Homilia na missa dos Santos Óleos 2016, Co-Catedral de Mozarlândia
Amados Sacerdotes e demais irmãos e irmãs aqui presentes,
Cristo é a nossa luz e a razão de nosso ministério sacerdotal.
01.A liturgia desta manhã nos coloca diante da centralidade do mistério dos sacramentos da Igreja. “Os sacramentos são sinais sensíveis da Graça de Deus em Nós”, aprendemos no catecismo antigo. A bênçãos dos santos óleos do Batismo para a unção dos catecúmenos, dos enfermos para a unção dos doentes e da consagração do óleo do crisma para a Confirmação, a Ordenação Sacerdotal e a Ordenação Episcopal, lembra-nos os grandes sacramentos que conferem o Espírito Santo e inserem-se na centralidade do ágape da Igreja, o amor que nos une e nos congrega. A unidade do clero com seu Bispo deve ser a expressão desse ágape. Não há sentido para nós o serviço dos bispos sem a colaboração vicária dos sacerdotes, bem como não há sentido o trabalho dos presbíteros sem a unidade com o seu bispo. Essa compreensão eclesial e teológica faz parte da Tradição da Igreja e a sustém na sua caminhada como Comunidade Escatológica. A missa de hoje não deve ser vista como uma mesmice de sempre, uma obrigação canônica da disciplina litúrgica da Igreja, mas como a novidade de Cristo que nos renova a cada ano e nos conclama a viver a unidade da túnica inconsulta de Cristo, sua Igreja, a túnica inconsulta de cristo. Os padres com o bispo são constituídos pelo sacramento a Ordem para zelar e promover a unidade desta túnica, ameaçada sempre pela ação da divisão e da falta de unidade, cuja motivação se alicerça no orgulho humano, advindo do orgulho do anjo decaído.
02. “Nos sacramentos, o Senhor toca-nos por meio dos elementos da criação. Aqui, torna-se visível a unidade entre criação e redenção. Os sacramentos são expressão da corporeidade da nossa fé, que abraça corpo e alma, isto é, o homem inteiro. Pão e vinho são frutos da terra e do trabalho humano. O Senhor escolheu-os como portadores da sua presença. O óleo é símbolo do Espírito Santo e, ao mesmo tempo, alude a Cristo: a palavra "Cristo" (Messias) significa "Ungido".
03.A humanidade de Jesus, graças à unidade do Filho com o Pai, fica inserida na comunhão com o Espírito Santo e assim é "ungida" de um modo único, é permeada pelo Espírito Santo. Aquilo que acontecera apenas simbolicamente nos reis e sacerdotes da Antiga Aliança, quando eram instituídos no seu ministério com a unção do óleo, verifica-se em toda a sua realidade em Jesus: a sua humanidade é permeada pela força do Espírito Santo. Jesus abre a nossa humanidade ao dom do Espírito Santo. Quanto mais estivermos unidos a Cristo, tanto mais ficamos cheios do seu Espírito, do Espírito Santo.
04.Desde o início do cristianismo chamamo-nos "cristãos", ou seja, "ungidos": pessoas que pertencem a Cristo e por isso participam na sua unção, são tocadas pelo seu Espírito. Cada um de nós deve trazer dentro de si o desejo não somente de chamar-se cristão, mas sê-lo também: disse Santo Inácio de Antioquia. Deixemos que estes santos óleos, que vão ser consagrados daqui a pouco, lembrem este dever contido na palavra "cristão", e peçamos ao Senhor que não nos limitemos a chamar-nos cristãos, mas o sejamos cada vez mais. Esta é a nossa grande alegria: sermos cristãos por graça divina. Pelo dom do nosso batismo somos chamados a sermos diferentes no jeito de viver no mundo, tornando-nos um contraponto com as propostas do paganismo de ontem e de hoje.
05.Como sabemos, na liturgia deste dia, são abençoados três óleos. Nesta tríade, exprimem-se três dimensões essenciais da vida cristã, sobre as quais queremos agora refletir.
- Em primeiro lugar, temos o óleo dos catecúmenos. Este óleo indica como que um primeiro modo de ser tocados por Cristo e pelo seu Espírito: um toque interior, pelo qual o Senhor atrai e aproxima de Si as pessoas. Por meio desta primeira unção, que tem lugar ainda antes do Batismo, o nosso olhar detém-se nas pessoas que se põem a caminho de Cristo, nas pessoas que andam à procura da fé, à procura de Deus. O óleo dos catecúmenos diz-nos: não só os homens procuram a Deus, mas o próprio Deus anda à nossa procura. Nós, sacerdotes, somos chamados a colaborar para que esse encontro do Criador com a criatura se constitua no ordinário da vida das pessoas de nossas comunidades. No próximo sábado cada um de nós sacerdotes, viverá esta bonita realidade na Vigília Pascal, ocasião que serão batizados nossos catecúmenos.
