Homilia no Jubileu de Prata Sacerdotal do Pe. Joaquim de Jesus Rocha Cavalcante
Itumbiara, 04 de dezembro de 2011 – II Domingo do Advento
Dom Adair José Guimarães
Excelentíssimo Senhor Dom Antonio Lino, Bispo de Itumbiara,
Reverendíssimo Pe. Joaquim, nosso Jubilando
Reverendíssimo Pe. Orcalino, Presente do Clero do Centro Oeste
Demais Sacerdotes aqui presentes,
Religiosas, Consagradas e Seminaristas,
Familiares do Jubilando,
Amado Povo de Deus.
01.Hoje nos reunimos nesta Igreja Paroquial, dedicada aos Santos Apóstolo Pedro e Paulo, para celebrar o Jubileu de Prata Sacerdotal do seu Pároco, nosso amado Pe. Joaquim de Jesus Rocha Cavalcante. Fomos irmãos no processo formativo do Seminário Menor Bom Jesus de Brasília no ano de 1980. Desde então mantivemos laços de profunda amizade estima e partilha. Não poderia deixar de mencionar a alegre presença do Pe. Bento Maria, reitor do referido seminário no tempo que lá passamos. Foi uma imensa alegria poder encontrá-lo depois de tanto tempo.
02.Nossa celebração transcorre dentro do II Domingo do Advento, tempo este que nos convoca à esperança. Deus vem ao nosso encontro para que possamos nos retornar a Ele. O início do Ano Litúrgico nos insere num processo de renovada esperança e adesão ao Messias que veio no natal e novamente voltará para a grande manifestação dos eleitos de Deus, resgatados pelo Santo Sacrifício da Cruz.
03.As leituras sagradas deste domingo nos edificam com palavras de consolo e alerta. Como no Antigo Testamento, não poucas vezes nos encontramos em situação de exílio e sofrimentos e o Senhor nos anima a mantermos firmes nos caminhos da fé que nos leva a “ver a glória de Deus”. Os caminhos da fé nos conduzem a uma atitude de preparação dos caminhos de Deus. O profeta Isaias nos exorta a que preparemos os caminhos do Senhor e, mesmo na solidão, que aplainemos a estrada de Deus. Como pastor, Deus irá apascentar o rebanho e nos carregará nos braços. Tais promessas vão além de nossas limitadas compreensões e nos remetem à realidade mística da esponsalidade da nossa alma com o Espírito do Criador.
04.O Apostolo Pedro nos faz ver que o tempo dos homens é pequeno, insípido e limitado. Deus é o Senhor do tempo e vai cumprir sua promessa sem demora, contrariando a soberba de muitos que pensam que, ao contrário, irá demorar. Afinal, o Senhor tem paciência conosco, pois espera até o último momento para que nenhuma alma se perca. Mas é bom ficarmos atentos, pois quando menos esperarmos Ele virá como um ladrão. “Ommia transeunt”. Tudo passa. Somente Deus permanece.
05.O Evangelho de Marcos, retoma os ensinamentos de Isaias e nos coloca de prontidão para que os caminhos do Senhor sejam preparados. O que seria esse preparar os caminhos do Senhor, tão enfático no Evangelho de hoje? Não se trata de um caminho curto e finito como nossas estradas sobre a terra. Trata-se dos caminhos do interior dos corações, tão profundos e extensos. Podemos repetir aqui o que muito já se falou: a maior viagem que podemos realizar é aquela dentro de nós mesmos. Isso exige conversão, mudança de rumos e quebra de paradigmas, libertação e cura, renovação e uma volta sem reserva a Cristo, o único capaz de aplainar as montanhas pontiagudas erguidas dentro de nossos corações. Somente Ele é capaz de nos libertar. Advento é isso: um convite à grande cura de nós mesmos e, consequentemente de nossas comunidades.
06.O sacerdote é o homem que, no percurso da Igreja na história, realiza e atualiza a tarefa de João Batista: preparar os caminhos de Jesus nos corações dos homens e mulheres de todos os tempos. O Sacerdote é o “alter Christus”, o outro Cristo. Nenhum homem é digno do Ministério Sacerdotal. Este é uma graça imensa que muitas vezes nos faz derramar lágrimas ao pensar sua beleza, sua grandeza e a grave responsabilidade de quem neste Mistério foi investido por chamado de Deus na Igreja. O padre, tal qual Jesus o Bom Pastor, é chamado a dar a vida pelas suas ovelhas.
