Fragmento achado de Juan de los Palotes, desaparecido..

"Escrevo para me livrar da tortura. A sombra que me persegue e faz questão de me torturar é indiferente ao que passo e sinto, sabe que isso contribui nesse ritual nada benéfico, nem a mim, nem a sombra. Meus pés tentam criar raízes a medida que tem qualquer relação "agrarável", mas são sabotados pelos ratos que não cansam de roer. Tentativa e erro de minha parte. Observação e sucesso da parte deles. Água e óleo não se misturam, e dessa mistura fizeram o pior traçado que pude beber. Forçado a engolir para hidratar o que restava de mim. Comparado aos traçados antigos, tinha nada de praça, de graça ou abraço. Só de pés descalços roídos, sangue fresco em desuso e peles em pedaço. Escrever é uma tortura, e é o que sobra de mim, quase-ser que nem os vermes querem mais. Corroído por dentro e destruído por fora, apenas deixa-se negligentemente um pedaço meu no que serve de papel, da unha faz-se ponta da caneta e o sangue é a tinta dessa literatura clandestina, primitiva e ultrapassada. Escrevo essas palavras sabendo que são minhas ultimas, e depois dessa tortura nada mais me resta. Nada mais me resta..."

escrito numa época em que a memória era curta, certos filhos desapareciam e a liberdade algo concedido e limitado..