A metáfora e o mito

O ponto de partida do modelo metafórico ou simbólico de
interpretação do mito é o seguinte:

"a metáfora é sempre uma transferência de sentido".

Ora, essa transferência de sentido que define a metáfora não é uma propriedade da estrutura da linguagem, mas situa-se no campo do discurso propriamente dito. Portanto, é o enunciado, enquanto ato discursivo, que, por assim dizer, carrega o sentido e a referência. Segundo esse modelo, o mito deve ser situado e compreendido no interior de uma semântica, que se refere às unidades de discurso, isto é, os enunciados, e não de uma semiótica, que se ocupa unicamente das unidades da língua.

Ponto fundamental: nós constatamos que a transferência de sentido é um procedimento normal da língua.

Porém, antes mesmo de encontrarmos metáforas na nossa língua, que são procedimentos retóricos, existe o que podemos chamar de “processo metafórico”.

Esse mecanismo implica dois tipos de combinação entre os signos:
 
1. ordem de sucessão dos signos na mesma cadeia verbal (caráter sintagmático), i.e.: conexão de signos na presença uns dos outros.
2. relações de semelhança constitutivas (associação) na qual eu me situo à medida que meu discurso avança (caráter paradigmático), i.e.: eu tenho, a cada instante, a possibilidade de escolher entre todas as palavras que poderiam entrar no mesmo lugar do discurso. Porém, ao escolher uma palavra para ocupar um determinado lugar no discurso, ela exclui todas as outras desse lugar, dando-se assim uma relação entre os termos não mais na presença uns dos outros, mas na ausência uns dos outros.

A primeira série de combinações de termos traduz o princípio das concatenações sintáticas da linguagem; a segunda traduz o princípio das concatenações semânticas.

No plano do discurso,
à primeira série de combinações corresponde o procedimento de metonímia, isto é, o procedimento retórico que consiste em designar uma coisa com o nome de outra, tomando o signo pela coisa significada.
A segunda série de combinações funda-se sobre a semelhança, e, no plano do discurso, corresponde ao que a retórica clássica chama de metáfora, isto é, a transferência do sentido direto das palavras para um sentido figurado, em virtude de uma comparação tácita.

Assim, as metáforas da nossa linguagem são expressões de um processo subjacente a todas as operações da linguagem, que é, justamente, chamado de processo metafórico. Nesse sentido, a metáfora não é algo de excepcional, mas liga-se a um procedimento fundamental da linguagem.