06.O fato de Ele mesmo Se ter feito homem descendo até aos abismos da existência humana, até à noite da morte, mostra-nos quanto Deus ama o homem, sua criatura. Movido pelo amor, Deus caminhou ao nosso encontro. "A buscar-me Vos cansaste, pela Cruz me resgatastes: tanta dor não seja em vão!": rezamos no Dies irae. Deus anda à minha procura. Tenho eu vontade de O reconhecer? Quero ser conhecido por Ele, ser encontrado por Ele? Deus ama os homens. Ele sai ao encontro da inquietude do nosso coração, da inquietude que nos faz questionar e procurar, com a inquietude do seu próprio coração, que O induz a realizar o ato extremo por nós.
07.A inquietude por Deus, o caminhar para Ele, para melhor O conhecer e amar não deve apagar-se em nós. Neste sentido, nunca devemos deixar de ser catecúmenos. "Procurai sempre a sua face": diz um Salmo (105/104, 4). A este respeito, comentava Santo Agostinho: Deus é tão grande que sempre supera infinitamente todo o nosso conhecimento e todo o nosso ser. O conhecimento de Deus nunca se esgota. Por toda a eternidade, poderemos, com uma alegria crescente, continuar a procurá-Lo, para O conhecer e amar cada vez mais. "O nosso coração está inquieto enquanto não repousar em Vós": escreveu no início das suas Confissões. Sim, o homem vive inquieto, porque tudo o que é temporal é demasiado pouco. Mas, verdadeiramente, sentimo-nos inquietos por Ele? Não acabamos, talvez, por nos resignar com a sua ausência, procurando bastar-nos a nós mesmos? Não consintamos uma tal situação de redução de nós mesmos! Continuemos incessantemente a caminhar para Ele, com saudades d’Ele, num acolhimento sempre novo feito de conhecimento e amor!
- Temos, depois, o óleo para a Unção dos Enfermos. Pensamos agora na multidão das pessoas que sofrem: os famintos e os sedentos, as vítimas da violência em nossas paróquias e comunidades, os doentes com todos os seus sofrimentos, as suas esperanças e desânimos, os perseguidos e os humilhados, as pessoas com o coração dilacerado. Ao narrar o primeiro envio dos discípulos por Jesus, São Lucas diz-nos: "Ele enviou-os a proclamar o Reino de Deus e a curar os enfermos" (9, 2). Curar é um mandato primordial confiado por Jesus à Igreja, a exemplo d’Ele mesmo que, curando, percorreu os caminhos do país. É certo que o dever primordial da Igreja é o anúncio do Reino de Deus. Mas este mesmo anúncio deve revelar-se um processo de cura: "...tratar os corações torturados", diz hoje a primeira leitura do profeta Isaías (61, 1). O primeiro fruto que o anúncio do Reino de Deus, da bondade sem limites de Deus, deve suscitar é curar o coração ferido dos homens. Nossa ação como padres deve ir sempre nessa direção: curar os corações feridos, doentes e machucados.
08.O homem é essencialmente um ser em relação. Mas, se a sua relação fundamental - a relação com Deus – é transtornada, então tudo o resto fica transtornado também. Se o nosso relacionamento com Deus se transtorna, se a orientação fundamental do nosso ser está errada, também não podemos ficar verdadeiramente curados no corpo e na alma. Por isso, a primeira e fundamental cura tem lugar no encontro com Cristo, que nos reconcilia com Deus e sara o nosso coração despedaçado. Mas, além deste dever central, faz parte da missão essencial da Igreja também a cura concreta da doença e do sofrimento.
09.O óleo para a Unção dos Enfermos é expressão sacramental visível desta missão. Desde o início, amadureceu na Igreja a vocação de curar, amadureceu o amor solícito pelas pessoas atribuladas no corpo e na alma. Esta é também a ocasião boa para, uma vez por outra, agradecer às irmãs e aos irmãos que, em todo o mundo, proporcionam um amor restaurador aos homens e mulheres de todos os tempos. Neste Ano Santo da Misericórdia nosso Ministério ganha uma contundência especial: levar o Amor Eterno de Deus aos corações distantes de Deus ou machucados pelo mistério da iniquidade.
10.Desde Santa Isabel da Hungria, São Vicente de Paulo, Santa Luísa de Marillac, São Camilo de Lellis, até a eleita Santa Madre Teresa – para lembrar somente alguns nomes – o mundo é atravessado por um rastro luminoso de pessoas, que tem a sua origem no amor de Jesus pelos atribulados e doentes. Por tudo isso damos graças ao Senhor neste momento. E agradecemos a todos aqueles que, em virtude da fé e do amor, se põem ao lado dos doentes, dando assim, no fim das contas, testemunho da bondade própria de Deus. O óleo para a Unção dos Enfermos é sinal deste óleo da bondade do coração, que estas pessoas – juntamente com a sua competência profissional – proporcionam aos doentes, as vezes sem falar de Cristo.