07.O Ritual da Ordenação Sacerdotal é um tesouro que toca nossas almas sacerdotais a cada momento que o revemos e com ele rezamos nas datas especiais da nossa vida sacerdotal. O primeiro ato deste rito é o da eleição. O Diácono chama o candidato pelo nome. Nosso nome está escrito nas mãos do Senhor. O escolhido e eleito, como que de um salto, se levanta e se posta diante do Bispo e em voz alta diz: “ad sunt”, aqui estou. Nesta hora o coração do eleito gela e, ao mesmo tempo, efervesce, pois chegou a grande hora, a hora da entrega para sempre. É o momento mais feliz de um Bispo, pois não há festa maior do que uma ordenação de um candidato seguro e cheio de Deus. O Bispo, como Pai, olha e contempla o eleito nos olhos enquanto um presbítero idôneo solicita ao Sucessor dos Apóstolos que, em nome de nossa Amada Igreja, o ordene para a função de presbítero. O presbítero é o ancião, o mais velho na fé, que, em estreita colaboração com seu Bispo, confirmará os fieis na fé verdadeira. O Bispo não pode ordenar sem o testemunho dos que conviveram de perto com o eleito e, ao ouvir que ninguém se manifestou contra o intento da ordenação, vem a doce palavra do ordenante: “com o auxílio de Deus e de Jesus Cristo, nosso Salvador, escolhemos este nosso irmão para a Ordem do Presbiterado, ao que o Povo exultante em júbilo faz ressoar em alta voz: GRAÇAS A DEUS.
08.Após a homilia do Bispo, chega a hora do eleito manifestar o seu propósito de vivência sacerdotal que implica nas promessas e na explicita obediência. Paternalmente o Bispo interroga o eleito com estas palavras: “caro filho, antes de ingressares na Ordem do Presbiterado deves manifestar, perante o povo, o propósito de aceitar este encargo. Queres, pois, desempenhar sempre a missão de sacerdote no grau de Presbítero, como fiel colaborador da Ordem episcopal, apascentando o rebanho do Senhor, sob a direção do Espírito Santo? Eleito: Quero. Queres, com dignidade e sabedoria, desempenhar o ministério da Palavra, proclamando o Evangelho e ensinando a fé Católica? Eleito: Quero. Queres celebrar com devoção e fidelidade os mistérios de Cristo, sobretudo pelo Sacrifício eucarístico e o sacramento da Reconciliação, para louvor de Deus e santificação do povo cristão, segundo a tradição da Igreja? Eleito: Quero. Queres implorar conosco a misericórdia de Deus em favor do povo a ti confiado, sendo fielmente assíduo no dever da oração? Eleito: Quero. Queres unir-te cada vez mais ao Cristo, sumo Sacerdote, que se entregou ao Pai por nós, e ser com ele consagrado a Deus para a salvação da humanidade? Eleito: Quero com a graça de Deus.
09. Em seguida vem a pergunta pertinente do Bispo: Prometes respeito e obediência a mim e a meus sucessores? Eleito: prometo. O Bispo arremata: Deus que te inspirou este bom propósito te conduza sempre mais à perfeição.
10.A seguir o eleito se prostra ao chão, como o grande gesto do despojo, da entrega, do mergulho na solidão da Cruz de Cristo, para levantar dali com total disposição de entregar sua vida e consumi-la em favor do Evangelho. Prostrado o eleito mergulha nos caminhos da prece litânica da Ladainha de todos os santos. O padre que ama o seu sacerdócio, que vive com integridade sua entrega, sabe muito bem dizer o que aquele momento representou para sua vida no dia de sua ordenação. Ao final da ladainha o bispo, solene e olhando para o eleito estirado ao chão, clama: Roguemos, irmãos e irmãs, a Deus Pai todo-poderoso que derrame com largueza a sua graça sobre este seu servo, que ele escolheu para o cargo de Presbítero.
