O VALOR DAS COISAS
“O valor das coisas não está no tempo em que elas duram, mas na intensidade com que acontecem, por isso existem momentos inesquecíveis, coisas inexplicáveis e pessoas incomparáveis.”
Fernando Pessoa
Talvez eu devesse abrir esse discurso citando Paulo Freire, Emilia Ferreiro ou qualquer um dos outros pedagogos que impulsionaram nossos estudos, certamente daria a pessoa do orador um ar de educador ativista, a impressão de uma educação engajada, nós não os esqueceremos, é bem verdade, mas achamos que Pessoa tem muito a nos ensinar. Muito mais do que podemos imaginar. Posto que a educação não se faz apenas com teoria, engajamento político, práticas inovadoras, mas também com poesia. Paulo Freire, bem como Chalita incluiria aqui amor.
Há pouco mais de um ano, ingressávamos nesse curso, um grupo de idéias, idades e origens diferentes. Gente de todos os tipos, Uma massa heterogênea. Cada um com suas razões, com seu ponto de vista, buscando novos rumos para suas vidas. O nosso curso não se estenderia pelos quatro ou cinco anos costumeiros, pois todas ali presentes já possuíamos uma graduação anterior. Talvez por isso começamos o curso com a perspectiva de um envolvimento menor com as pessoas que agora nos rodeavam. Ledo engano.
O caminho não foi fácil de trilhar, é importante que se diga, houve espinhos. Sob a forma de renúncias, projetos e práticas pedagógicas, artigos complicados, trabalhos que quase sempre nos tiravam do aconchego familiar e que nos roubavam as noites ou os finais de semana de descanso. Sim, de fato não foi fácil demais. Mas superamos. Os mesmos projetos que nos deixavam de cabelos em pé, transformaram-se em alegria. Viraram oportunidades de confraternização e conseqüentemente belas fotos que ilustraram nossas redes de socializações. E todos nós aprendemos muito com isso. Uns com os outros. Unidos. Amigos. Não é o tempo que coordena nossas emoções, mas sim a intensidade com que as coisas acontecem. Lição número um de Pessoa, aprendida com muita satisfação por cada uma de nós.
Durante essa caminhada reencontramos velhos companheiros e reforçamos ainda mais os laços de amor que agora nos envolvem o coração com a força da amizade verdadeira. Conhecemos também pessoas novas. Fizemos novas amizades. Algumas talvez estejam se encerrando agora. Seria demais querer que todas ficassem “unha e carne” até o fim dos dias. Algumas amizades, daqui por diante, vão se resumir a um recadinho no orkut ou no facebook, um email respondido com carinho e nostalgia, um bom dia efusivo no supermercado. Coisas que com o tempo, inevitavelmente, rarear-se-ão. Mas um dia quem sabe, revirando nossas coisas encontraremos as fotografias dessa nossa travessia. E depois de rirmos por um tempo dos nossos modelitos ultrapassados, que possamos refletir no bem que fizemos uns aos outros, em como foi gostoso esse tempo. E como foi curto também. Em quão incomparáveis são as pessoas que se destacam conosco nessas recordações.
As pessoas... Aliás, este é outro aspecto de que nos fala Fernando Pessoa. Juntas, vivemos momentos de alegrias e tristezas em comum, um ideal a ser conquistado... juntas, vencemos! Pela convivência, pelos laços que se fortaleceram ou se formaram, não nos despedimos agora, apenas nos cumprimentamos por acreditarmos que ninguém vai só, mas prosseguimos juntas na lembrança e na esperança. Agradecimento recíproco por conviver com pessoas tão diferentes.
Estamos encerrando mais uma graduação, mas o papel não contempla o que esse período nos proporcionou: os apelidos, os grupos tão unidos, as piadas, as compras nossas de cada sábado, a assistência cosmética personalizada, afinal somos mulheres, vaidosas por natureza.
A alegria durante as aulas também será lembrada com carinho: Um sábado inteiro relembrando nossas brincadeiras de infância, as músicas inesquecíveis. Diga-se epô eta eta ê a nossa alma se voltará cantando para as nossas boas recordações. Os brinquedos que construímos, as historias que vivenciamos, os livros que lemos e os filmes que nos entorpeceram, que o diga “Os narradores de Javé”, ensinamentos que certamente nos fizeram melhores e mais preparadas para assumirmos nossos papeis enquanto educadoras, e Frei Betto, autor a quem aprendi a admirar durante essa graduação, ainda nos lembraria que “ O saber entra pelos sentidos e não só pelo intelecto”.
E as vidas... Vidas que chegaram durante o curso, na forma de lindos bebês, alguns que até vinham iluminar nossos encontros com sua pequenina, mas abençoada presença.
Vidas que se foram... Mães e pais que perdemos juntos. Choramos juntos essa dor e acariciamo-nos uns aos outros na esperança de diminuir tal sofrimento. Mas estamos certos que eles estão aqui nesta noite. E olhando para a platéia podemos quase visualizá-los vibrando por nossa conquista.
Devemos agradecer a todos aqueles que nos ajudaram a chegar até aqui: pais, companheiros, filhos, mestres, madrinha, patrono, patronesse, diretoria, a nossa amiga Gisele, e a cada um que conviveu conosco durante essa caminhada, a nossa gratidão sincera. E a nós formandas, um último detalhe: a responsabilidade que agora pesa sobre nossos ombros, só não é maior que a beleza da nobre função que desempenhamos. Tivemos grandes mestres. Que venham agora nossos discípulos! Que sejam para nós a fonte maior de recompensa. Que sejamos capazes de impulsioná-los a ousados vôos, e sensíveis o suficiente para acolhermos suas dificuldades com o mesmo entusiasmo com que celebraremos suas conquistas. Está noite representa o alívio e a celebração. Uma espécie de agonia e êxtase que envolve o coração de quem sonha e o transforma em chama flamejante que impulsiona às grandes realizações. E que as nossas conquistas não parem por aqui. Ainda quero saber noticias de vocês e ou quem sabe reencontrá-las em cursos de mestrados e tudo mais que sabemos que podemos.
Sucesso a todas e obrigada!
Obs: discurso lido no dia 19/10/2011 na cerimonia de colação de grau da turma de Pedagogia da FAESPE da qual tive a honra de ser oradora.