POESIA É A ÁRVORE DO MISTÉRIO

– a propósito de “SERÁ POESIA OU SERÁ POEMA?”, ensaio de Jorge Linhaça, publicado no Recanto das Letras: http://www.recantodasletras.com.br/ensaios/542505

Jorge, poetamigo! Fiquei muito feliz de que o nosso último encontro tenha suscitado esta peça de pensamento e expressão, conforme me confidenciaste ontem. Estou gratificado por ter sido o estimulador da reflexão.

Cumpro assim a missão a que me tenho proposto no exercício do ativismo literário: instaurar a antítese na cabeça dos confrades condenados ao pensar.

Este é o desafio, num país em que a média de leitura é de apenas 3,8 livros/ano/habitante. Porque "do nada nasce o nada", como queria São Tomás de Aquino.

Aquele que não procura saber o que pensa "o outro", que não lê os clássicos, que não sai de sua possessão pessoal, não chega ao poema.

Nunca materializará a Poesia, porque faz mero confessionário. E este só interessa ao seu autor. Pode até ser uma bonita peça, no entanto, é conversa deste com ele mesmo.

A poesia é dos domínios da humanidade. É bênção sugerida ao coletivo. Nunca é um ato sem a visão do irmão, do outro, o destinatário da proposta. Pervive na cabeça dos que a consomem. Foge da fala linear, do rotineiro de nossas reflexões.

A poesia é a árvore do mistério. O poema é o fruto dela.

É necessário entretecer a poesia, porque esta é dos domínios da intelecção e não do sentimento. Ela é tradução deste, mas não é apenas ele.

É matéria metaforizada, transfigurada, sugestionada, não linear enquanto pensamento e proposta.

Contém estranheza e alumbramento. E é fruto de dois momentos de criação: o da inspiração e o da transpiração. Este é o POEMA, um ser diferente do trivial “sentimento”.

O tema no ensaio acima referido está interessantemente versado. Por isso me acicata, me instiga a falar. É este o mistério do pensar. A dialética produz os seus efeitos. E o temário permite considerações.

O poema enquanto materialidade da Poesia é, como bem o dizes, "aquele ente abstrato que invade a alma do leitor..." e é matéria da vida transfigurada. Mas nem sempre o escriba consegue chegar à poesia.

Por isso há versos COM e SEM poesia. A regra é este último, para os iniciantes. A não ser que o seu autor seja “gênio”.

E esta figura ímpar a que designamos como gênios, porque diferentes e singulares, são muito raros na história da humanidade. Segundo os dados historiográficos nasce um a cada milênio.

Repito o que já disse noutro momento de minha criação sempre fruto de condenação ao pensar: feliz de um idioma que tem dois gênios num período de 500 anos.

Salve a genialidade de Luiz Vaz de Camões e a de Fernando Pessoa.

Mas o reconhecimento dessas figuras eméritas levou muito tempo.

Isto tudo nos dá algum alento. É preciso e necessário trabalhar a palavra, enriquecer o idioma, trazer luzes ao obscuro (temeroso) de um povo que lê muito pouco.

Porque também é necessário repetir, à esteira de São Tomás de Aquino: do nada nasce o nada!

– Do livro CONFESSIONÁRIO – Diálogos entre a Prosa e a Poesia, 2006 / 2007.

http://www.recantodasletras.com.br/ensaios/547026