A rã de roupão

Na simpatia magnética da árvore magnetizada o pardal em sonambulismo de vôo descansa. Aguarda. Observa a porta aberta natural do azul. Momento de segundos voa, porém um pouco abalado pela buzina de carro grande, desviando das pequenas bicicletas feitas de raios coloridos. Retorna o pássaro para o alto além do imã das plantas. O vento promove um invisível espetáculo na condição de brisa amiga. Transparência de sentido externo.

Procuro um táxi com motorista memorável que me conduzirá ao espetáculo das ruas. O ônibus passa primeiro. O desdobramento de personalidade resulta em dúvida momentânea. Dentro do veículo podemos notar as árvores aparadas e o bulício da viagem. No banco da frente alguém brinca com sons de boca: tã, tã, gong. O motorista com fixidez das pálpebras grita: pula rã! A rã e eu esquecemos que estamos no carnaval. Os pedaços do carnaval restam nas coisas longe de mim e quero passar apenas por elas. Sei que toda cor sensível provoca o calor dos brinquedos e alegorias. Faço planos de brinquedo como surgir de roupão no chope habitual.

Aparece o táxi com foco luminoso intenso no começo da rua. Já é noite. Os sons começam a modificar o corpo da cidade. Começa a se alterar de sombra para um sorriso verde e logo verte felicidade. (Para onde vai à passarada da cidade quando começa o batuque?) Vinte minutos e o carro dobra a esquina, sobe viaduto, corre pela avenida. Vem a chuva. A água lavará o suor irresistível, mas ninguém desanima. No sexto grau da euforia desceria do carro para vestir a fantasia: cueca, roupão e chinelo de dedo. A gravata amarrada na cabeça. Um espelho ri-se do ridículo ambulante, sobretudo contente, ligeiramente influenciado pelo calendário. Correria atrás da corrente ou emborcaria uísque ouvindo marcha de carnaval vinda de som eletrônico? A chuva havia cessado. O vento descansava na copa magnética da árvore isolada. O bloco passaria no passe das dez num relance. Bastaria entrar nele para sacudir os ossos até o sol raiar.

O chato é se vestir de exótico sem que ninguém perceba porque alguém está vestido de cachorro-quente chupando guaraná. Há os que de tão mal vestidos, sumariamente, reclamam embriagados do preço da indumentária. O carnaval é um vestir-se ou não vestir-se além do ritmo frenético. Ninguém estranha esse exagero febricitante em nome da tranqüilidade. No tempo e no espaço há acerto para a loucura em paz. Respira-se um remédio para os males. O sonho se mobiliza nas canções e o coração bate evasivo. Como quer que seja amanhã brilhará o dia de praia. O mar lavará irresistivelmente as notas finais. Amantes se beijarão eternizados no adeus sequer dramatizado em ondas de sal e promessas. Mas a única forma pela qual, presentemente o dia recolhe o novo evento, pratica a vontade de despertar cantando. Nunca cessa a objetiva permissão da fantasia. Rã que salta para o ônibus de volta até alcançar novamente a casinha pequenina.