PAULO FREIRE: O caminho de um educador

“Não se pode falar de educação sem amor.”

Paulo Freire

1 INTRODUÇÃO

“Um educador que não se importava em amar o outro e o mundo.” Assim pode ser definida a trajetória deste grande estudioso da educação não só brasileira, mas mundial, Paulo Freire. Para entender sua concepção problematizadora da educação, é necessário termos conhecimento das fases vivenciadas durante sua permanência terrestre.

Observando sua vida, seu contato com a escola e sua posterior formação acadêmica, podem-se inferir aspectos relevantes que o condicionaram a analisar o processo educativo e sua dinâmica geradora. Vendo suas inspirações, percebemos as influências que caracterizam sua concepção educacional trabalhada e difundida em todo o mundo. Por fim, é através do seu conceito de educação que surge toda uma filosofia transformadora da sociedade, cuja meta é a conscientização do indivíduo, como um ser-cidadão, para atingir as mudanças na conjuntura social e disciplinar por que passam os excluídos e oprimidos.

Mais que um legado, Paulo Freire nos deixou uma lição de vida, com seu exemplo de pessoa simples, mas conhecedora da realidade massacrante que presenciou em sua época. Viveu em função dos que não gozavam da primazia educacional, reflexo de uma sociedade desigual e alienadora. Um desejo íntimo de permitir ao homem conhecer-se e intervir no mundo para mudá-lo. Uma mudança justa. E feliz!

2 DA LUZ À TRANSVIVENCIAÇÃO

Na estrada do Encanamento, 724, bairro Casa Amarela, em Recife (PE), nascia uma criança que mudaria os rumos da pedagogia educacional: Paulo Freire.

2.1 Infância, Juventude e Universidade

De classe média, seu pai era oficial da Policia Militar e sua mãe bordadeira e dedilhava piano. Neste lugar, aprendeu a ler e também a escrever, usando gravetos que encontrava no chão, à sombra das mangueiras. Sentado no chão, aprendia as palavras que, mais tarde, o ensinariam a ler o mundo que o cercava. Anunciava-se o mais revolucionário método de alfabetização já criado, que toma como base a realidade do aluno para a efetivação da aprendizagem.

Devido à instabilidade trazida pela crise econômica de 1929 e seus reflexos acentuados, Paulo e sua família, em busca de melhores condições de vida, saem de Recife para residirem em Jaboatão. A esperança de prosperidade num lugar mais pobre desiludiu Freire, que sofreu uma extrema pobreza. Nesta cidade, Paulo concluiu os anos inicias de sua formação escolar, vendo-se obrigado a prossegui-lo em recife.

Entre tantas andanças, com sua mãe, pelos colégios, para conseguir uma bolsa de estudos, foi no colégio Oswaldo Cruz, de Aluízio Araújo, que teve oportunidade de seguir estudando, já com 16 anos de idade. É neste ambiente que consegue seu primeiro emprego, como professor de Português. Lecionando Língua Portuguesa, ele conhece Elza, com quem conviveu por mais de 40 anos e geraram cinco filhos. Paulo, ainda, cursou Direito, descontente com a profissão de advogado. Sua “carreira” de advogado resumiu-se a uma única causa: cobrar dívida e anistiar o devedor (um jovem dentista). O rapaz alegrou-se por ele ser advogado, e Paulo de por deixar de sê-lo.

2.2 SESI: Antes do Exílio

Após virar a página do Direito, recebe um convite para exercer um serviço no SESI, de Recife. Foi neste espaço que despertar seu entendimento critico e ético do ato educativo. No SESI, atuou de forma expressiva, inovando métodos até então utilizados. Com os professores, surgem as discussões acerca de suas pedagogias desenvolvidas em sala de aula. Entendeu que educar era, sobretudo, discutir as condições materiais de vida do aluno. Chamado em 1958 a um congresso de educação de adultos, a convite do então presidente Juscelino Kubitschek, uma manifestação do pensamento é dita: o problema não esta no analfabeto, no analfabetismo ou na forma de alfabetizar, mas sim na miséria que assola a população.

