Roteiro inconsútil

“Twilight sleep”

Em cinco segundos começará a reunião dos aplaudidores. Durante os aplausos descerá do cavalo branco alado e ficará suspenso sob as águas na cena improvisada. Procurou no depósito imaginário alguma compensação. Faltava-lhe o ponto lógico. Procurou o diretor. O espanto dele foi imenso. Que recurso utilizaria na cena cinco? Permaneceu executivo e calado por alguns segundos para descer de um cavalo branco alado e ficar suspenso sob as águas. Sem demorar na duvida estalou. A frase será a imagem extraída do texto. Ao passo que basta prosseguir o filme no parque até a árvore e ela mesma será capaz de produzir um possível estado de hipnotismo. Se o outro concordar em ser hipnotizado, finalizou com um sorriso amarelo, passando por cima do roteirista. Roteirista calado como se cuidasse ficar nas fontes da imaginação peculiar para descer de um cavalo branco alado e assim permanecer também suspenso sob as águas claras. Oportuna cena criativa ativando as faculdades intelectuais completou.

As primeiras imagens coligidas no escritório começariam destacando a posição da secretária eletrônica: Voz do diretor (lendo): Altruísmo é a escada que a gente inventa! Pausa. Faz um gesto largo querendo dizer algo mais. Na sala de reunião todos deveriam levantar os óculos e as mãos repetindo: “lindo é tão lindo!” em coro, caminhando ao infinito. Marlene interrompe cortando a inspiração grupal.

- Dessa associação pigarreiam inspirações malucas apagando as melhores percepções, justificando o conteúdo vazio.

Diretor: está escrito no cartão. Tornava-se necessário consultar o roteirista para qualquer modificação. (Roteirista reencontrado duas horas mais tarde no Café Chic).

No estúdio mantiveram-se paralisados diante da interrupção da construção imaginária. Marlene sempre tem razão, sempre é certeza. De repente ouvem a impetuosa buzina na imagem subseqüente. Mas afinal o que faz uma buzina na cena romântica de Marlene? Voltaram à hipnose que decerto tiraria alguém do ponto central. Seria a sua vez de improvisar. Estava fora do texto, portanto acrescentaria: Detenha esta pedra lançada na janela onde antes só havia sonho crepuscular. Maldito!

Os jograis das luzes no estúdio acabariam por driblar o cansaço do estágio sugestivo da cena. A opereta surgiria em seguida vibrante: O fantasma tremendo vociferante sobre o ladrão impedindo-o de consumar o ilícito. Como se alimentasse o necessário desejo de querer sem possuir. Voltaria a amar com os olhos e não com as mãos. Observaria o quadro da janela quebrada onde antes havia o sonho crepuscular. Surgiria a escada para quando houvesse um abismo corrigido. Para descer de um cavalo branco alado e ficar suspenso sob as águas. Limpo e regenerado.