Nietzsche, confissões de um leitor

Amigo, nesse texto não encontrará nenhum relato acadêmico sobre Nietzsche. Se quiser saber sobre a vida desse grande filósofo, estou certo de que não te faltará material de pesquisas. No entanto, se quiser saber o verdadeiro impacto que os livros de Nietzsche podem causar em um iniciante em filosofia, creio que este texto lhe será interessante. Faço aqui, minhas mais íntimas confissões como pesquisador de Friedrich Wilhelm Nietzsche.

SOBRE NIETZSCHE

Rapidamente descobri que Nietzsche era um grande conhecedor dos verdadeiros desejos da humanidade, e foi assim um eficaz sedutor de ideais. Sabia desnudar conceitos e símbolos, reduzir as coisas a elas mesmas.

Creio que o mais fascinante no pensamento de Nietzsche seja seus imoralismos, sua a inversão de valores morais. A habilidade em tornar o certo em errado e tornar o deprecíavel em nobre, ainda nos limites da razão, é sem dúvidas um modo interessante de ver a vida!

Gosto de pensar na transvaloração de Nietzsche como a contemplação de uma chave enferrujada. Se perguntarem a qualquer pessoa o que ela é dirão "É uma chave, oras!", mas Nietzsche diria, é um pedaço de ferro enferrujado, e o valor dele é definido pelo tesouro que ela reserva.

DAS PRIMEIRAS LEITURAS

Comecei a ler os livros dele por acaso, quando um exemplar de "Para Além do Bem e do Mal" caiu em minhas mãos. Li aos poucos, e aos poucos meu interesse foi aumentando, conforme eu conseguia entender com mais facilidade o que todos aqueles sarcasmos e símbolos queriam dizer. Curioso como a linguagem desse filósofo é parecida com uma nova língua! A dificuldade que eu tinha quando não "falava na língua de Nietzsche" desapareceu com o tempo, e mesmo o Zaratustra não foi dificil de ser compreendido em sua totalidade.

Os aforismos de Nietzsche foram pra mim uma descoberta incrível. Uma forma precisa de lapidar o pensamento ao máximo, dizendo em poucas palavras tudo que é dito (e não dito) em um livro. Um livro todo de aforismos sobre o gênero humano, é pra mim, comparável a toda uma galeria de arte, e talvez seja ainda mais abrangente.

Após o primeiro livro, veio o segundo, o terceiro, o quarto, já não podia mais parar! Os outros escritores tinha perdido o sabor! Reduzidos a insignificância de seus pensamentos unilaterais, a sua falta de beleza na escrita, perdidos em sua superficialidade... claro que falo dos escritores do século XXI, salvo raras exceções.

O IMPACTO NA ALMA

Curiosamente, por causa da leitura de "Felicidade" (um livro de Eduardo Giannetti) cheguei na conclusão de que o homem não tem finalidade real, mas mesmo assim vive em uma incessante busca pela sensação de poder. Isso tudo meses antes de ler qualquer coisa sobre Nietzsche.

Após ler alguns livros e compreender que o pensamento de Nietzsche se assemelhava ao meu, comecei a ler com ainda mais voracidade! Muito do que ele dizia eu concordava, e muito do que eu dizia encontrei também pelas palavras de Nietzsche. Não posso deixar de dizer que meu orgulho foi pro céu, e passou dele!

Sorte a minha já ter sido ateu, antes de ler Nietzsche. Os argumentos dele contra o cristianismo são brutalmente concretos e precisos. Imagino que nenhum cristão é capaz de ler um dos últimos livros escritos por ele e permanecer na indiferença.

No entanto, o entusiasmo que Nietzsche transmitia em seus livros é perigosamente contagiante - é preciso uma boa dose de auto-conhecimento pra evitar que os valores de Nietzsche se tornem valores próprios, sem nenhuma análise.

Mais de uma vez me peguei concordando com Nietzsche sem nem saber porquê! Me ví adotando pra mim a sina decretada por Nietzsche em "Ecce Homo", querendo eu, Brunno, ser um destino... tem cabimento uma coisa dessas?!

VIDA PÓS-NIETZSCHE

Após Nietzsche, refinei meu olfato para as imundíces da humanidade, agucei meu paladar para a filosofia e para a arte, ouço com clareza exatamente aquilo que me dizem, vejo por trás das máscaras dos homens, pricipalmente daqueles que julgam não ter máscaras.

Decidi aceitar que não existe igualdade entre os homens e essa é a maior das justiças. Embora idéia da vontade de potência me seja mais antiga que meus conhecimentos sobre Nietzsche, hoje ela é plena. Talvez, com os anos eu possa me tornar tão bom sedutor de filosofias, quanto foi meu mestre. Estaria pagando mal a ele, permanecendo para sempre aluno.

Ser aprendiz de um dionisíaco tem lá suas vantagens... seu ego se encontra mil metros acima e além de qualquer homem, você se torna capaz de aceitar e rir daquilo que não pode ser mudado no ser humano, incluindo você. "Amor fati", talvez a maior lição de Nietzsche, não só pelos livros mas pela vida sofrida que ele levou.

AOS QUE NÃO LERAM NIETZSCHE

Saiba, é impossível ser indiferente ante o pensamento de Nietzsche. E mais difícil ainda dizer que o compreendeu completamente. Como disse Scarllet Marton - "Quem julgou compreendê-lo equivocou-se a seu respeito; quem não o compreendeu, julgou-o equivocado".

Saiba que ao abrir um livro de Nietzsche terão papel vagabundo e sem valor em suas mãos (principalmente se compraram seu livro em uma estação de metrô) e nesse papel terá algo muito mais valioso que ouro. Terá em mãos, verdades.

Saiba que em poucas palavras descrevi como pude, através de idéias labirínticas, conhecer céus e infernos, conhecer a mim mesmo, e nisso me tornar.

Conhece agora uma parcela mínima da alma de um leitor de Nietzsche.