Nos anos inicias da década de 1960, engaja-se nos movimentos de educação popular, fundando o Movimento de Cultura Popular (MCP), onde Poe em pratica o “método Paulo Freire de alfabetização de adultos”. Neste ambiente, ele trabalhou para assegurar a inserção critica e transformadora das classes oprimidas na sociedade brasileira, a partir da cultura popular. Do MCP, ele se encoraja na Universidade de Recife, hoje Universidade Federal de Pernambuco. Lá, ele edifica todo o pensamento experimental de alfabetização, concretizado na cidade de Angicos, no Rio Grande do Norte. No meio desta revolução, voluntários se embrenham nesta campanha de alfabetização, que postulava ensinara ler e escrever em somente 40 horas. Sob as luzes de lampiões a querosene, em grandes salas de aulas, montadas em casas extensas, 300 trabalhadores rurais foram alfabetizados neste período. Os resultados foram tão positivos que o ministro da Educação Paulo De Tarso Santos convidou Freire a adotar esta metodologia de alfabetização em caráter nacional. O próprio João Goulart entregou os diplomas aos formandos.

A expressão estudantil revela-se como uma peça fundamental na engrenagem política da época. Há uma forte competição política e profunda criatividade. A veia católica, posteriormente cristã, congrega toda a massa de estudantes, que conduz Paulo Freire a todo o Brasil. Suas ideias ganharam enorme repercussão, tendo em vista que não eram simplistas. Dos anos 1950 para os 1960, a História brasileira vive um momento de democratização, viabilizando a possibilidade dos alfabetizados terem direito ao voto. Esta agitação foi alicerce para a crença de que a educação verdadeiramente mudaria a estrutura do país.

Propusera uma educação que gerasse a metamorfose da sociedade, capaz de direcionar o homem a sua essência de cidadão. Então, chega ao Ministério da Educação, como coordenador do Programa Nacional de Alfabetização, o qual, utilizando seu método, pretendia alfabetizar 5 milhões de adultos em um ano. O Plano foi extinto pela Ditadura Militar, logo depois do golpe. Paulo Freire foi preso e mandado ao exílio.

2.3 O Exílio: Longe da Pátria, Perto do Coração

No exílio, Paulo Freire logo conquistara respeito e admiração por parte dos governantes, intelectuais e educadores de todo o mundo. Sabia mostrar-se como uma pessoa amável e que causava admiração. Vive como um cidadão do mundo, em suas andanças por alguns países.

2.3.1 Bolívia

A Embaixada da Bolívia foi a única que o aceitou como refugiado político. Em setembro de 1964, Paulo Freire deixa o Brasil rumo ao exílio em Santa Cruz de La Sierra. Fora de Brasil, ele atingiu seu auge de produção intelectual, com ideias novas e mais trabalhadas, levando na bagagem uma trajetória de experiências singulares na alfabetização de adultos, de grande alcance social.

Enquanto esteve afastado de sua pátria, grupos de estudantes se dedicaram em sondar as entranhas das obras freirianas. Distante do país, Paulo passa a compreender melhor ao Brasil e si mesmo.

2.3.2 Chile

Prezado pelos chilenos, Paulo ingressa no Instituto de Desenvolvimento Agropecuário, onde promove atividades de capacitação, alfabetização do camponês, expondo como se realiza “o fazer”. Estes trabalhos possuíam um cunho reflexivo, de abrangência psíquica do trabalhador, pata detectar o grau de percepção do mesmo.

Neste país, Freire enuncia a concepção de oprimido, que mais tarde apareceria no livro Pedagogia do Oprimido, resultado dos primeiros anos de exílio e que expressa suas vivências com a educação popular, de conscientização, libertação e justiça social. Em seguida, é convidado a lecionar na Universidade de Harvard, nos Estados Unidos.