11.O momento central da Ordenação Sacerdotal se dá com o gesto da imposição das mãos. Primeiro o Bispo impõe suas mãos quentes e ungidas pela apostolocidade na cabeça do eleito, silenciosamente. Na sequência todos os sacerdotes concelebrantes. Inerme e embebido pela beleza do gesto ritual, o eleito vai sentido o pousar das mãos dos seus novos irmãos no ministério que na sinfonia do silêncio evoca o mais sublime amor que vem da Igreja. É a prova do Mistério indelével da graça que marca o eleito para sempre. “Ecce sacerdos in eternum”. A seguir temos a belíssima Prece de Ordenação Presbiteral, profunda, aglutinante, mistagógica e anaminética. O núcleo central da mesma plasma na alma do eleito o Dom indelével do Sacerdócio com a “ipissima verba” do Bispo, legítimo sucessor dos apóstolos: “Nós vos pedimos, Pai todo-poderoso, constituí este vosso servo na dignidade de Presbítero; renovai em seu coração o Espírito de santidade; obtenha ele, ó Deus, o segundo grau da Ordem sacerdotal, que de vós procede, e sua vida seja exemplo para todos”.
12. Após a prece de ordenação, o novo padre, recebe os paramentos sacerdotais, a estola e a casula. Um padre o reveste. Neste momento o olhar do novo padre percorre rapidamente o seu corpo de cima a baixo e contempla algo singular, as vestes sacerdotais que o acompanharão para o resto da vida e, com as quais, no derradeiro momento neste mundo, deverá ser sepultado para a glória de Deus.
13.O novo padre parece, neste momento, viver uma letargia sobrenatural, foge-lhe o tempo e o mesmo é fisgado pela eternidade de Deus, pois a partir de então será um com Cristo, pois fará as vezes d’Ele ao administrar os Santos Mistérios. O cerimoniário o levará diante do Bispo, que sentado na cadeira em frente do altar, com o gremial branco sobre o colo. O neo sacerdote, ajoelhado, em atitude humilde, apóia suas mãos espalmadas para cima sobre o colo do Bispo que as unge com o óleo santo do crisma. Enquanto o Bispo faz deslizar com seus dedos o óleo sobre as mãos gélidas e trêmulas do novo padre, ecoa pelos seus lábios do grande sacerdote, o Bispo, as doces palavras: “Nosso Senhor Jesus Cristo, a quem o Pai ungiu com o Espírito Santo, e revestiu de poder, te guarde para a santificação do povo fiel e para oferecer a Deus o santo Sacrifício”. Há um costume secular de o Bispo cingir as mãos do neo sacerdote em sinal de atamento total a Cristo. Quem as desata, em seguida, é a pessoa a quem por primeiro receberá a bênção do novo padre. Geralmente a mãe ou quem lhe faz as vezes. Na sequência o novo padre recebe o abraço do Bispo e dos sacerdotes presentes que osculam suas suaves e perfumadas mãos que, de ora em diante, serão as mãos do própria Jesus a abençoar e consagrar.
14.Momento sublime é a entrada das oblatas, pão e vinho, a serem oferecidas no Santo Sacrifício da Missa que são entregues ao Bispo que as entregam ao novo padre, ajoelhado diante de si, dizendo: “Recebe a oferenda do povo santo para apresentá-la a Deus. Toma consciência do que vais fazer e põe em prática o que vais celebrar, conformando tua vida ao mistério da cruz do Senhor”.
15.É um dia inesquecível para o novo padre, para seus familiares e para a Igreja. Há 25 anos Pe. Joaquim de Jesus viveu tudo isso na Catedral Diocesana de Santa Rita, aqui em Itumbiara. Eu estava lá, como diácono, quatorze dias depois vivenciaria o mesmo dom em minha cidade natal, Campinorte. Momentos belos, inesquecíveis e imerecidos por nós, pobres homens carregados de limites e pecados. Junto com Pe. Joaquim, meu amado irmão de seminário e de vida sacerdotal, pude viver tudo isso. A ele sou imensamente grato, pois foi quem me recebeu em 1979 em Brasília no encontro de preparação para o ingresso dos novos seminaristas no seminário. Seu sorriso, sua ternura e enorme interesse pelas vocações me cativaram profundamente naquele encontro no pobre Seminário Menor Bom Jesus de Brasília. Nascia ali uma amizade entre nós que marcou nossas vidas. Os estudos, as orações, as partilhas, as dificuldades, sempre nos aproximaram. A presença de nosso Reitor, Pe. Bento Maria, aqui presente, nos inseriu no mundo objetivo da eclesialidade, no amor à Igreja e ao Sucessor de Pedro, na devoção a Nossa Senhora e nos selou com uma visão do ministério sacerdotal como Dom de Deus a ser vivido com entusiasmo e amor a partir da liturgia, sobremaneira da eucaristia. Entendo que as bases da compreensão do nosso mistério nos foram transmitidas no Seminário Menor.
