O Tatu e o Colchete Desaparecido

Depois de deixarmos o asfalto, pegamos uma estrada de terra, entramos em um cerrado ralo e seguimos por uma estrada estreita que nos levaria até o rio.

De repente, esbarramos numa cerca fechando a estrada e nela havia um colchete. Eu, desci do jipe para abri-lo. Tentei uma, duas, três vezes. E nada. O colchete não cedia. Estava muito pesado e esticado. Meu colega, que dirigia, desceu para me ajudar. Só depois de muito jeito e força conseguimos abri-lo.

Fechá-lo foi outro trabalhão. Depois continuamos a viagem até o local programado. Ficamos por lá, trabalhando, aproximadamente, duas horas. Como já passava do meio dia e tínhamos fome, resolvemos lanchar. Quando decidimos voltar o sol já ia bem alto.

Na volta, ao nos aproximarmos da cerca, notei que meu colega olhava de um lado para outro, intrigado. Diminuiu a velocidade do jipe e parou.

- O que foi, perguntei.

- Não sei, mas aqui não havia um colchete? Aquele difícil de abrir.

- Tem certeza que não pegamos outra estrada?

- Impossível não havia outra, disse ele.

O colchete não estava lá. Aquele colchete pesado, difícil de abrir, tinha desaparecido. O local, não tínhamos dúvidas, era aquele. Não tinha como pegar um outro caminho. Só havia aquela estrada. O vão da cerca mostrava as marcas do carro. Nós passamos por lá, com certeza.

Havia um mistério no ar. Quem tirou o colchete? Perguntamos a alguns trabalhadores de uma plantação de arroz, próxima, se tinham visto alguém retirar o colchete. Ninguém viu. Sem ter uma explicação, resolvemos ir embora.

Atravessamos a cerca, mas quando já estávamos a uns duzentos metros dela, surgiu em nossa frente um tatu, obrigando o meu colega a parar o jipe bruscamente. Ficamos estáticos por alguns minutos, olhando o animal que a poucos metros do jipe tinha os olhos fixos em nós. Dava a estranha sensação de fantasma, embora nenhum de nós acreditasse nisso.

Buzinamos, mas ele não saiu da estrada. Não estava morto, nem adormecido. Apenas, imóvel. Parecia surdo e cego ou fingia não ouvir a buzina do carro, pois insistia em não sair da nossa frente. Só nos restou a opção de descer e pegá-lo.

Nem com a minha aproximação ele se mexeu. Não fez nenhum movimento para fugir. Simplesmente continuou me olhando. Parecia hipnotizado. Peguei-o e o levei para o jipe. Meu colega sugeriu que o levássemos para a cidade e o comêssemos transformado em farofa. Aí eu falei:

- Um tatu magro como esse, parado no meio da estrada, deixando-se pegar facilmente, só podia estar doente. Vamos deixá-lo aqui.

Decidimos então deixá-lo lá, mas fora da estrada para que não corresse o risco de ser atropelado. Entretanto, ao colocá-lo no chão, ele saiu em disparada carreira, como se estivesse fugindo de um predador faminto. Ficamos intrigados com aquela reação dele e rapidamente voltamos para a cidade

Durante muito tempo, me lembrei desse estranho episódio. E muitas vezes, refletindo sobre o comportamento daquele tatu, cheguei a pensar que ele quisesse nos contar alguma coisa. Quem sabe, falar onde estava o colchete. Do jeito que as coisas aconteceram era impossível escapar de pensamentos assim.

Na época, contamos esta história para alguns amigos e colegas. Mas, ninguém acreditou em nós. Não aceitavam a idéia de que passamos pela mesma estrada, na volta, e nem que o colchete tenha desaparecido. Todos teimavam em admitir que a cerca fosse a a mesma. Tampouco, aceitaram a história do tatu. Para eles era impossível pegar um tatu com tanta facilidade. Alguns disseram até que estávamos bêbedos e outros nos aconselharam a procurar um medico ou psicólogo. Nunca bebemos em serviço. Mas, essa historia é verídica, podem acreditar.