FELICIDADE É BATER UMA LAJE!
Dez da manhã dum domingo de sol, e o cheiro da carne já perfumava o ambiente.
A caipirinha estava quase a tilintar num copo desses de bar quando alguém gritou:
-Zé cuidado, esse sumo, no sol, mancha a pele!
Mas o Zé, imagina, nem estava preocupado com a pele. Aquilo era um luxo! Trabalhava sob o sol do meio dia há anos, e sequer sabia o que era filtro solar...e aos sábados ainda vendia alguma pela praia...
-Gente metida tem cada uma...era o que achava o Zé, de tais recomendações.
Bom mesmo, era ser feliz como ele.
Embora trabalhasse duro de sol a sol, carregando tijolos, massa, concreto...e assentasse brilhantemente os azulejos, era assim que era feliz! E os Domingos eram feitos para ele!
Há poucos dias "batera a tal lage', quase um batizado do sonho de consumo para os que como ele, mestre da construção, idealizam para si e seus familiares, quando chegam à cidade que promete, vindos do sofrimento lá de cima.
Um sonho a se conquistar na cidade grande, às vezes até maravilhosa.
E era assim com o Zé. Pai de tres filhos, muher nova bonita e dedicada, chegara a ter o que poucos conseguem, uma vida digna vinda do seu ofício.
Enfim ,Zé era feliz."Gemia sem sentir dor"...
E aos domingos era ali, sobre a laje recém edificada que reunia os amigos e a família para brindar a felicidade.
-Zé ,tá pronta a linguiça?
-Tá saindo, "molé"!-dizia o Zé com conhecimento de causa...
E naquele domingo, Zé foi tristemente surpreendido.De laje a laje, a vizinhança não era sempre tão amigável...assim.
Ali existia gente boa, claro, mas ás vezes o infortunio das balas perdidas rondavam a gente de bem.
De cima do morro, naquele conjunto de lajes, o sol quase se ia no horizonte de mar, quando um estrondo atingiu o Zé.
Uma bala se perdera nele a ricochetear em sonhos precoces porém abortados no chão de cimento batido.
E foi assim que Zé deixou aquela laje, no crepúsculo dum domingo ensolarado, sob os olhares aflitos do infortúnio sem lei, para partir para os braços abertos do Cristo Redentor...