"Em Brasília, 19 horas"
A disposição que faz ceder o interesses do ego à comunidade é a condição indispensável para a existência de toda civilização humana. Só ela pode criar as grandes obras da humanidade, que ao fundador pouca recompensa trazem, as maiores bênçãos porém às gerações futuras. Só esse sentimento é que explica como é que tantos indivíduos podem suportar honestamente a Política. Todavia, a miséria, a pobreza e a vaidade, quase sempre, firmam para a coletividade as bases da Política. Cada operário, cada camponês, cada inventor, cada funcionário, que vai trabalhando, sem chegar nem uma vez à felicidade ou ao bem-estar, é um expoente desse elevado ideal, mesmo que nunca venha a penetrar o sentido profundo de seu proceder. Enquanto a administração pública se manifestar desta maneira, faltará a base para a formação de uma sociedade sob a forma mais evoluída da cidadania. Já a comunhão entre o digno e o politizado exige uma extensão do caráter para além da desenfreada ambição. O político, por vezes, procura alimento para o filho mais que para os filhos da Pátria. Não há proteção para o cidadão nem muito menos verifica-se, embora elementar, um espírito de sacrifício do governante pelo bem da Nação. No momento em que este espírito de sacrifício ultrapassasse o quadro estreito da vaidade e usura estabelecer-se-ia condições para a fundação de maiores sociedades e, enfim, de verdadeiros Estados. Os povos mais atrasados da terra também estão na política. Quanto mais aumenta a disposição a sacrificar-se por interesses puramente pessoais, tanto mais se desenvolve a capacidade para erigir comunidades menos importantes e mais pobres. Por si mesmo, o político não se caracteriza por ser um homem mais bem dotado intelectualmente, mas, sim, pela sua disposição em pôr todas as suas faculdades ao serviço da comunidade. Se assim for feito, a Política alcançará a forma mais nobre, submetendo-se à vida da coletividade, sacrificando-se se o momento exigir. A razão da faculdade civilizadora e construtora da Política não reside nos dotes intelectuais. Se ela nada possuir fora disso só poderá agir como destruidora e não como organizadora, pois a significação intrínseca de toda organização política repousa sobre o princípio de que cada indivíduo faz de sua opinião e de seus interesses pessoais em proveito de uma pluralidade de criaturas. Só depois de trabalhar pelos outros, recebe ele novamente a parte que lhe toca. Não trabalha mais, diretamente para si mas incorpora-se com o seu trabalho no quadro geral da coletividade visando não o seu proveito mas sim o bem de todos. A ilustração mais admirável de semelhante disposição encontra-se na palavra trabalho que para a arte da política não representa absolutamente uma atividade visando somente a manutenção da máquina administrativa, mas uma criação que vai de encontro aos interesses da generalidade. Em caso contrário, as ações governamentais chamam-se furto, usura, roubo, assalto, etc. Outrora dizia-se "Em Brasília, 19 horas". Hoje o som da abertura da Voz do Brasil, criado por Getúlio Vargas, ganhou outro tom dito por "Sete horas em Brasília". Alimentemos a devoção cívica com otimismo e aguardemos também mudanças no tom da Política!