O Neo-apartheid à Brasileira
Escrevi este texto mediante tantos atos de segregação contra nordestinos. Não sou um do Nordeste, mas filho de pernambucanos e sei o quanto meus pais lutaram para criar a mim e aos meus irmãos e conheço a outros tantos que fizeram o mesmo. O texto não é um apelo à briga, mas à tolerância.
Incrível como o ser humano esquece facilmente a História. No transcorrer do Segundo Turno de nossas eleições e agora com o final deste vejo o renascer do besteirol da segregação. Será que os 27 anos de prisão de Mandela nas masmorras sul-africanas do Apartheid não conseguiram deixar em nós marcas provocando a tolerância? Será que a morte de Martin Luther King foi vã e a sua frase "I have a dream!" perdeu o seu eco em nossos corações? Cito os dois casos porque não se diferem do novel caso brasileiro de alguns do Centro-Sul brancos e endinheirados (alguns “comendo arroz e feijão, mas arrotando caviar”), que falam de uma secessão entre os desvalidos do Norte e Nordeste e os que descansam no mar da tranquilidade das terras desbravadas nordestinamente do rico Centro-Sul. Assim como na África do Sul e nos estados do Sul dos Estados Unidos a luta era pelos direitos dos de pele negra (e este não tinham e não deveriam ter culpa por terem nascidos negros), os nordestinos não têm e não devem ter culpa de terem nascidos no Nordeste, principalmente no semiárido.
Talvez falte aos segregacionistas lerem Morte e vida Severina – o auto do Natal Pernambucano de João Cabral de Melo Neto, ou O Quinze da Rachel Queiroz, ou Vidas secas de Graciliano Ramos, ou ainda A bagaceira de José Américo de Almeida. Não chamo a atenção de gente indouta (esta é indouta), mas daqueles que passaram pelos bancos de nossas faculdades, parasitaram os nossos impostos em nossas instituições de ensino público e agora usam da falta mínima de sensibilidade para com os desvalidos que buscam um lugar ao sol. Estudar, pelo menos para mim, não é apenas adquirir sabedoria, mas, sobretudo humanidade.
Sou a favor sim, de repartirmos o pão, e não é com gente preguiçosa, mas aguerrida, que em tempos remotos enfrentaram os paus-de-arara e fugiram em busca de vida no Sul, mitigaram a sua fome e ajudaram no deslumbramento dos campos destes nossos rincões. Se o próprio Jesus transformou cinco pães e dois peixinhos em cestos e mais cestos que alimentaram mais de cinco mil pessoas, por que eu não devo aprender com o meu Mestre que se faz necessário evitar que nossos concidadãos do Nordeste, do Norte e de nossas periferias não precisem cozinhar um punhado de palma, ou batumar um bocado de farinha na água para enganar a fome?
Sou filho de nordestinos, de gente da roça, que sempre buscou e alcançou seu espaço para a subsistência. Não sou preguiçoso, trabalho desde os 07 anos de idade porque meu velho pai pernambucano e minha velha mãe das terras exuenses de Luiz Gonzaga me ensinaram desde cedo que homem tem que trabalhar e levar o pão com honradez para a mesa.
Separar o Brasil entre validos e desvalidos? Jamais. Prefiro dizer como Carlos Drummond de Andrade: "Vamos de mãos dadas." É preferível que venhamos banir de nossas mentes os ideais maléficos da segregação e somemos os nossos grandes adjetivos para juntos construirmos um Brasil justo e para todos.