LEMBRANÇAS DE MEU SERTÃO AMAMBAIENSE

Quem não experimentou o cenário indescritível de uma estrada deserta, no meio de uma mata serrada, depois de uma chuva. Você sozinho andando a pé sobre uma trilha, pisando no chão úmido, quando a areia ainda está meio amarelada pelo contraste entre a sua cor natural e as gotículas d'água que se misturam com os seus miúdos grãozinhos.

Aquela massa compacta que assinala pegadas do seu calçado. Naquele momento o privilégio de ouvir um barulho infinitamente oposto àquele que se vê no meio urbano.

Esse momento único que aflora em minha memória era quando eu ia para a escola do sertão. Eu passava pelas roças de milho de meu querido pai. Era um sítio localizado no sertão amambaiense. Ali também se plantava melancia, abóbora, quiabo, chuchu, além de pés de mamão.

Que cenário era aquele depois de um toró! Viam-se as flores ainda com os respingos que sobraram em seu caule.

Viam-se os pássaros das mais diversas espécies dando vôos rasantes sobre a relva molhada em busca de insetos. Os grilos entoavam cânticos estridentes e tão agudos que penetravam com intensidade aos meus ouvidos. O sapo entoava seus acordes graves e tão intensos que se misturam numa sinfonia pluralista de atos contínuos da imensidão da mata.

De repente parei! Havia pegada recente na estrada. Tratava-se de um bicho indefinido que por ali passou de um extremo a outro à procura da sua presa. Ao alto, notavam-se as lindas árvores que cresceram no sentido vertical à procura dos raios de sol como se fossem gigantes eretos que buscam alcançar as nuvens. No meio delas, entre os entreveros das suas folhas, a existência de frutos silvestres que formam um chamariz de maritacas, sanhaços, bem-te-vis, pombas, papagaios, araras, etc.

As folhagem balançava ao vento e me molhavam levemente com gotículas geladas que causavam calafrios.

A sensação mais intensa era o cheiro gostoso de terra molhada! Era delicioso sentir o cheirinho de mata virgem. Nada melhor do que tatear uma folha larga de verde-oliva que exibia um brilho estonteante. Era uma silhueta comprida, mas que em razão da sua extensão sedia ante o seu peso, mas tentava se segurar no próprio chão.

A contemplação daquela folha é como se fosse uma constatação da vida, visto que uma simples folha, no meio a tantas outras, brigava com o seu próprio peso para manter-se firme na sua posição e na sua condição de unidade, diante daquela parca estrutura rudimentar - o galho.

É sensacional sentir o cheiro do mato penetrando no fundo da alma. Algo inusitado e infinitamente humano que faz o ser humano estremecer. Não se trata de um cheiro comum. Observava-se uma convulsão de vento que entrava nas narinas fazendo o homem arrepiar ante a mistura de um odor indescritível, numa mistura do cheiro de areia molhada com os múltiplos odores das diversas espécies de plantas naturais, rendendo para si um raríssimo ato de respirar ar puro.

Chegava-se o final da trilha.

Esta lembrança me leva hoje a uma sensação leve como se eu saísse de um túnel do tempo.

Só tenho a agradecer a Deus por ter me oferecido esses momentos e por ainda me dar o dom de poder contar aos meus conterrâneos que fui um menino feliz lá na Crepúsculo.

Machadinho
Enviado por Machadinho em 03/03/2022
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