Descarte Seletivo - Berenice Heringer

"Livre-se da ilusão e caminhe por uma estrada diferente e mais realista."

(Epícteto, filósofo estóico grego, nascido em Hierápolis, na Frígia, no ano 55 d.C)

Rene Descartes disse: duvido, logo penso. Se estivesse repleto de certezas não teria pensado tanto, nem elaborado o seu Discurso sobre o Método. Temos de nos concentrar nas dúvidas e nas perguntas. O rabino Nilton Bonder, que aprecio muitíssimo, cita um provérbio iídiche no livro A Cabala da Inveja: "Se você viver o tempo suficiente viverá para ver de tudo."

Li pilhas e pilhas de Seleções quando era adolescente (que é o tempo dos dez aos 25. Daí pra frente somos todos xófens!)Um artigo me chamou a atenção. A Mente Melhora com a Idade. Depois li, em Stanislav Grof: A mente está além do cérebro. Como, então, e onde, ancorar o pensamento? A gente vence o desafio de pensar, pensando. Assim como a fobia de escadas-rolantes é vencida subindo nelas em movimento e constatando que, no finalzinho, não há uma fenda que nos vai engolfar. O incrível Stanislav Grof fala sobre a psicologia transpessoal, morte e renascimento, e das matrizes perinatais básicas. Todos os conflitos, neuroses e fobias podem estar relacionados ao nosso nascimento biológico. Não vou ficar dando pistas aqui. É muito profundo e abrangente e tem-se de mergulhar. Boiar só nos deixa boiando...Poderia colocar o título supra no plural. No entanto, fiz questão de Descarte, sem esse, como é a pronúncia do sobrenome deste famoso filósofo francês. Também o esse, entre o e e o cê, não se pronuncia. Agradeçam-me pela aula.

Agora, nesse mundão globalizado que fabrica lixo aceleradamente, fala-se em coleta seletiva. Ah! Mas não vou enveredar aqui, nestas maldigitadas linhas, por esse aterro sanitário. Quero falar de filosofia. No supermercado, quando insisto com o empacotador que não quero as sacolas plásticas por ter levado de casa meus embornais e picuás de pano, tenho de criar caso e brigar. Eles não sabem o que fazem.

Selecionar idéias é jogar fora o que não serve, os papos-barbante, o senso comum, os fingimentos sociais, as aparências que enganam, a conversa mole pra boi dormir, os eufemismos. Ontem, numa palestra, falei em incesto e do palavrão que cabe no contexto. A moça que me convidou ficou em pânico, (oi, Lisa, aquele abraço!) achando que uma participante de 73 aninhos poderia ficar chocada com meu jeito direto. Não somos galinhas e existem chocadeiras eficientes, até na Granja do Torto. Quando você pensa que está pensando no outro, só está pensando em si. A escala musical todinha no seu pentagrama só entoa o seu ritmo. Dó, ré, mi, fá, sol, lá, si. Se você tem dó, fica culpado, sente-se ré, faz uma pausa em mi(m) e lá si vai o sol da solidariedade aparente. Vejamos mais Epícteto, o imbatível: Se permitir que as opiniões medíocres dos outros o façam vacilar, você estará sujeito a uma dupla vergonha. Ah! Vou confessar aqui, agora: sou estóica! Será que o mestre pode olhar para mim e me endereçar setas de ponderação e descobertas? Estou com o alvo desenhado no meu peito aberto..."Um metalúrgico não faz sapatos e um sapateiro não faz armas. Já é suficiente quando alguém faz bem aquilo que deve fazer."

Ser consciente e responsável tem seu preço. Você não fica popular e nem aparece no TV Fama. Einstein se trancava por vários dias em seu gabinete para pensar, elaborar, descobrir e envolver-se nas ondas hertzianas do Universo. E tocava violino para a cunhada que estava em coma, tendo certeza de que ela ouvia.

Não obstante as plenitudes siderais, o lixão social hoje está muito misturado. E repletíssimo!

Vila Velha, 03 de maio de 2008.

Berenice Heringer
Enviado por Berenice Heringer em 07/05/2008
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