METÁFORAS E COMPARATIVOS

– Peço ao leitor, no sentido de melhor entender o que se discute, que reveja o nosso texto “A QUATRO MÃOS”, publicado em http://www.recantodasletras.com.br/tutoriais/1399950

“Moncks, amigo.

Não era minha intenção replicar as observações que expendeste a respeito do meu POEMA INCONCLUSO, mas, talvez, pudesse se tornar num diálogo instigante e produtivo, portanto, aí vai a réplica relativa à tua referência à conjunção como em "como uma pedra na cabeça".

Não podemos nos amparar apenas nos professores, fiquemos com os poetas. Quem faz a língua literária não são os gramáticos, mas os poetas, os escritores. A metáfora, mesmo sendo uma comparação elíptica ou símile comprimida, pode, por vezes, suportar uma conjunção com a função conetiva.

Eu a encontrei assim em inúmeros poemas, dos quais cito alguns apenas para reforçar o meu comentário:

No próprio Drummond, citado por ti:

"Como a noite se mudara

no mais cristalino dia"

Em João Cabral de Melo Neto encontramos quatro num só poema:

"O vento no canavial"

...como um mar sem navios

...como um mar sem lençol

...como um pulso de relógio

...como a das ondas da areia".

Manoel Bandeira que, também, citas:

No poema "Mulheres":

"... eu amo como as criancinhas"

"...Não como forma imperfeita".

Por último, o primeiro:

Fernando Pessoa, no "Guardador de rebanhos":

"Como uma flor tem perfume e cor"

"Como o mais simples dos homens"

Poderia continuar, mas seria tedioso.

Mas reitero tuas observações foram certeiras. Quanto a "transcendência" e ao "alumbramento", vai na próxima.

O abraço fraterno e que a poesia paire sobre nós.

- Gilberto Wallace, em 27/01/2009, pelo Orkut.”

Amigo querido! A minha restrição não é à função conetiva do "como", é uma questão estética no sentido de melhor conformar o poema com Poesia. Sim, porque há poemas com e sem Poesia. O que aponto – reticente – é a utilização, o uso, em poética, do “como” no sentido de “da mesma forma que”, como acentua o Aurelião. Se podemos, em Poesia, utilizar o recurso da "metáfora polivalente" (no dizer de Massaud Moisés é este espécime o que atua em Poesia, enquanto que no gênero Prosa a exigência é rarefeita, podendo ser monovalente), porque usarmos o rançoso comparativo tão comumente usado em prosa executiva, portanto, no linguajar usual? A linguagem poética não compactua com o prosaico: tem exigências rítmicas e estéticas muito mais específicas. É o que ocorre em Dom Pablo Neruda até a década de 50 do século passado, mais especificamente até a edição de ODAS ELEMENTARES. A partir deste título, em seu variegado legado em Poesia, o cacoete que enfeia e torna prosaico o verso passa a se minimizar, a ser pouco encontradiço, diferentemente do que ocorria em sua obra até aquela quadra temporal. Compreendes o viés? Para mim, em Poesia, o vocábulo “como" só em último recurso. Coisa de purista e de experimentador condenado ao pensar. Este é o espírito... Talvez com temor do exigente analista estético do futuro. Coisa de maluco descobrindo “pinta nova” na tigresa. Mas a fotografia do lindo animal vai ficar diferenciada “com e sem” a pinta no focinho. Este é o detalhe estético diferenciador e que torna o animalzinho absolutamente autêntico e originalíssimo. Tanto quanto, em si e por si, o inofensivo e inútil exemplar de poesia... Mas que, no entanto, pode mudar o homem, e, portanto – por seu conteúdo e ideias – mudar o mundo no dia a dia dos animais de duas patinhas...

– Do livro DICAS SOBRE POESIA, 2008/2013.

http://www.recantodasletras.com.br/tutoriais/1412582