2.3.3 Suíça

Salta-se aos olhos sua postura de ingovernável, agora em Genebra. Ciente da condição, o Conselho Mundial das Igrejas sabiamente concede a Paulo Freire o livre arbítrio de viajar para atender as solicitações feitas por todas as partes do mundo, após receber o convite de atuar na instituição. Ele, agora, ganhou maior dimensão mundial.

Neste período, Paulo Freire “andarilhou” pelos continentes africano, asiático e europeu, exercendo atividades político-educativas. Levava suas ideias tão evidentes, que as pessoas não as analisavam com atenção e, por isso, não as notavam.

2.3.4 África

Por fim, chega à áfrica, onde presta serviços em Guiné-Bissau, Cabo Verde, Angola e São Tomé e Príncipe. Trabalhar no continente africano foi recordar um pouco de casa, posto que a cultura, o clima, a simplicidade, o contato humano, resgatavam o modo de vida dos brasileiros.

A experiência africana clareou o sentido de colonização para Freire. No seu retorno à terra querida, o Brasil, confessou a saudade que habitou ser íntimo, o desejo de regressar, a alegria de estar de voltar, sua “felicidade menina”.

2.4 A volta: Reaprendendo o Brasil

No seu pensamento, Paulo atribui sua volta ao Brasil aos que ali ficaram, esperançosos por seu retorno. Logo, é requisitado para palestrar em diversos lugares. Atende aos pedidos com grande satisfação, pois deve a todos eles a sua possibilidade de volta.

Em uma dessas visitas, agora no TUCA, Paulo se deparou com uma multidão amontoada em cadeiras, no chão, nos corredores, de modo que havia lá uma espécie de êxtase por causa de sua presença. Ao adentrar de braços abertos com seu terno branco, é delirantemente aplaudido de pé pelos que ali estavam. Questionado sobre um possível espanto ao ver tanta gente o aplaudindo por muito tempo, Paulo Freire afirma que se manteve tranqüilo. Justificou-se dizendo que ninguém aplaude o outro, mas a si mesmo no outro. As vaias, sim; são direcionadas ao outro. Mas os aplausos simbolizam a concordância com as ideias apresentadas. Que quem ouve comunga daquelas ideias. Ora, se alguém concorda com uma ideia, é porque esta lhe é comum, como se fosse sua. Então, quem aplaude o outro se sente parte integrante dele.

Em uma implantação do processo de alfabetização paulofreiriana, em Caxias, pela Fundação Educar, foram utilizadas as ideias originais do educador. Isto resultou na critica do mesmo. Era preciso observar os fatores indispensáveis naquela situação atual, esquecendo-se das características iniciais do pensamento de Paulo Freire. Como conselho, Freire propôs que suas ideias fossem revigoradas, modificadas e transformadas. Ele dizia que estudar não era um ato de consumir ideias, mas de criá-las e recriá-las.

2.5 Secretaria

Paulo Freire assume o cargo de Secretário Municipal de Educação da cidade de São Paulo. Inquietava-se com os fatos corriqueiros. Uma de suas primeiras providências foi pôr papel higiênico nas escolas públicas municipais, dando um caráter digno e sustentável de condições viáveis de trabalho e exercício do ato pedagógico.

Freire trouxe uma nova atmosfera na Secretaria, que despertou ânimo nos professores, desejo de possuir uma escola mudada, que permita uma atuação mais efetiva. Outra coisa marcante no comportamento de Paulo Freire era o fato de ele chamar os funcionários pelo nome e jamais pedir para eles executarem um encargo pessoal.

Ao advertir alguém, fazia vários subterfúgios até chegar ao assunto em questão, sempre com elegância e respeito. A sua simplicidade de vida residia nesta clareza em falar com o outro, em ser direto, falar com franqueza, que chegava a ser algo raro.

