ESPINHA DORSAL RÍTMICA DO POEMA

“Minha Busca

Sandra Almeida

essa loucura desvairada

que traga com sofreguidão

tantos encantamentos de

tantos e felizes momentos

devorando como bicho feroz

que em silêncio abate sua presa

e espreita-a com olhos de abutre

que anseia pelo seu ritual macabro.

espectadora de mim calo-me.

e angustiada me revisto

de couraça feita de aço

que o tempo não conseguiu

ultrapassar!”

Amadinha Sandra!

Conforme aparece acima, agradeço a remessa desta peça pelo Orkut. Parabéns pelo estro criativo. Continuas experimentadora de tua criação e é de pronto perceptível que o teu texto vem melhorando em muito...

Segue o estudo. Como sempre, pedindo vênia para apresentar uma antítese formal que possivelmente fará repensar e talvez te propicie a síntese definitiva (?) para o poema.

No mínimo, com o desafio, a fuga do mero diletantismo e a caminhada para o profissionalismo. Aprendizagem pra nós dois...

Fiz um exercício em cima da proposta original, que estava com o andamento rítmico muito lento, arrastado, devido à utilização de muitos polissilábicos, principalmente os que cumprem a função de adjetivação, e que aparecem colocados depois do substantivo.

É de lembrar que se deve preferir a anteposição do adjetivo, principalmente se o vocábulo (este ou o próprio substantivo) possui três sílabas gramaticais ou mais, sendo naturalmente mais lento na pronunciação.

O uso do pronome relativo ‘que’ também serviu pra dar uma sensação de que o poema não decolou, arrastou-se, sob a ótica da ritmação. Chamo a isto o “efeito quequê”, o qual sempre é prejudicial ao poema, forma que é a materialização contemporânea no gênero Poesia.

Também na poesia clássica, rimada e silabada metricamente, os ‘quês’ são imensamente prejudiciais porque tornam prosaico o verso. E Poesia é fundamentalmente ritmo.

Na tua peça havia exagerada personalização, devido ao uso dos pronomes pessoais oblíquos e dos possessivos, os quais são cochichos indicativos de que o poema ainda não se desgrudou do cordão umbilical de seu criador.

Na verdade, a tentativa de encontrar a Poesia, no poema sob exame, esbarra no intimismo, no subjetivo inconfesso em relação ao objeto do amar (o amado), o qual permanece subjacente, inidentificável até o final do poema.

Mas está visto que o teu alter ego briga com o que lhe é hostil no exercício do verbo amar. E é de ressaltar que o poema termina com uma interjeição, caracterizando a imprecação (não explícita) de toque mais uma vez subjetivo.

Desta sorte, o poema era uma conversa intimista e nada mais...

Tentei a síntese neste estudo crítico, evitando o derramamento verbal, objetivando que o leitor venha a se identificar com o conteúdo e se aposse dele, cumprindo assim a função da proposta poética.

O uso dos gerúndios deixa o poema redondo ritmicamente. Procura ler os teus escritos mais de vinte vezes, em voz alta, e terás uma notícia da espinha dorsal rítmica do poema.

Tudo pra ver se ele está correto como poema. Se existe ou não, e se há possibilidade de fazer com que o andamento musical dos versos cause o efeito que se deseja: estranheza e alumbramento aos olhos e ouvidos do leitor.

O poema, no canto lírico amoroso é o canto dos possessos, dos que só sabem silabar ao vento os amores, em todos os tempos. De sobejo, traduzir-se como expressão de Beleza...

E se a alma é sempre alada, porque imaterial, o poema é o pedido de socorro em seu rostinho inocente de flor primaveril.

Aqui vai a proposta contida, o suspiro de teu irmão também feliz graças ao teu abraço verbal...

E o mundo se tornou mais suportável...

BUSCA

Sandra Almeida

Esta desvairada loucura

trafegando com sofreguidão

encantamentos de tantos

felizes momentos

devorando sua presa

em silêncio

à espreita

abutre ansiando

no ritual macabro.

Espectadora,

engulo a angústia,

couraça revestida de aço.

O que o tempo

não conseguiu ultrapassar!

– Do livro CONFESSIONÁRIO – Diálogos entre a Prosa e a Poesia, 2006 / 2008.

http://www.recantodasletras.com.br/ensaios/1182639