O JUÍZO DA POSTERIDADE
Grato por dividires comigo a tua opinião crítica, coisa muito difícil entre o pessoal do Orkut, que é um site de relacionamento. A regra é que nos topemos com alguns que são sempre deletérios e intrigantes, os quais necessitam de novidades para se manterem em alta, também os hackers contumazes e suas danosas estripulias.
Ainda não tenho opinião analítica sobre a obra do autor referido no teu 'recado'. Aliás, nem o conheço pessoalmente e sei lá se tem obra publicada no mundo impresso.
Limito-me a analisar, gratuitamente, peças autônomas de meus confrades do Recanto das Letras, bem entendido – os que a solicitam – visto que a chusma de autores que a net propicia é gigantesca. No geral, o que faço é como condenado à análise...
Tenho no Recanto (que é um site para escribas de todos os níveis estéticos), dentre outros textos, o registro de análises críticas. Ali estão os meus arquivos implacáveis, cacos de ‘inspiração’ e muitas horas de ‘transpiração’, amealhados nos últimos oito anos, se tanto.
Estou até com um livro em permanente elaboração: CRÍTICA NO RECANTO DAS LETRAS, iniciado há mais de cinco anos, época em que me cadastrei no site referido. E não tenho data prevista para a sua publicação. Vem se auto-elaborando num processo anímico similar ao da fagocitose, numa espécie de proteção contra os agentes patogênicos e malformados. Só aparecerá, na obra, o que for realmente importante para um leitor exigente.
Assim como o papel, a net a tudo (instantaneamente) aceita... Se bem que, no papel, há um razoável caminho a ser percorrido até a publicação, o que permite a ‘transpiração’ sobre o poema ‘inspirado’. Desde modo, por experiência própria, o autor tem oportunidade de corrigir muitas imperfeições. Ainda mais em Poesia, que é a lavratura mais difícil, a mais exigente, e, curiosamente, para os diletantes, apresenta-se como a mais fácil.
Atribuo a esta visão precipitada – a do primeiro momento de criação: a inspiração – à ilusão de que escrever poemas é desafio fácil. Este é o enfoque pelo qual a maioria dos brasileiros vê a Poesia...
Principalmente a confusão que se estabelece entre o poema lírico-amoroso (com Poesia) e o recadinho de amor, que nunca conseguirá ser expressão da eterna Poesia, porque é peça fruto da possessão entre o autor(a) e um único interlocutor(a): o amado(a). Consequentemente, o outro polo da criação literária – o leitor – é um relegado...
No recado amoroso não há a confraternidade, que aproveita a toda a humanidade. E isto é a regra naquela que denomino "poesia ginecológica". O universo feminino é pródigo. Nesta ótica, pouco se salva para a libação universal e para a posteridade. Porém nos resta desejar e aguardar fenômenos líricos como os de Florbela Espanca ou Cecília Meireles.
A androgenia também produz, amiúde, a “poesia fálica”. Há milhões de textos nesta vertente, na grande rede. Deseja-se que surjam outros Vinicius, com vertente amorosa de alta poesia. Afinal, gênio nasce apenas um a cada milênio, em cada idioma, segundo estatísticas aceitas por boa parte dos estudiosos...
Aceito e entendo que é necessário esperar o juízo da posteridade por cerca de sessenta anos para avaliar o poema, peça escritural que denuncia a Poesia em sua materialidade. Porém, se pode comparar uma peça poética frente à estética da contemporaneidade. Avalia-se comparativamente com o que usualmente está sendo produzido num recente momento da história literária, em Poesia.
Por ora, tenho imenso respeito pelo ativismo cultural e poético que o confrade em discussão desenvolve na internet. Muitos autores devem primorosos espaços de mídia a esta pessoa, inclusive eu. Parece-me que a ele apraz publicar os outros, pouco se importando com a sua produção poética pessoal, a qual ainda não me parece sedimentada...
Peço que voltemos a este assunto assim que eu tenha formado juízo estético sobre a obra do estimado confrade. Também peço escusas por não citar o seu nome.
Em estética, só a posteridade fixa registros.
– Do livro DICAS SOBRE POESIA, 2009/10.
http://www.recantodasletras.com.br/tutoriais/2130728