O ÚNICO CASTIGO

 
Existirá um momento em que todos nós estaremos cara a cara conosco mesmos. Podemos adiá-lo indefinidamente; podemos negar todas as coisas que nos levaram até o presente momento, ou o quanto nossas palavras e ações tiveram efeitos positivos ou negativos nas vidas das pessoas que nos cercam ou que nos cercaram. Podemos nos esquecer de todo o mal que já fizemos conscientemente - pois o mal que é praticado inconscientemente pode ser atribuído à inocência, e portanto, não nos deverá causar culpa, arrependimento ou autopunição; mas fica sempre a pergunta: somos / fomos, realmente, inocentes?

De nada adiantará nos justificarmos diante dos outros, dizendo-lhes que fizemos tudo o que podíamos, ou que não tínhamos a intenção; mesmo que acreditem em nós, nós mesmos não acreditaremos.

Não existe um Deus que nos puna ou nos condene; nem sempre alguém receberá de volta aquilo que praticou, seja bom ou ruim, e basta apurarmos o nosso olhar para constatar esta verdade. A vida nem sempre é justa. Pessoas boas sofrem, e pessoas consideradas ruins, podem triunfar. E no final, todos nós seremos agraciados com o mesmo prêmio: a morte.

Mas se existe um castigo por tudo o que se faz, acredito que ele seja um só. Implacável, pode permanecer silencioso por muito tempo, aguardando adormecido, a cauda enrolada em volta do corpo, o fogo guardado dentro da boca como um dragão adormecido que ignoramos, mas que está sempre lá, naquela caverna, e que um dia, sabemos que despertará e colocará fogo às nossas convicções. Este fogo queimará certezas, iluminará o que está escuro, e nos colocará de frente para o espelho que permanecia coberto por uma névoa de silêncio.

Este castigo – o único que todos temos – é a nossa consciência. Um dia, ela despertará. Quem sabe, isto aconteça quando estivermos na cama de um hospital, ou passando por algum momento difícil (embora alguns nada aprendam ao cruzar os caminhos da dor) ou então, vivendo um momento de pura felicidade, e de repente, nos virmos perguntando se realmente o merecemos depois de tudo... depois de tudo o quê? E tudo então passará na nossa frente como se fosse um filme. E nem mesmo se Deus descesse do Seu trono e nos perdoasse de tudo pessoalmente, deixaríamos de senti-lo, pois ninguém pode voltar atrás naquilo que fez ou deixou de fazer.

A nossa consciência será o peso que carregaremos nos ombros, cedo ou tarde. Ela poderá refletir sobre a nossa saúde, ou sobre nosso estilo de vida e, principalmente, sobre o nosso grau de felicidade. Um dia. Talvez, daqui a muito tempo. Mas um dia que chegará. Espero que todos possamos pensar neste dia, e assim, vivermos as nossas vidas de forma a acrescentar a menor quantidade de peso possível nesta bagagem que um dia carregaremos para sempre conosco. Que a maioria dos males que praticarmos seja fruto não de nossa maldade consciente, mas da nossa inocência.




 
Ana Bailune
Enviado por Ana Bailune em 06/03/2016
Reeditado em 06/03/2016
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