2.6 A Morte

Eis que chega o momento da transvivenciação de Paulo Freire. Seu coração, fraterno e amável a todas as gentes e solidário às causas do mundo, cessou de movimentar. A morte o silenciou, mas não selou sua indiscutível e inestimável obra.

No prenúncio de sua finitude vivencial, ele declarava estar repleto de “alegria menina”, que sempre permaneceu menina. Nunca amadureceu; sempre se conservou doce e pura, como uma menina.

Em sua permanência no exílio, ele expressava sua carência por elementos do país, como a banana. Pode até parecer algo sem importância, em face de suas grandes ideias, mas ele era o pacto do raciocínio filosófico com a percepção da simplicidade da vida. Uma lição que não se pode rejeitar.

3 INSPIRAÇÕES: A REALIDADE

Pode-se dizer que o cerne que iluminou o espírito e, consequentemente, a ideologia de Paulo Freire é a realidade, a vivência concreta do educando. É a partir dele, de suas experiências de mundo, que o educador terá subsídios para adotar a melhor estratégia para efetivar o processo de ensino-aprendizagem.

3.1 Técnica de como Ministrar uma Disciplina

No ensino de História, assim como outra disciplinar escolar, o uso de uma técnica desenvolvida por Freire, que por sinal é clara e singela, pode atrair um considerável sucesso.

Ela consiste em chegar à sala de aula e lançar duas ou três perguntas sobre o assunto abordado para os alunos. Daí surgirá a percepção de que a classe sabe muita informação. No lugar do professor discorrer exaustivamente sobre o tema, os alunos expõem as histórias de suas vidas que, juntas, montam o grande tabuleiro da História.

A disciplinar não pode ser transmitida de forma abstrata, como se o que é ensinado só seja observado nos livros. É preciso mostrar ao educando que aquele conhecimento esta presente no sue dia-a-dia; é preciso contextualizar o ensino.

A certeza da aplicabilidade do conhecimento no nosso cotidiano é essencial para abraçarmos nosso papel de cidadania. Foi através de um anúncio de iogurte (após análises laboratoriais, descobriu-se que o produto não correspondia à fórmula apresentada no rótulo), que os alunos desmitificaram a influência (acompanhada da conformidade passiva do homem) que a televisão exerce na vida das pessoas. Exemplo evidente da atitude cidadã e democrática, que discute as informações vinculadas diariamente.

3.2 Metodologia de Paulo Freire

Em seus primeiros passos na pratica de alfabetização, Freire origina um mecanismo como prefácio para atividades mais centradas na alfabetização, as “Fichas de Cultura”. Com estes elementos, Paulo tem EME vista conscientizar o educando analfabeto de que ele tem um conhecimento, que tinha capacidade e era construtor de cultura.

O aluno fazia cultura quando modificava a natureza, convertendo-a em alguma coisa que tenha utilidade. Partindo desse pensamento antropológico, Paulo “dar à luz” dez momentos retratados nesta fichas. As situações apresentadas levam os alunos a pensarem sobre as mesmas, e perceberem que eles são detentores de conhecimento, porque possuíam a capacidade de reproduzir aquela experiência (fazer um poço, por exemplo) na realidade. Se fazem, sabem o motivo desta prática e, fazendo, aprendem.

O ato de construir algo possui determinada ordem. Fazer uma casa tem uma razão diferente de fazer um vaso. Aquela objetiva ser abrigo e este embelezar o ambiente. O objeto também é feito de tal forma que fique o mais bonito possível. Uma noção de arte.

Caçar com arco e flecha é “pré-histórico”, se se comparar a mesma ação efetuada com uma espingarda. E é ainda divergente de um Gao caçar um rato. Isto mostra que o ser humano edifica uma história e, nela, há mudanças de hábitos, valores, experiências. Os animais estagnam em um mesmo estágio.

