Manhã de praia
Como os refrigerantes frisantes sentiram-se unidas. Duas escritoras no mesmo hotel e agora integradas na terra-de-ninguém do veraneio. Presente do sol e do mar. Tudo parecia ótimo e diferente. Riram-se livres e demoradas sem despertador diante do mar imenso. Mal se conheciam e estavam amicíssimas. Vivas diante do tesouro da felicidade momentânea. Espontâneas chegaram a confidências das paixões rotas. O lance de amores vividos em segredo, cada qual em melodrama. Reprisaram dramáticas ternuras. A relembrança desfazia aquilo que antes era uma espécie de luz galante e agora se dissolvia na areia fina. Perdiam-se no grasnado das gaivotas entre guarda-sóis e pandorgas coloridas. Foram se sentindo curadas. Na beira-mar as histórias eram desfeitas nos cabelos mal dominados pelo vento. Retornava-lhes o reconforto de um perfume secreto. Suave e bom do passado reconquistado.
A primeira havia amado um músico, daí a frase marcante: Músico é aquele que procura o todo no conjunto, confessou divertida. A outra perdida pelo marinheiro do navio sem nome que nunca mais havia ancorado. Sem porto recebia cartões postais dos lugares por onde ele passava a mais de trinta anos. Lembraram também do tempo em que passearam na orla com seus primeiros namorados diante dos pais incrédulos. Feliz disse tocando suavemente em seu braço: Prefiro literatura. Gosto mesmo é de literatura. Escute: O mau humor literário pode ser do tipo intestino preguiçoso com dose de humor psicodramático. Caíram na risada. Besuntadas pelo protetor solar.