16.Recordo-me vivamente que juntamente com o Pe. Joaquim éramos os responsáveis pela Capela do Bom Jesus que servia ao seminário e ao povo das proximidades. Já no final do ano de 1980, dias após da nossa cerimônia de vestição em que recebemos solenemente das mãos de Dom Geraldo Ávila a batina, limpávamos a capela e a sacristia ao som de belos cantos gregorianos e já sabíamos que iríamos para seminários diferentes e fizemos o compromisso de um participar da ordenação do outro. Além do mais, cada um falava do como seria a vivência no futuro ministério e como seriam nossas paróquias. Nunca ficamos distantes um do outro. Pe. Joaquim seguiu para Juiz de Fora, eu para o Seminário Maior de Brasília e um ano depois para o Rio de Janeiro. Sempre nos visitávamos um ao outro, além das inúmeras correspondências que trocávamos relatando assuntos acadêmicos, pastorais e espirituais.
17.Como padres nos visitamos sempre. Sempre foi uma bênção celebrar na paróquia um do outro, ministrar palestras e encontros. Vejo o Padre Joaquim como um homem apaixonado pela Igreja, pela verdade. Sacerdote impoluto, sempre se demonstrou zeloso pelas vocações e pelos sacerdotes. Quantos padres já foram ajudados por ele, inclusive de minha Diocese. O amor pela Liturgia e pela formação dos futuros padres é uma das grandes virtudes do Pe. Joaquim, além da solidariedade com os que sofrem na sua paróquia. Como é belo escutar ao longo da vida as pessoas falarem bem do seu pastor. Mesmo carregado de limites, comum a todos os mortais, sabe se imolar pelo bem das almas.
18.O nosso jubilando é um sacerdote carregado de salutares virtudes sacerdotais. É um testemunho vivo de que é possível viver o sacerdócio com fidelidade, zelo, probidade e simplicidade. A Palavra de Jesus, “o zelo pela tua casa me consome” pode ser muito bem aplicada ao Pe. Joaquim que é um padre que ama a Igreja com sua vida e por ela se imola.
19.Nestes tempos difíceis para a Igreja que enfrenta a perseguição fora e dentro dela, que sofre com a decadência de alguns sacerdotes mergulhados nas trevas do pecado e da desobediência, absortos pela prática do hedonismo e do relativismo, temos consciência da necessidade absoluta do sacerdócio ordenado na Igreja. Um padre que busca a santidade modifica a vida de uma cidade e transforma a vida de pessoas e famílias inteiras. Pena que muitos sacerdotes ainda não foram capazes de descobrirem a grandeza e a beleza do ser padre. Quando São João Maria Vianey disse que se os sacerdotes soubessem o que é ser padre morreriam, não de susto, mas de amor, ele disse uma grande verdade. Precisamos descobrir isso. A força do nosso sacerdócio está em Cristo. Presidir a celebração do Santo Sacrifício Eucarístico deve ser o núcleo central da vida de um padre, bem como a adoração do Mistério Eucarístico fora da missa e a recitação da Liturgia das Horas. Desta feita, meu caro irmão Pe. Joaquim, celebre sua missa sempre como se fosse a primeira, como se fosse a última, como se fosse a única. Parabéns pela sua fidelidade à Igreja e pela sua colaboração com seu bispo e o presbitério.
20.Que a Virgem Maria, Mãe dos Sacerdotes, interceda pela sua perseverança e entrega sem reserva até o fim de sua vida, quando, com o Apóstolo Paulo, poderá dizer: “combati o bom combate e guardei a fé”. “Tu és sacerdote para sempre”, que o Senhor te guarde na perseverança final. Amém.