Discurso sobre a liberdade

Há dias na vida em que aquilo pelo que mais ansiamos é a liberdade. E é justamente nestes dias raros, que também nos damos conta da imensidão - gradual e desatenta - do nosso auto-aprisionamento.

E o que fazer nestes raros momentos?

Ser de todo o livre, atropelando inclusive a moral social intrínseca em nossa consciência, que nos diz: - Não. Não seja de todo o livre!? Esse dizer (quase um apelo) é capaz de reverberar tão poderosamente em nossa mente e incomodar tanto as sinapses de nossa massa cefálica, que no final das contas, preferimos optar pela estagnação. Obviamente, porque mudar é arriscado demais e nos dá cefaleia.

É de repente que esse desejo de liberdade vem. É como um insight.

E o pior é que repentinamente também ele evade-se, fazendo-nos portador de uma espécie de estado de amnese.

Mas quando ele vem, nos possibilita refletir e então concluir, que o único e possível responsável pelo encarceramento dos nossos desejos somos nós mesmos, e mais ninguém. Não são as leis impostas pela Constituição, nem as normas básicas para uma boa convivência humana, nem nossos pais, chefes e muito menos a União. O governo não tem nada a ver com isso.

No entanto, sobrepõe-se sobre o nosso querer agir, uma barreira do tamanho de um arranha-céu intransponível. Uma barreira mais forte - não duvidem - que todos os leões unidos quando circundavam o mais valente dos gladiadores nas antigas arenas. O nome desta barreira é MEDO.

Medo de pensar errado, e daí o martírio e o "peso na consciência"; medo de tentar a vitória e acabar desanimado pela derrota (quando ela ainda nem existe, e quem saiba jamais exista); medo de mudar aquilo que aflige a nossa vida, pois sair da zona de conforto nos causa a mesma sensação de preguiça presente às três horas de uma madrugada fria, quando acordamos e nos vemos desajeitadamente deitados naquele sofá velho de 2 lugares, enquanto uma cama "king size" nos espera, quente e aconchegante no quarto escuro. Mas não levantamos!

Preferimos não mudar a situação. E isto é uma escolha. E escolhas envolvem liberdade.

Somos sedentos de liberdade, mas seres muito, muito...exacerbadamente preguiçosos.

Privamo-nos de sermos livres até em nossa oralidade...consequência esta de um pensamento escravizado e sem previsão de alforria.

Duvidam?

Pois bem, reflitam quantas vezes quiseram dizer algo (que expressasse a real opinião) e escolheram modificar o discurso para parecerem mais cultos - e até mais poéticos - ao ouvido alheio.

As inúmeras vezes em que se espelharam em um sujeito (supostamente superior a vocês) e portaram-se da mesma maneira que ele, deixando de ser aquilo que são para serem "outros vocês"...expressando-se como aquele sujeito, verbalizando os mesmos dizeres herméticos e inadequados que ele dizia. Aqueles não eram "vocês livres". Eram as suas máscaras, nada fidedignas àquilo que realmente são. Eram vocês sem liberdade de ser.

Deixamos de ser livre a cada opção que escolhemos, em cada atitude que tomamos e em todos os dias da nossa "vida privada". Sim! Todos os dias somos privados da liberdade. Pois cada vez que decidimos por algo, sempre pensamos nas consequências do nosso agir. E isto, por si só, é uma pequena privação de ser.

E àqueles que aparentam fazer tudo na vida sem pensar?

Até eles não são totalmente livres! Podem estragar tudo, mas medem o estrago antes de realizá-lo (ainda que em flashes velocíssimos que anunciam a "futura burrada").

E se alguém discordar desta densa verbalização, taxando-a de nada menos do que verborreica. Ou se considerarem-na contemporânea demais....

Sem receios! Afinal, é sobre a necessidade de liberdade que o discurso se preza. E não o contrário.

No entanto, adianto-lhes uma coisa muito importante: não utilizem estes devaneios para quererem tornar-se livres da noite para o dia. Isto é impossível!

(...) pois nem mesmo este discurso é livre.

Não posso dizer tudo o que sinto e

que queria verdadeiramente dizer.

Mas apenas aquilo que tenho certeza

que me é permitido ser dito ".

Paulo Hirami
Enviado por Paulo Hirami em 09/09/2012
Reeditado em 04/10/2012
Código do texto: T3872415
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