A renuncia da juventude
A renuncia da juventude
Como médico, trabalho com a dor e o medo do ser humano, e para não fugir a regra, há poucos dias atrás atendi uma senhora de, aproximadamente, cinqüenta anos que se mostrava muito ansiosa e com um número enorme de queixas. Falava sem parar e não dava oportunidade para que eu seguisse o curso normal da entrevista. Vendo que aquele desfile de queixas vagas não chegaria a lugar algum, perguntei:
- Hoje, qual é a sua queixa principal, o que mais lhe preocupa?
Ela, um tanto quanto sem jeito, respondeu:
- Sabe doutor, eu não queria ficar velha. Tenho um horror, um medo enorme da velhice. Quero do senhor uma ajuda para eu não envelhecer.
Após uma longa entrevista e um acurado exame físico, tentei passar para aquela gerontofóbica senhora uma conduta mais admissível ao seu problema. Busquei nos arquivos de minha formação profissional e em todos os meus conhecimentos gerais o que era o melhor para aquela situação. Enquanto eu fazia anotações em sua ficha médica, ela insistia de maneira incisiva: “quero uma forma para não envelhecer”. Dada a sua insistência e já não tendo mais argumentos para convencê-la, falei:
- Conheço uma forma infalível para não envelhecer. – Ela arregalou os olhos e perguntou:
- Qual?
- Morrer precocemente. Morrer enquanto os raios da juventude, ainda, irradiar alguma chama.
- Como o senhor é pessimista! – comentou atonitamente.
- Para ser sincero com a senhora, foi a resposta mais plausível ao seu problema.
Ela agradeceu-me um tanto quanto desapontada, deu-me um forte abraço e falou que, no retorno, continuaria o nosso papo.
Há noite, quando cheguei a minha casa, comecei a refletir: como as pessoas têm medo da própria vida, medo de viver plenamente, e a perda da juventude mais parece uma sentença de final. Mal sabem as pessoas que a juventude não acaba; ela diminui com o passar dos anos, torna-se mais leve e fácil de carregar. A juventude renasce quando amamos, quando criamos coisas novas e, principalmente, quando redescobrimos a vida. Perder precocemente a juventude é perder a capacidade de sonhar, e perder a capacidade de sonhar é carregar por muito tempo um peso além de nossas capacidades.
Gerontofobia é um termo para expressar o medo doentio com o envelhecimento, e o medo excessivo do envelhecimento significa a renúncia precoce da juventude.
Roberto Pelegrino