- Em terceiro lugar, temos o mais nobre dos óleos eclesiais: o crisma, uma mistura de azeite de oliveira e com perfumes vegetais. É o óleo da unção sacerdotal e da unção real, unções estas que estão ligadas com as grandes tradições de unção da Antiga Aliança. Na Igreja, este óleo serve sobretudo para a unção na Confirmação e nas Ordens sacras. A liturgia de hoje relaciona com este óleo as palavras de promessa do profeta Isaías: "Vós sereis chamados 'sacerdotes do Senhor' e tereis o nome de 'ministros do nosso Deus'" (61, 6). Deste modo, o profeta retoma a grande palavra de mandato e promessa que Deus dirigira a Israel no Sinai: "Vós sereis para mim um reino de sacerdotes e uma nação santa" (Ex 19, 6).
11.No meio do mundo imenso e em favor do mesmo, que em grande parte não conhecia Deus, Israel devia ser como que um santuário de Deus para a todos, devia exercer uma função sacerdotal em favor do mundo. Devia conduzir o mundo para Deus, abri-lo a Ele. São Pedro, na sua grande catequese batismal, aplicou tal privilégio e mandato de Israel a toda a comunidade dos batizados, proclamando: "Vós, porém, sois raça eleita, sacerdócio real, nação santa, povo adquirido por Deus para anunciardes os louvores d’Aquele que vos chamou das trevas à sua luz admirável. Vós que outrora não éreis seu povo, agora sois povo de Deus" (1 Ped 2, 9-10).
12.O Batismo e a Confirmação constituem o ingresso neste povo de Deus, que abraça todo o mundo; a unção no Batismo e na Confirmação introduz neste ministério sacerdotal em favor da humanidade. Os cristãos são um povo sacerdotal em favor do mundo. Os cristãos deveriam fazer visível ao mundo o Deus vivo, testemunhá-Lo e conduzir a Ele. Ao falarmos desta nossa missão comum enquanto batizados, não temos motivo para nos vangloriar.
13.De fato, trata-se de uma exigência que suscita em nós alegria e ao mesmo tempo preocupação: somos nós verdadeiramente o santuário de Deus no mundo e para o mundo? Abrimos aos homens o acesso a Deus ou, pelo contrário, escondemo-lo? Porventura nós, povo de Deus, não nos tornamos em grande parte um povo marcado pela incredulidade e pelo afastamento de Deus? Corremos o perigo de sermos contaminados com a frieza na fé da parte da Europa neo pagã de nossos tempos. Neste momento, temos motivos para bradar a Deus: "Não permitais que nos tornemos um povo que não seja mais o Povo de Deus'! Fazei que Vos reconheçamos de novo! De fato, ungistes-nos com o vosso amor, colocastes o vosso Espírito Santo sobre nós. Fazei que a força do vosso Espírito se torne novamente eficaz em nós, para darmos com alegria testemunho da vossa mensagem no" no coração de nossa Igreja Diocesana.
14.Mas, apesar de toda a vergonha pelos nossos erros, não devemos esquecer que hoje existem também exemplos luminosos de fé; pessoas que, pela sua fé e o seu amor, dão esperança ao mundo. Encanta-me o testemunho de jovens e casais que atestam-nos a grandeza de alma por seguir e servir a Cristo. Há um multidão de pessoas vivendo a santidade em ambientes diversos da nossa sociedade iníqua e afastada dos valores da fé.
15.Dirijo, por fim, uma palavra a cada um dos padres nesta celebração tão importante: a Quinta-feira Santa é de modo particular o nosso dia. Na hora da Última Ceia, o Senhor instituiu o sacerdócio neotestamentário. "Consagra-os na verdade" (Jo 17, 17): pediu Ele ao Pai para os Apóstolos e para os sacerdotes de todos os tempos. Com imensa gratidão pela nossa vocação e com grande humildade por todas as nossas insuficiências, renovemos neste momento o nosso "sim" ao chamamento do Senhor: Sim, quero unir-me intimamente ao Senhor Jesus, renunciando a mim mesmo .... Impelido pelo amor de Cristo. Trabalhem pelas vocações e nos ajude a encontrar os que Deus chama ao nosso estado de vida. A Diocese precisa de padres, animados pela humildade de Cristo para levar tantas almas aos céus. Esse será o grande presente que cada um pode dar ao Senhor neste Jubileu Diocesano. Que a Virgem, Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, estenda seu manto sobre cada um dos padres aqui presentes, sobre as pessoas que estão sob seus cuidados e sobre seus familiares, especialmente sobre as mães e pais idosos que inspiram cuidados maiores e a presença do filho padre. Deem atenção aos seus pais. Se estão idosos, mais atenção devem dá-los. Nossa Senhora, Mãe dos Sacerdotes, rogai nós. Amém!!!