O NADA E SUAS MULETAS
Com alegria, recebo o poema de um jovem poeta baiano, com pedido de análise. Vamos a ele:
“DESCOBERTA DA POESIA
Àlvaro Conde Muniz García
Fragilizado, vejo o sono
diante do papel e me nego as palavras
de efeito;
ainda que a Morte continue
a perceber este escritor de Nadas.
Dormir é a chave.
Publicado no Recanto das Letras em 09/06/2010.
Código do texto: T2309398.”.
Bom texto, porém com rarefeitas metáforas profundas – como é da natureza da boa Poesia. Trata-se de um conjunto pensamental válido, contingencial, em que o niilismo é a pedra-de-toque.
Não se trata de poema de circunstância, meramente. Há algo que semelha ao encontrável em Nietzsche, em Fernando Pessoa e, talvez, nas possíveis "flores do mal", de que nos fala Charles Baudelaire. Ainda, a descontração de Rimbaud...
Acho que falta uma crase em "às" (combinação da preposição "a" com o artigo "a"), que precede "palavras". Por causa do pronome oblíquo a transitividade do verbo sugere a "indireta".
Acaso fosse eu o autor desta peça poética, suprimiria o conetivo, a combinação e o pronome oblíquo, por exigência de nexo, rítmica e para impessoalizar o texto, universalizá-lo. Ficaria um verso limpo, enxuto, menos prosaico: "...diante do papel/ nego palavras de efeito;...".
Mais uma observação: o "Nadas" (iniciado por maiúscula) é pra negar o próprio "nada" ou é este com as muletas da personificação do EGO? Claro fica: no poema, a palavra de conteúdo vazio seria escrita em minúsculas...
– Do livro DICAS SOBRE POESIA, 2009/10.
http://www.recantodasletras.com.br/tutoriais/2465572