A ENTREVISTA

Cheguei cedo, meia hora antes para mostrar que sou pontual. Afinal, a primeira impressão é a que fica. E não é que já tinha um fulano e uma fulana sentados aguardando.

Sentei-me e peguei uma revista para ler, para mostrar que não estava nervosa nem ansiosa, apesar de saber que a recepcionista não tem nada a ver com a entrevista, nunca se sabe. Já fiquei pensando se eles não ficam nos observando pelas câmeras, monitorando nossos movimentos e o que a gente faz enquanto espera. Como já disse nunca se sabe.

A entrevista para o emprego estava prevista para começar as 10: 00, quando faltavam 15 minutos, minhas pernas começaram a tremer, não que eu tenha medo de entrevistas, mas o emprego era bom, o salário e a carga horária também, portanto cada vez que chegava um candidato era uma chance a menos.

As 9:55 as sala já estava lotada, não sei porque chamar tanta gente, afinal é apenas uma vaga. Contei 20 pessoas, entre homens e mulheres, e fiz o levantamento dos principias concorrentes, aqueles que só de olhar já se sabe que são um perigo. São quatro, dois homens e duas mulheres. Os dois homens, mesmo rivais, conversavam discretamente, parecia que tinham mandado fazer um terno sob medida para a ocasião, se não estivessem ali, eu jamais pensaria que seriam tão desempregados quanto eu. As duas mulheres, minhas rivais por natureza, nem se olhavam, também estavam vestidas como se fossem a uma reunião com o próprio presidente as empresa, lamentei por meu pretinho simples.

Uma parecia achar que já tinha passado na entrevista, pois tinha o nariz tão arrebitado, que só faltava alcançar o teto. A outra por outro lado, lia uma revista tão atentamente que não dava pela presença de ninguém (detalhe ela lia algo sobre ciência e eu lia sobre o capitulo da novela de amanha). Eu já imaginava como aquelas pessoas iam falar, o que iam falar e como se comportar. Cansei de ver isso acontecer. E eu tremia mais, achei melhor tomar uma água.

10:00, começou o teste de resistência, era sempre assim, nunca começavam na hora, acho que se divertem em ver-nos aqui esperando, agoniados, a espera do abate.

10h30, a entrevistadora chegou e mandou-nos entrar numa salinha. E assim nos acomodamos em desconfortáveis cadeirinhas. Ela fez as apresentações e disse que a seleção seria feita em três fases, uma prova, a entrevista e a dinâmica, sendo a primeira a prova. Acho que eu já nem podia ficar em pé. Essas coisas fazem mal para o coração, se pelo menos tivesse poucos candidatos.

A prova foi fácil como sempre, mas já eram cinco candidatos a menos. Logo em seguida começou a entrevista e como eu previa, quando o primeiro homem abriu a boca, pensei em levantar a bandeira branca e sair correndo.

O tal tinha tanta coisa a dizer, que foi meia hora para acabar, só o currículo eram quase três folhas. O meu mal ocupava uma, sabia que devia ter aumentado a fonte, mas agora era tarde.

O outro foi da mesma forma que o primeiro. Só faltavam ter estudado na mesma faculdade.

Mas o que me assustou realmente, foram as duas mulheres, nunca pensei que alguém pudesse fazer tantos cursos, uma delas falava quatro línguas e já tinha estado no exterior. Naquele momento não só eu me sentia derrotada, muitos já se preparavam para ir embora, e com certeza se perguntavam o que aquela gente fazia ali, disputando uma vaga com pobres desempregados desesperados. Com tudo aquilo, podiam procurar empregos melhores do que aquele, mas pensado bem acho que não estariam ali, se não tivessem procurado. È uma pena, pois agora são obrigados a disputar conosco, e devem ter certeza que levam vantagem.

Mas, como esperança e a última que morre, mesmo eu sabendo que um deles ia ficar com a vaga, havia um por cento de mim, que não perdia a fé, mesmo porque a cara da entrevistadora não demonstrou nenhuma reação diante dos quatro. Acho que para fazer a gente se sentir melhor.

Quando acabou a entrevista, veio o pior momento, aquele em que nossas cabeças rolam, destruindo mais uma esperança, pode parecer meio dramático, mas acho que todos aqui se sentem assim, só não roem as unhas porque pode pegar mal.

Quase uma hora depois, (devem pensar que não temos nada para fazer, só porque estamos desempregados) a entrevistadora voltou, com as fichas dos eliminados em mãos e ainda por cima exibindo aquele sorriso “não foi dessa vez, quem sabe na próxima”.

Bem, à hora em que ela disse os nomes foi horrível, quase tive um enfarte, mas no final acabei sendo aprovada para a próxima fase, lógico que os quatro também foram, e para me dar apoio mais duas pessoas comuns.

A dinâmica foi rápida, a mesma coisa que acontece sempre, defenda seu ponto de vista sobre algum assunto proposto por eles, o melhor argumento ganha. Ou quase isso, às vezes a melhor aparência ganha, ou o melhor Q.I., afinal você nunca sabe no que esta se metendo, se é real ou apenas fachada, mesmo porque não podem dizer que o candidato já esta escolhido desde a primeira fase, então fazem tudo e no final só informam quem tem o perfil que eles procuram, mas ai já não é novidade para ninguém, ou então dizem aquilo que todos odeiam “te ligo depois” a frase não é dita bem assim, a variedade muda conforme a ocasião, mas no final é tudo a mesma coisa.

E não é que ela não disse a famosa frase, bem pelo menos não fui obrigada a ouvir que um dos outros era o que tinha o perfil da empresa, na minha opniao ela não conseguiu se decidir entre os quatro.

Mesmo com esse “não” dito indiretamente não desanimei, como já disse, vejo isso sempre, quem sabe da próxima vez ou na semana que vem com outra entrevista.