A próxima Feira do Livro
A PRÓXIMA FEIRA DO LIVRO
(crônica publicada no jornal "Diário Catarinense" de 07.05.2008)
Uma feira do livro pode ser organizada de algumas maneiras diferentes. Uma delas ocorre quando se dá destaque e ênfase ao aspecto cultural do evento, com palestras, debates, mostras e iniciativas que ressaltem o livro como agente e, ao mesmo tempo, difusor da cultura. Grandes nomes do teatro, do cinema, da literatura, da filosofia, da história - do pensamento, enfim - serão chamados a dizer o que pensam e como se relacionam com o livro, convidados a testemunhar o que o livro significa para eles e para o desenvolvimento nacional.
Outra possibilidade é organizar a feira como um acontecimento público tendo o livro como astro maior, promovido em prosa e verso, em som e imagem, em cores e preto & branco, no varejo e no atacado, até quase a exaustão absoluta. Escritores darão então seus depoimentos, falarão dos seus livros e, em especial, dos livros que mais profundamente terão marcado suas vidas, suas trajetórias humanísticas, suas visões de mundo e suas próprias obras.
Como opção, a feira do livro pode ater-se ao aspecto editorial da questão, isto é, pensar o livro como o produto de uma série de decisões técnicas, econômicas - e literárias - que o fazem, por fim, surgir fulgurante e atraente à nossa vista e às nossas mãos para o prazer da nossa leitura. Neste caso, a feira trará editores das maiores casas editoriais do país para falar de critérios de seleção de originais, de canais de publicação e distribuição, de desafios, de exigências, de preferências dos leitores, de políticas públicas e privadas direcionadas ao livro.
Mas uma feira do livro pode restringir-se ao mero aspecto comercial dos mercadores de livros, da simples venda de volumes de quaisquer valores culturais, editoriais e literários, vendendo por vender qualquer coisa que apareça, incluindo-se aí desde bonsais, bordados, retratos, quadros, canetas e brinquedos até fantoches e, mesmo, livros. Neste caso, não haverá necessidade de debates, palestras, entrevistas, neste caso prescinde-se do fervilhamento cultural que, feito epidemia, tomaria uma cidade e uma comunidade, refletindo-se nos jornais, rádios e televisões, nas esquinas e nos bares, nas livrarias e nas escolas, nos leitores experimentados e nos estudantes de todos os graus, estes leitores potenciais que somente se realizarão como tais se lhes for apresentado o livro como uma forte opção de lazer e de prazer.
Há, sem dúvida, outras maneiras de realizar uma feira do livro: de forma amadora, quando se faz bem menos do que se tem condições de fazer, ou de forma profissional, situação em que o resultado supera as limitações individuais da equipe encarregada de montá-la.
Numa Feira do Livro de verdade, o governador do Estado e o prefeito municipal se sentirão muito mal, politicamente falando, se não aparecerem, ao menos, na abertura do evento.
Numa Feira do Livro de verdade, o Patrono sente-se tremendamente honrado pela escolha, pois tal ato singelo é o reconhecimento público das suas íntimas ligações com o livro.
No caso da abertura oficial da 7a. Feira de Rua do Livro de Florianópolis, arbitrariamente chamada também de 1a. Feira Catarinense do Livro, o governador mandou representá-lo a presidente da Fundação Catarinense de Cultura (que já compareceria por sua própria função), o prefeito designou um funcionário da fundação municipal de cultura (a qual se omitiu de lá ter um estande) e o Sr. Eurides Mescoloto (que não costuma se deixar surpreender em público com um livro nas mãos), presidente do Banco do Estado e Patrono da(s) Feira(s), sequer compareceu - nem houve quem se manifestasse como seu representante.
A próxima Feira do Livro, com certeza, há de ser mais séria.
(Amilcar Neves é escritor e autor, entre outros, do livro "O Tempo de Eduardo Dias – Tragédia em 4 tempos", teatro)