O discurso do poder
Pelo poder conferido a “mim” ou a outra pessoa que “eu” possa ser favorecido, juro, ser fiel igual ao cão, literalmente, nem que para isso, venda a alma ao diabo. Prometo passar por cima da ética, enterrar a verdade, banir os fatos e castigar, para impressionar, os mais fracos. Não importam os sentimentos alheios, desde que não sejam os meus, chorem à vontade.
O poder é o “meu” cajado, e o tráfico de influência vai bem, muito obrigado. Defenderei, até mudar de lado, o desgraçado que junto a mim, diga sempre sim, sem questionar qualquer tratado. Não terei compaixão do pobre, nem dos desafortunados. Não importa a condição, se vulnerável, invisível, desvalido ou necessitado. O termo politicamente correto não muda o resultado.
Mas não será assim, de peito aberto, do tipo escancarado, porque desse jeito serei rejeitado. Só com aqueles que posso punir, que dependem de mim e que esperam por migalhas. Lá fora, eu serei carismático, cheio de dentes na boca, e um bom discurso produz o efeito esperado. Algumas pessoas vão até me amar, e deve, o problema é a correspondência.
Prometo de dedinho que serei bom, até que a conveniência perdure, com o meu braço direito porque ele será a extensão dos meus olhos e ouvidos. Ele fará tudo o que eu preciso, e o que não for do meu agrado será eliminado. Ele esconderá debaixo do tapete o meu erro mais banal.
Prometo prometer e não cumprir, até o fim, tudo o que não trouxer retorno a mim. Para os amigos, o meu sorriso amarelo. Para os ditos inimigos, os rigores do meu rancor. Contudo, não posso ser ruim sozinho, sou até muito bonzinho, o outro é que tira a minha paz. Por outro lado, os meus pares, compadres e padrinhos, não podem ser contrariados, pensar em dizer não, não vem ao caso.
Tenho que fortalecer a irmandade, e não ligo para aqueles que tachar-me como covarde. Deles, não terei proveito algum. É melhor estar ao lado dos poderosos. Existe categoria melhor? Dinheiro chama dinheiro, e a matemática é exata, menos com menos dá mais menos. E não adianta vir com o discurso de empatia, sororidade, resiliência, miserabilidade, distribuição de renda e igualdade.
Se não pertencer ao meu círculo de confiança, está fora. E fora, é fora mesmo. Não tenho piedade ou compaixão, pois estes sentimentos não movimentam a economia, nem engordam a minha conta bancária. Não garante a minha posição, nem a minha empregabilidade. Não sacrifico o meu tempo com aquele que não traz resultado.
Não quero nem imaginar, se o infeliz está moribundo ou passando por maus bocados. A minha estratégia é a permanência no poder, tirar proveito da situação, fazer aliança com quem tem força e que se exploda o cidadão. Não sou pai de todo mundo, nem rabisquei a Constituição, e o que está escrito não se aplica, pois o povo tem memória de rato, até a próxima eleição.