O ser humano inventa a escrita. Logo, é uma manifestação cultural. Mas qual o porquê de sua invenção? Por que ler e escrever? A leitura e a escrita possibilitam o surgimento de expressões culturais diferentes daquelas reveladas por quem não gozou do privilégio de intimizar-se com o ato de ler e escrever.

4 EDUCAÇÃO: LIBERTAR O HOMEM DA OPRESSÃO

A educação, para Paulo Freire, é vista como uma prática de liberdade, na qual o homem se torna conhecedor da “sua verdade” e passa a ter uma nova postura diante do mundo, do outro e de si mesmo.

4.1 A Incompletude do Ser Humano

O educar para Paulo Freire é um percurso de acabamento do ser humano, no qual ele se completa, preenche as lacunas existentes em si. A incompletude caracteriza todo ser vivente. Por outro lado, apenas o homem tem ciência dessa falta. E o fator de saber que é incompleto o leva à aprendizagem, para tomar posse do que lhe falta. Suscitar na mente humana conhecer a si mesma e ao mundo que o rodeia.

4.2 Um Pensamento Nascido da Vida

Tudo que Paulo Freire produzir de conhecimento, seu pensamento e ideologia, foi reflexo de sua vida. Foi concebido num universo pobre e indigno. O oprimido é, para ele, uma pessoa, que da vida faz parte.

Identifica-se no pensamento freiriano a ideia de fazermo-nos presentes no mundo. O convívio interpessoal em diversas situações, a nós circundantes. A educação é, a inda, um processo que necessita da presença do outro para acontecer. Ela não se concretiza através do isolamento do ser, mas da interação que este estabelece com o semelhante, tendo como alicerce o mundo.

O respeito pelo próximo é a chave de ignição do “fazer-se educar”. Respeitar no sentido de despertar no outro uma consciência de sua condição de massacrado, para que este tenha possibilidade de tomar uma atitude política de intervenção neste massacre.

4.3 Educação e Política

Paulo entende a educação como uma ação política, sendo que ela não permanece indiferente. Porém, ela não prima igualmente por todos numa sociedade de classes. Esta ação política comporta escolhas diárias, em aceitar ou não o que é imposto; formar e conformar.

O que se vê na educação brasileira é uma preparação do estudantes para o mercado de trabalho, cada vez mais competitivo e exigente, ou para o desafio do vestibular. Com isso, perde-se a chance de se proporcionar uma educação humana e cidadã, voltada para a democracia. Aliando educação e política, o homem tem condições de transformar o mundo, fazendo-o mais justo e bonito.

Educação e Política, na concepção freiriana, apontam sempre na direção de um ser pleno de cidadania, capaz de assumir para si o comando dos seus processos de existência liberta e progressista.

4.4 Educar é Conhecer

O conhecer também é uma forma de educar. Paulo Freire enumera cinco aspectos relevantes e indispensáveis para a compreensão do significado do conhecimento:

1. Toda pessoa sabe de algo; ninguém sabe nada. Há aqueles que desconhecem a existência de sua sabedoria, o que é diferente de não ter conhecimento;

2. O conhecimento surge do ato de fazer e de sua posterior reflexão sobre o mesmo;

3. O conhecimento é resultado de uma interação entre as pessoas, mas todo conhecimento é particular. O conhecimento não pode advir de um ato de "doação". É um processo que se realiza no contato do homem com o mundo e com os outros homens;

4. O ofício da aprendizagem requer esforço, pois é árduo;

5. O conhecimento tem caráter histórico. Os fatos passados servirão como sementes para que emirjam conhecimentos vindouros no futuro, aguardados pelo território preparado pelo presente.

Sempre há chance de alguém melhorar, uma vez que todos podem aprender. Ninguém sabe tudo. Pela conscientização, o homem se trona um ser autônomo, capaz de refletir sobre sua existência e ter posse de seu direcionamento.

