APRESENTAÇÃO II

Acho que sou um ET. Não mando recados no ORKUT, não felicito aniversariantes e não coleciono amigos para exibir longas listas de popularidade e aprovação. Já que nada aqui se diz que seja incoerente com os sorrisos e falas constantemente amparados na convenção exibicionista dos salões virtuais.

Acho que sou um ET que pulsa a cada vez que meus amados, amor de intimidade e manifestado na reclusão mais visceral, pequenos e frágeis amados a recostar a cabecinha em meu peito maduro para escutar um coração que arrefecido de tanto estourar, de tantas dúvidas, de tantas traições a refratar dos meus olhos a visão de tanta mentira e dizeres soltos ao léu, meio doce e muito mais fel, oculto sob camadas de creme nauseabundo, seguir como um teimoso a pulsar deleitoso.

Sim, sou essa que se compraz na solidão, que recusa as mensagens encaminhadas, que tem sede de confissões inteiramente originais, de olhos nos olhos, de contatos a moda antiga, de restrições a horas diante de uma tela que apenas produz textos, revisões, traduções, trabalho árduo, labuta que se repete a todo dia aquecida no forno do prazer de dar e dar e dar de meu sangue e de tudo a compartilhar: alimento, livros, saber...

Sou esquisita, estranha, amo discretamente, não mais de sofreguidão de reciprocidades ou reconhecimentos.

Sou o silêncio do anoitecer, o canto suave dos pássaros ao amanhecer, a explosão de cores infinitamente multiplicada em raios, de sol, de lua, de escuridão muda.

Sou assim e só. Amo-me com paixão e compartilho esse amor atirado aos que nele se interessam, àqueles que descobriram não ser assim tão importantes para que eu me distancie das palavras sagradas, dos poemas sacrílegos, de meu mesquinho pecado de ser apenas eu para devotar-lhes atenções passageiras estampadas numa tela mesquinha e maleável ou malditamente manipulável. Limitada e deilimitada pequenez.

Solta, em decomposta negligência das convenções mundanas.

E vivo e quanto mais vivo mais amo viver essa vida que cavo de um chão duro e exuberante. A cada dia, todos os dias, até que da vida a fria separação da morte me aparte.

Sou a que diz palavras ásperas pois que verdadeiras, entre elas que não tenho a grandeza de alguém por cuja atenção se voltem famintos e críticos os meus detratores e aqueles que de mim esperam seja eu uma amante virtual.

Já que afinal, sou de carne e osso. Imponho que me sintam, me cheirem, me ouçam, para então experimentar tanto o calor de um abraço, o sopro de uma ternura em ação, o sussuro de uma voz lenta e envolvente, e às vezes um amargo dizer que desaponta, que fere, que transforma e reacende toda a complexidade tanto mórbida quanto esplendorosa da minha vida finita, do meu amor inconstante.

Apenas humanamente amo e partilho nesse frio espaço virtual a partícula infitesimal deste meu ser animal.

Humanamente animal, animalescamente tesão, misticamente impura e diáfana, procuro ser a transparência, a maldição em bençãos e a benção devocional, angelicamente demoníaca, materialmente anjo a divinizar-se sob o influxo do Amor Eterno pleno de ternura e crueza, às vezes uma humilde plantinha, outras um guerreiro esplendoroso em campo de batalhas cósmicas vitorioso e no mais derrotado de angústia a sorver a morte no alívio do nada.