Recordações

O porvir tarda como uma nuvem que navega devagar, o sol demora a ser pôr, os seus pensamentos flutuam e dissipam de forma tão singular quanto àquela tarde de domingo, ele pensa que talvez nem toda a sua vida fora tão lenta quanto aquele tedioso dia. Severino era viúvo. Tinha seus quarenta e seis anos, novo, bem conservado e ainda um tanto inteligente, matava a charadas antes das tentativas alheias. O seu único filho -Cláudio Augusto- já era casado e não tinha filhos, sua mulher era estéril. Severino lembrava da sua juventude, tantas festas!quantas mulheres!,o quanto era despreocupado e feliz, e o como aquelas lembranças excluíam os momentos banais e ruins da mente, sorriu levemente como um auto-consolo, ao menos teria saboreado alguns eufóricos momentos de alegria. Olhava agora pela sua janela a rua fúnebre, solitária e seus bons pensamentos se dissiparam como uma rajada de vento repentina, aquela mesma rua onde morava desde que se casara, continuava ali, jovem, vendo tantos casais ou crianças jogando futebol, pensou que talvez tivesse velho demais para recordar sua infância já tão remota, apenas queria lembrar-se que fora boa, relativamente boa. Preferia crer que fora boa. E viu sua mulher sorrindo no cartório, um casamento simples, só ambos e o padre, era uma bela mulher, carnuda, dentes grandes, alvos e extremamente retos, era ciumenta e dona de uma personalidade ímpar, de forma que exalava respeito apenas com sua meiguice, lembrou dos seus defeitos, mas preferia ficar apenas com boas recordações, afinal ela já estava morta. Gabriela se fora tão rápido que não dava nem para acreditar, um ataque cardíaco, simplesmente sumiu, evaporou. Severino voltou para casa, esqueceu suas velhas recordações, ligou a TV e mergulhou novamente em sua solidão.

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Shauara David
Enviado por Shauara David em 16/05/2008
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