4.5 A Pedagogia do Oprimido

Paulo trás à tona um debate acerca da significação da palavra “oprimido”. O oprimido é um grupo social que tem sua realização pessoal impedida. Um obstáculo a esse acontecimento são os fatores miséria e fome.

Para Paulo Freire, a sociedade está dividida em classes. Uns são privilegiados e estes favorecimentos acabam por impedir que a “maior fatia do bolo” não desfrute dos mesmos privilégios. Um desses bens, indispensáveis para a concretização da tendência humana de ser melhor, é a educação, que grande parte da população beira sua margem. Refere-se, então, a dois tipos de conceitos: oprimido e opressor. Não só a pessoa física, mas há varias formas de opressão: um sentimento, um preconceito, uma ideia, uma ambiente, etc.

Oprimido também é aquele ser alienado ideologicamente. Ele é levado a pensar de acordo com a vontade e influencia do opressor. Exemplo concreto é o livro didático, que muitas vezes apresenta ao estudante uma realidade completamente diferente da vivida por aquele. Há aí uma descontextualização do conteúdo.

O pensamento ideológico do oprimido encontra-se mergulhado no cosmos arquitetado pelo opressor; isto justifica a dualidade que envolve a consciência do oprimido: de um lado, essa ligação ao opressor, essa hospedagem da consciência do dominador (seus valores, sua ideologia, seus interesses, e o medo de ser livre) e, de outro, o desejo e a necessidade de libertar-se. Trava-se, então, uma luta interna no oprimido, que precisa deixar de ser individual para alçar-se coletiva.

O movimento para a liberdade deve surgir e partir dos próprios oprimidos, forjando uma atitude conscientizada, enquanto homens ou povos, na luta incessante de recuperação de sua humanidade. Percebe-se que não basta apenas o oprimido ter consciência crítico-reflexiva sobre o poder opressor; é imprescindível que se mobilize em favor da transformação desta realidade.

A dominação opressora é instaurada pela subordinação do oprimido (predomina o discurso e a prática, na qual, quem é o sujeito da educação é o educador, sendo os educandos, como taboas a serem enchidas; o educador deposita "informações" que estes, recebem, gravam e reproduzem, como um processo mecânico), numa relação vertical, onde o saber é fornecido de cima para baixo, e autoritária, pois manda quem sabe.

Assim, o educando em sua passividade, torna-se um objeto para receber a doação do saber do educador, sujeito único e detentor de todo o conhecimento. Neste universo harmonioso, não há contradições. O oprimido conserva-se ingênuo e desconhecedor da situação. Como conseqüência, o oprimido se acostuma e acomoda no mundo conhecido (o mundo da opressão).

Esta pedagogia revestiu-se de uma expressão universal, uma vez que a relação oprimido-opressor esta presente em todos os lugares, o que enriquece sua tese com as mais variadas experiências que ocorrem no mundo.

4.6 O Diálogo como Paradigma

O diálogo, em Paulo Freire, é o conceito-chave e prática essencial na concepção freireana. Ele entende o diálogo como uma postura humilde do educador em colocar-se na posição saber que não sabe tudo. O aluno tem muito a aprender, mas também a ensinar ao professor. Mais que um método, o dialogo é uma estratégia para respeitar o saber do aluno que chega à escola. Os alunos, quando chegam à escola, também têm o que dizer e não apenas o que escutar.

O ato de dialogar pressupõe a existência de duas falantes, em uma troca de informação. A própria etimologia da palavra já revela isso. Diálogo vem do grego — dia – através de; — logos – sentido, palavra. Ou seja, diálogo significa: “quando um significado perpassa, atravessa um grupo”. Com a conversação, o professor expõe um ponto de vista que lhe é próprio, e o aluno expressa sua aceitação ou não da prerrogativa, cabendo a ele desenvolver seu posicionamento critico do assunto. O educador deve permitir ao educando verbalizar seu pensamento, para que este pensar não fique retido e submisso à visão unilateral do primeiro e, mais tarde, torne-se imutável e alienado.

