Um diabinho de asas
Edson Gonçalves Ferreira
Quando eu era menino, aproveitava a carpintaria do meu pai para fazer espadas de madeira. Com elas, eu formava os meus cavalheiros da Távola Redonda da Avenida 21 de Abril onde nasci e morei até pouco tempo, enquanto minha mãe foi viva. Fazia as espadas e distribuia entre os meninos. Inspirávamos nos filmes de aventura do Zorro, do Batman, do Fantasma e nas aventuras lidas em livros como
"O Conde de Montecristo" ou "Dom Quixote de La Mancha", entre outros.
À noite, quando a lua surgia, brincávamos com a gang da Rua Paraíba que, de mentirinha, era nossa inimiga. Eu que, sempre, fui magrinho e espevitado e ligeirinho como aquele ratinho latino dos desenhos animados, subia nos muros e entrava, escondido no território inimigo. Andava sobre os muros com mais maestria que equilibrista. Nunca cai! Era um diabinho de asas.
Era uma delícia!... Havia um bequinho encantador, no fundo da minha casa, chamado Bequinho Santo Antônio e, ali, carro não entrava e, portanto, era o local das guerras entre as duas gangs. Ali, aconteciam os combates de capa e espada. Só que ninguém se machucava. O máximo que acontecia era quebrar a espada do adversário e, então, ele está fora de combate.
Eu reinava absoluto, porque as espadas de madeira boa feitas em minha casa eram cobiçadas. Papai me dava as ripas para eu confeccionar as espadas. Depois, quando terminávamos o combate,
reuníamos e fazíamos uma fogueira para assar -- ai, gente, que vontade de experimentar novamente! -- batata doce e, às vezes, uma lingüiça enquanto escutávamos histórias de assombração e de extra-terrestres.
As brincadeiras eram saids, tão sadias que nossos pais aprovavam, mas antes das 8h30min, tínhamos que voltar para casa. Para nós, crianças, essa hora já era tarde demais. De madrugada. Tomávamos banho, víamos algum desenho animado na televisão até quando nossos pais deixavam e, depois, tomávamos leite com Toddy e cama, doce cama e doces sonhos acalentados por aquela ingenuidade encantadora que só as crianças têm. Era bom ser criança naquele stempos. Oh, como era! Quantas saudades, quantas!
Divinópolis, 17.05.08