A alegria de ser professor

Caros formandos da primeira turma de Pedagogia da Faculdade de Pará de Minas,

Uma vez eu escrevi um texto sobre ser professor, que começa assim: “Ser professor, para mim, é um prazer, mas também um sofrimento. Prazer, quando eu consigo fazer contato com meus alunos, mesmo em meio a discussões e desacordos (é aquele fervilhar de olhares, aquela troca profícua entre espíritos sintonizados, interessados). É bom demais! Sofrimento, quando não há contato (ou se há, é com um ou outro gato pingado), e, nesses casos, a minha vontade é de ir embora, sumir.”

Com vocês, queridos formandos, desde o primeiro dia de aula eu senti prazer, porque houve contato, sintonia: uma coisa difícil de explicar, mas que vocês vão entender quando forem para a sala de aula, como professores: a gente percebe isso nos olhares, nas feições, no clima da sala.

Ao entrar nas salas do primeiro período, em fevereiro de 2010, eu senti as turmas carregadas de uma energia boa; e hoje, ao pensar no resultado de todo o trabalho que realizamos juntos durante aquele ano, eu sinto muito orgulho e satisfação. Não dá para esquecer a alegria com que eu chegava para lecionar, com a certeza de que iria ensinar muito, mas também aprender muito. (Cada aula que eu preparava para vocês, quando acontecia, era uma aula para mim também).

Como alunos, ao permitirem essa troca, interessando-se pelo que eu preparava e levava para as aulas, vocês me fizeram sentir prazer em lecionar; e é isso que faz um professor. Porque, para mim, professor não é um simples repetidor de informações, uma máquina de ditar regras e conteúdos. Professor, para mim, tem que encantar e instigar; e ele só faz isso se sente prazer em estar ali, junto de seus alunos. Por isso eu tenho muito a agradecer a vocês. Obrigado pelo prazer que vocês me fizeram sentir em ser professor.

Sentir prazer. Gostar do que faz. Isso é muito importante em qualquer profissão.

Na vida de vocês, não se preocupem em conquistar o mundo, subir aos ápices da carreira, do dinheiro e do poder. Isso é bobagem. Sejam honestos com os outros, mas principalmente com vocês mesmos. O que vocês realmente querem? Qual o sentido da vida para vocês? Sigam seu coração. Sintam o que está dentro de vocês, no fundo da alma; deixem-se guiar pelo amor... Às vezes é difícil, dói; mas vale a pena.

Amar... Sentir... Sejam como os dragões de Caio Fernando de Abreu, que uma vez escreveu, num texto muito bonito:

“Dragões, você sabe, são animais mitológicos. Dragões não existem. Como escritores, músicos, pintores, filósofos, ou todas essas pessoas que – loucas – querem sentir num mundo em que é ridículo sentir. Você tem é que ganhar, conquistar poder e glória. Os dragões desprezam esse paraíso. Têm asas e querem voar. Como os anjos.”

O título do livro onde esse texto se encontra é muito sugestivo: 'A vida gritando nos cantos'. Interessante... Muitas vezes, a gente valoriza demais a aparência, a imagem de sucesso e respeitabilidade que queremos passar ao outro, a busca desenfreada pelo supérfluo; por isso essa obsessão por estar no topo, ser o melhor, o mais rico, o mais poderoso (que canseira!); e assim, a gente acaba deixando a vida “nos cantos”: a verdadeira vida, aquela que pulsa no coração, no sentimento, naquilo que realmente importa para sermos felizes. E a vida grita nos cantos... E se não lhe dermos atenção, chegaremos ao fim de nossa curta trajetória terrena cheios de glória, talvez; mas e daí? Essa é a grande questão: e daí?

Uma vez, o poeta Mario Quintana, referindo-se a alguém muito importante, escreveu num poema:

“Em toda a sua vida

Apenas restava de seu a Glória,

Esse irrisório chocalho cheio de guizos e fitinhas

Coloridas

Nas mãos esclerosadas de um caduco!”

Essa glória de guizos e fitinhas coloridas é falsa, efêmera. A verdadeira glória está no coração – na pureza e na simplicidade do que é essencial – e na comunhão de nosso espírito com Deus, que não exige de nós nada dessas coisas que para muitos homens são importantes e pelas quais, muitas vezes, eles roubam, enganam, mentem, às vezes até matam: prêmios, honrarias, riqueza e poder.

Isso não quer dizer que vocês, como professores, serão pobres (materialmente falando). Fazendo o que vocês gostam, com amor, competência e dedicação, a recompensa maior não é o dinheiro, mas ele acaba vindo também, como resultado da escolha certa. Eu vivi isso. Eu quis ser professor. Superei uma série de obstáculos (o pior deles: o preconceito) e me tornei professor da disciplina que eu escolhi, ouvindo meu coração: História. Uma grande paixão. A satisfação, o prazer, a alegria de ser professor é a recompensa maior; mas eu também tenho um bom salário (como professor!), e estou muito satisfeito com ele. Espero que vocês conquistem isso também.

Ah, e não se esqueçam de lutar por mais respeito (da parte de donos de escolas e autoridades públicas) pela nossa profissão. Estamos precisando.

Para terminar, as crianças. Muitos de vocês vão lidar com crianças. Sigam o exemplo delas. Não deixem morrer a criança que há em cada um de vocês: a criança que brinca e ama o que faz, porque faz brincando. Não façam como o grande poeta português Fernando Pessoa, que uma vez escreveu:

“A criança que fui chora na estrada.

Deixei-a ali quando vim ser quem sou;

Mas hoje, vendo que o que sou é nada,

Quero ir buscar quem fui onde ficou.”

Sejam felizes. É o que eu desejo a todos vocês, de coração.

Flávio Marcus da Silva
Enviado por Flávio Marcus da Silva em 02/08/2013
Reeditado em 02/08/2013
Código do texto: T4416043
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