? Ademais, quando ocorre algo tenebroso, ao dia e sua iluminação ainda mais o parecem. Se a clareza tem um lado bom quando o que se está por demonstrar é bom, certamente que se o que vier for algo deplorável isso o será ainda mais!

Sol: A falha em suas considerações está em nivelar nossa importância. Os prazeres possíveis só o são porquanto anteriormente fora saciada a necessidade, e esta é justamente aquela em que me mostro com maior contorno. Aqueço e protejo, dou alento e mantenho a ordem.

Noite: Quem precisa de ordem? O mais belo pode ser o mais surreal, o desordenado pode ser o mais aprazível e, se não te convencereis disso, o enfadonho é sempre ordenado.

E assim seguiram por dias, noites, sóis e luas a dentro, enquanto que nós, humanos, nos debruçamos cada vez mais cabisbaixos, sendo que as coisas altaneiras são as que mais importam. A astrologia sob a perspectiva astral é um paradoxo do inconsistente momento de reflexão humano.

Gabriel Dietrich
Enviado por Gabriel Dietrich em 01/04/2010
Código do texto: T2172302