INTRANSITIVO
Nas margens do Rio Tietê, eu sentei e tapei o nariz: o fedor estava de danar! Fechei o vidro do carro e olhei para a minha amiga Valéria que deu a partida e seguimos, ou melhor, tentamos seguir pelo trânsito paulistano.
Quanta gente, quanta agonia. Valéria e eu olhavámos os milhares de carros e tentavámos jogar conversa fora, na vã ilusão de ver o tempo passar e o espaço entre onde estavámos e onde queríamos chegar diminuir, mas nada: estavámos nos movimentando a 2 kms por hora, e não havia acidente, obras na estrada, na rodovia, nada além de mais carros nas ruas que São Paulo poderia suportar.
- Se ao menos, uma boa parte desse pessoal fizesse o que estamos fazendo - disse Valéria, mas leitores tirem o sorriso maroto dos lábios, minha nobre amiga referia-se apenas ao ato de dar carona a um amigo e diminuir, ao menos, mais um veicúlo que poderia estar tentando nos atravessar.
Quanta coisa experimentamos quando estamos preso no trânsito. Descobrimos os mil tons da palavra não, sendo dirigidas para as centenas de ambulantes, trapezistas, malabaristas que se multiplicam mais que os carros na pista. Testei todos os exercicios de respiração mata-stress e só fiquei mais estressado. Descobri que os motoboys são mais assustadores que o fantasma da inflação e que nem Buda teria tanta paciência para aguentar calado, a tartaruga ganhando a corrida. Tentei até fechar os olhos e vizualizar que eu estava em casa, numa cama quentinha, mas o som das buzinas tratou de me colocar no meu devido lugar.
O lado bom é que eu tinha alguém para conversar e Valéria logo, voltou a contar os seus "micos amorosos" e não há nada melhor do que enfrentar uma situação sem solução, do que com boas risadas. Rir pode ser uma verbo intransitivo, mas é sempre bom, com ou sem complemento e quando estamos presos no trânsito é a melhor maneira de voltar para casa.
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