Paulo Freire concluiu que os alunos, quando chegam à escola, também têm o que dizer e não apenas o que escutar.

4.7 Dizer a Palavra e Transformar o Mundo

Compreender a educação de Paulo Freire é não esquecer do seu ponto fundamental e inerente a ela: o “Método de Alfabetização”. Esse vai além da simples alfabetização. Propõe e estimula a inserção do adulto iletrado no seu contexto social e político, na sua realidade, promovendo o despertar para a cidadania plena e transformação social. É a leitura da palavra, proporcionando a leitura do mundo.

Paulo Freire estimula a alfabetização/educação, cujo foco é o aluno, pautada na sua realidade e experiências de vida. A realidade é decodificada para a aquisição da palavra escrita e da compreensão do mundo, em beneficio do alcance de uma qualidade de vida satisfatória.

4.8 O Criador de Ideias: O Educador

A virtude que singulariza o educador é o compromisso. Ele tem responsabilidade perante seus alunos, pois dependem dele para atingirem uma aprendizagem eficaz. O educador ideal, à vista de Freire, seria um ser que, claramente, tomasse uma decisão em prol dos oprimidos e que esta realidade opressora fosse abolida. Educar é, sim, uma subversão a toda e qualquer atitude autoritária, que limite ou impeça a liberdade do outro de ser quem é.

Educador e educando se movimentam no mesmo cenário, mas as diferenças entre eles acontecem numa relação em que a liberdade do educando não é proibida de exercer-se.

Em um ultimo pensamento, o ser educador pode se resumir numa única frase: “amar incondicionalmente o próximo”. Sem amor, nada funciona.

5 CONCLUSÃO

Desde os seus primeiros passos na prática educacional, Paulo Freire optou por uma pedagogia política centrada na liberdade e na autonomia do ser, propondo a politização da educação. Ao avaliar que o processo do conhecimento acontece quando o indivíduo, ao se reconhecer humano, é estimulado a refletir sobre os seus problemas na vida cotidiana, o trabalho pedagógico político de Paulo Freire movimenta-se para o homem excluído das ações políticas, julgado pelos poderosos como incapaz de definir sua existência e marginalizado do meio social.

No Brasil e no mundo, Paulo Freire é referência da educação libertária e libertadora, seja na educação popular, o foco principal de sua prática pedagógica, seja na educação em geral. Conhecer Paulo Freire e sua ideologia é relevante para a transformação das disparidades sociais da humanidade. Seu saber, baseado em uma experiência de vida, é um riquíssimo suporte de contestação das desigualdades sócio-político-econômicas, sustentadas pela dominação dos poderosos, usurpadora da democracia cidadã.

Paulo Freire encanta, desperta o gosto pelo saber, promove e incentiva o debate em torno das principais questões relacionadas à educação.

Infelizmente, são pouquíssimos os agentes educativos (professores) que se espelham no exemplo freiriano na execução de sua prática escolar. Concluímos isso ao observar o âmbito educacional em que estamos inseridos. O convívio com nossos professores (na Universidade; curso de Letras) revela um tímido embasamento da atitude docente na teoria paulofreiriana. Porém, trazemos na bagagem as experiências das séries anteriores, desprovidas de abertura para diálogo professor-aluno e estimulação da criticidade.

Apreendemos deste grande teórico da educação um ensinamento que talvez sintetize toda sua exposição ideológica: “para haver verdadeiramente educação, deve prevalecer o amor. Sem amor ao que se faz, é difícil haver prosperidade. Render amor ao semelhante, ao mundo e a si mesmo. Nenhuma sociedade consegue desenvolver-se se nela não há manifestação sincera e consciente do amor.”

Saulo Sozza
Enviado por Saulo Sozza em 13/11/2009
Reeditado em 13/11/2009
Código do texto: T1921855
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