Cidade Morta!

O céu ainda estava nublado.

Em algumas ruas a água ainda escorria calmamente. Tudo parecia tranquilo.

As pernas desnudas ainda sentiam a frieza do vento que passava por entre a mesa de bebidas.

O tempo dizia para ficar em casa até que o calor tomasse seu lugar novamente. Mas na rua dos desejos os sentidos daqueles homens restringiam-se a tomar mais um copo de cerveja, mesmo sabendo que o tempo não estava propício.

Após algumas garrafas vazias os ânimos se mostraram desafetos.

Parecia que aqueles dois jovens, homens de uns 28 anos, iriam brigar.

Secretamente, o que se parecia mais jovem sacou uma arma branca para desferir um golpe no braço do companheiro de cervejas. Em tom grotesco dissera ter sido ameaçado porque o colega lhe julgara sem dinheiro para pagar a conta. Logo, sem condições de revidar o homem ferido correu pela rua, cujas águas se misturavam ao sangue que jorrava de seu braço.

O hospital era seu destino, até mesmo para fugir da presença do agressor. Lá encontrou alento atenção médica.

Na madrugada, ainda carregada pelo frio da chuva, o silêncio parecia perfeito para os sonos mais profundos, mas o barulho de dois disparos acordara a viúva que dormia ao lado de sua filha.

O relógio marcava 4h. Ao som da sirene policial, a senhora tomou coragem e abriu a porta para espreitar o que estava acontecendo naquela rua que se parecia tranquila.

Pela fresta do portão percebeu o movimento de pessoas ao lado de um carro (era o da polícia). Aqueles homens fardados olhavam calmamente o corpo de um rapaz (talvez tivesse uns 17 anos) caído com marcas de dois tiros na cabeça.

Ligaram para o corpo de bombeiros, mas ele parecia sem sinais vitais. Após conversas com os vizinhos, que saíram assustados de suas casas, descobriram que aquele rapaz morava perto da rua dos sonhos. Lá ele era conhecido por causar transtornos aos vizinhos. Era também usuário de algumas drogas ilícitas. Na verdade, fazia pouco tempo que ele começara a fumar substâncias entorpecentes.

Certamente aqueles tiros eram resultantes de algum um acerto de contas. O silêncio reinou frente ao defunto.

Por volta das 13 horas, o porteira da escola esperança recebia quase os últimos estudantes. Na verdade, alguns que sempre chegavam atrasados. Descumprir as regras escolares era o que mais faziam.

No horário do recreio, ou do intervalo, duas meninas circulavam pelo pátio da escola quando se depararam com dois adolescentes recém-chegados à escola.

Um pouco de conversa despertou nos amigos das duas meninas certo tipo de ciúme.

Em discurso de donos do pedaço, logo questionaram o que estava acontecendo. As meninas disseram que estavam apenas conversando, mas aqueles dois ignoraram essa informação e empurraram os adolescentes novatos. Foi briga na certa. Uns empurrões, uns socos e pontapés fizeram com que os professores e a diretora da escola se mobilizassem para acalmar os ânimos daqueles meninos.

Tudo parecia tranquilo na saída da escola. Mas, de repente, um daqueles adolescentes, já na esquina da rua da esperança, sacou um punhal para vingar-se de uns socos que levara.

A algazarra, a gritaria dos estudantes fez que com a viatura da ronda escolar (ela sempre estava na porta da escola durante a saída dos alunos) inibisse aquela briga. O policial tomou o punhal, e mesmo sem levar o adolescente para a delegacia, o advertira verbalmente. Embora em sinais de descontentamento, o adolescente fora para casa sem provocar nenhum dano à integridade física do colega de escola.

Novamente, logo no início da noite, agora sem chuva, dez tiros foram ouvidos na rua das flores. O tempo ainda estava claro e era possível enxergar o corpo caído ao chão em movimentos de sobrevivência. Nenhum esforço dos bombeiros foi possível para reanimar a moça (uma jovem de uns 24 anos) que pertencia a um grupo responsável pelo comércio de drogas.

Misturando-se ao som da sirene da viatura policial, o sino da igreja dava as últimas badaladas em anúncio de uma fé que permanecia no Criador para a superação das mazelas sociais. Tantas mortes sinalizavam os motivos das preces em favor de uma cidade que se mostrava morta.

Até quando a violência urbana levará vidas ao túmulo? Há possibilidades de termos uma sociedade viva?

Rubens Martins
Enviado por Rubens Martins em 17/09/2018
Reeditado em 18/11/2023
Código do texto: T6451417
Classificação de conteúdo: seguro