CONTRA A PEC PARA MANDATO DE OITO ANOS DE MINISTROS DO STF

Tramita no Senado Federal a Proposta de Emenda à Constituição – PEC número 16/2019 que objetiva implementar mandato de 8 (oito) anos para os ministros do Supremo Tribunal Federal – STF. O autor demonstra-se categoricamente contra essa proposta, e as suas razões para tal posicionamento seguem abaixo.

A motivação para implementação de mandato para ministros do Supremo Tribunal Federal – STF não encontra uma abordagem institucional para sua propositura no atual contexto político, isso é, fazê-lo está-se a personificar a referida instituição. É, nessa linha, carregada de um viés eminentemente pessoal, antirrepublicano. O ambiente político, é bem verdade, ainda está contaminado com os excessos causados pelo desgaste entre os três poderes da República brasileira, e ele torna-se nítido quando emergem propostas como a em comento.

Contribuir para o esgarçamento do tecido institucional comum aos três poderes tem consequências mais danosas do que benéficas, especialmente porque atua em dissonância com a proposta do Estado brasileiro de ver cumprida a sua pauta de efetivação dos direitos e garantias fundamentais constitucionalmente lastreada.

Mandato pressupõe representatividade, representatividade que é afeta aos poderes Legislativo e Executivo, especialmente. Não se pode olvidar o papel contra majoritário do Supremo, ou seja, dentre suas atribuições precípuas está a de garantir a observação e a aplicação do ordenamento jurídico, isso é, não é a pressão pública que determina as razões dele decidir, a fundamentação dos julgados pela corte. Não se faz novo regramento diante da mera inobservância das regras vigentes. O que se produz em verdade, é anarquia institucional.

O Direito não é mero juízo de conveniência, é imperioso frisar essa frase. Avaliação à margem das regras que se indica não se deve realizar. É cumprindo as regras que se adquire posto para apontar o descumprimento delas. A implementação de mandato no atual contexto institucional soa como uma espécie de retaliação ao Poder Judiciário, esse é o entendimento que se depreende.

A esse passo, há quem sustente que a proposta de mandato para um ministro do Supremo sinaliza uma tentativa de replicar regra feita em países de primeiro mundo. Elucide-se que pelas razões deles entenderam ser a melhor maneira de garantir uma administração republicana. Não se pode simplesmente importar regra administrativa de outro país crendo que ela seja ela assimilada instantaneamente pelo nosso ordenamento. Há que se examinar a aderência da prática importada à nossa realidade política.

É bem verdade que nenhum deles o fez um ambiente político-administrativo desgastado, especialmente quando se questiona a abordagem republicada da proposta e seus reais motivos que justifiquem a sua implantação. Mudanças profundas, como as dessa natureza, sustenta-se, devem ser feitas em condições de mínima serenidade institucional, de coordenação entre os poderes da República. Esse é o ponto nodal da questão.

No universo constitucional, o artigo 95, I da Constituição Federal vigente inicia sua redação tratando da vitaliciedade dos membros do Poder Judiciário. Haverá, pois, que receber uma modificação, seja em sua redação, seja em sua aplicação (via mutação constitucional), caso aprovada a proposta.

Infraconstitucionalmente, eventual mandato para ministros surtirá efeitos, vide a Lei Orgânica da Magistratura – LOMAN (Lei complementar 35, de 14 de março de 1979), que em seus artigos 2º, 22, 25 e outros é expressa ao tratar também da vitaliciedade de seus membros. Ainda no plano infraconstitucional, a proposta pode provocar o que o autor sustenta como “contingenciamento de demandas”. Isso é, nascendo demanda de competência originária do Supremo, o demandante, a depender da composição do Tribunal pode reter o seu petitório, a fim de que, modificada a composição do órgão julgador encontre ambiente judicial mais favorável à decisão que almeja. Não se pode excluir a possibilidade dessa prática como consequência da modificação proposta.

Para tanto, e a fim de evitar esse contingenciamento, seria necessária a criação de regras de prescrição para demandas de competência originária do Supremo, para garantir que as demandas sejam propostas em determinado tempo, ou seja, que o ingresso em juízo não fique condicionado à composição do órgão julgador. Condicionar a propositura de demandas ao perfil do julgador abre precedente que fulmina, que transforma em pó todo o ordenamento jurídico, o qual pressupõe regramento objetivo para apreciação de demandas.

Os defensores da proposta sustentam que ela seria meio para oxigenação da jurisprudência do Supremo. Em verdade, sustenta-se, a proposta cria essa expectativa, mas não se pode garantir que ela funcionaria materializando esse intento, surge-o apenas como uma expectativa a legitimar a proposta. Ademais, o fato é que não é necessário implementar mandato para ministros a fim de oxigenar a jurisprudência da corte, afinal, respeitada a coisa julgada, as votações das matérias podem perfeitamente ser analisadas sobre outros fundamentos, e esses outros fundamentos podem assimilar uma nova apreciação e direcionar a maioria da corte em um novo sentido, ainda que mantida a vitaliciedade de seus membros julgadores.

Como se pode analisar nessa breve construção, foram trazidas ao debate alguns elementos que demandam mais tempo para serem minimamente construídos, sobre os quais pede-se uma análise mais atida das consequências possíveis, especialmente para que não contribua para intensificação do desgaste entre os poderes da República, no qual a sociedade brasileira perde especialmente por ver reduzida a sua marcha enquanto sociedade, sociedade enquanto grupo minimamente coeso (especialmente no contexto administrativo).

Em se tratando de um ambiente institucional coordenado, talvez a questão possa ser melhor recebida, mas, reitera-se, no atual contexto proposta no sentido de implementar mandato para ministros do Supremo soa como retaliação política. O Brasil não pode, ao tempo de hoje, prestar-se a arriscar-se para fazer valer a proposta e já supor colher exclusivamente os bons frutos pretendidos. É preciso pensar nas consequências dessa proposta, e dar-se atenção àquelas que podem mais servir de problemática institucional (interna e externamente) do que a uma proposta de eficácia administrativa teoricamente almejada.

Ednardo C Benevides
Enviado por Ednardo C Benevides em 25/04/2023
Código do texto: T7772715
Classificação de conteúdo: seguro