O trem aposentado
Quando era menino, lembro bem, fazia viagens próximas.
Muitas eram de trem, para Friburgo.
Tempos felizes que a presente vida não aceita, acha retrógrada. Quase tudo hoje, que na minha infância era tão atraente, é coisa do passado, arquivo morto.
Não sou velho nem moço. Mas tiraram um prazer que a todos deslumbrava, como por exemplo, subir a serra com o trem usando cremalheira – os novos sabem o que é cremalheira? – para poder enfrentar a íngreme subida da serra.
Era um romântico passeio, quando merendas eram levadas, antigas máquinas de fotografar registravam paisagens belas, muitas vezes entre nuvens, quando uma proteção tinha que ser usada, por mais inadequado fosse o capote ou manta.
Não existe mais esta estrada. Não existem mais muitas estradas, que foram substituídas pelo asfalto idiota, onde temos que prestar atenção a tudo, pena de por ali ficarmos em definitivo.
É a fumaça queimada do diesel dos alucinados ônibus, a poluente descarga dos automóveis, a fila quilométrica, a dita modernidade, enfim.
Acabou-se a poesia, a introspecção, o prazer dos olhos e da alma. Uma viagem gostosa, que demorava longo tempo apreciando paisagens, respirando o ar da serra, prestando atenção nas flores e árvores da mata são coisas do passado.
Quem pensa nisso é homem ultrapassado, não sabe que o trem-bala é a melhor comodidade, capaz de atingir velocidades inacreditáveis...
Ele pode e deve existir, é claro. Cidades distantes têm que ser unidas por veículos velozes. Mas qual a razão de se exterminar com a beleza da viagem demorada, quando todos podiam sentir a natureza externa e interna? Não tem resposta, tolice pensar.
Tudo em nome do progresso. Progresso que vai diminuindo cada vez mais nossa camada de ozônio, que não permite a passagem de raios cósmicos, principalmente do Sol, maltratam nossa pele, aqueçam a Terra já ferida, sangrando, pedindo socorro para não sucumbir antes do tempo. Enquanto o Sol brilhar, haverá vida. Mas esta vida ficou ameaçada com o aquecimento global, com a poluição que invadiu o planeta.
O velho trem não se prestava só ao deleite de todos nós. Hoje se paga uma verdadeira fortuna para que produtos sejam escoados por caminhões, estragando as já deterioradas estradas, aumentando preços e causando desastres. Ou será que alguém quer enfrentar uma carreta desgovernada?
Os norte-americanos foram mais felizes. Com estradas férreas que unem todo o país, além de fazerem grande economia, ainda podem desfrutar das flores do campo e da serra. Uma viagem, por menor que seja, cortando os Alpes europeus, lava a alma de qualquer aflito, necessitado ou mesmo descansado que pretende usufruir dos prazeres que ainda temos.
Aqui no nosso país, é passado...