Vícios de linguagem – Interessante!
Outro dia li um trecho, do professor Sérgio Nogueira Duarte, bravo colunista do Jornal do Brasil, que escreveu sobre os pronomes pessoais oblíquos. Para exemplificá-los, recorreu às declarações de amor: O verbo amar é transitivo direto. Isso significa que ele quer um objeto direto, logo não podemos usar o pronome lhe. Em suma, segundo o professor, para manifestar amor, pode-se usar: Eu o amo ou Eu a amo ou Eu amo você ou ainda Eu te amo, mas, só se for na segunda pessoa.
Permito-me discordar. Se eu disser a uma dama "Eu a amo", há pelo menos duas hipóteses de equívoco: 1) ela terá a impressão que me refiro a uma terceira senhora, e ficará muito aborrecida comigo; 2) ela me tomará por pedante ou bichona desafeita à linguagem galante. Pode crer. No dialeto carioca, por exemplo, a única forma inequívoca de declarar-se à amada (ou amado) é o clássico "Eu te amo", independentemente da pessoa verbal. Pois é, caro leitor. Nem no século XIX nossos maiores escritores obedeciam irrestritamente à ditadura da pessoa verbal. Você duvida? Pois os romances de Machado de Assis e as peças teatrais de Artur Azevedo alternam o tu e o você. Nossa língua falada quase sempre misturou a segunda e a terceira pessoas. Só um otário como eu submeter-se-ia (gostou da mesóclise?) a traduzir uma peça de Shakespeare toda em segunda pessoa, sem jamais usar o você. Nossos maiores poetas populares, por amor da eufonia, também nunca foram escravos da gramática (cf. Chico Buarque: Todo ano eu lhe fazia/Uma cabrocha de alta classe/De dourado eu lhe vestia/Pra que o povo admirasse). Sem falar no baianês, que não usa o tu nem que a vaca tussa. E nos gaúchos, que só fazem tutear.