Tremido
Sim, a terra tremeu. Brasileiros fanáticos, com seus crânios catastroficamente condicionados, correram para petelecar as teclas do telefone e cobrar respostas. 190, 193, 171... sinto muito, não sentimos nada. A tremidinha fora suficiente para derramar a última gota viscosa que teimava em lambuzar os lábios. Figuras de um take só defenderam suas tonturas apocalípticas. Caiçaras queimados de sol engoliram a cachaça com areia. À toa. Nada de onda, nada de surf em pedras grafitadas. A pirralha que se divertia com o senhor de poucos fios – e muitas notas – sorriu ao ver a luz do carro piscar. Bonito, pensou enquanto enxugava o suor turvo. Viciados sentiram um barato diferente, as veias inchadas, o suspiro desafinado. Alguém parou o tempo que tentamos acelerar. Pais penduraram suas filhas em sujas janelas da alma. A culpa é do tremor... o mesmo tremor que enche o sangue de mingau grosso. Ansiosos desistiram pela metade do que nunca fizeram por inteiro. Dramáticos choraram a trepidação irregular das venezianas. Bêbados se irritaram com o ruído das pedras de gelo. Putas juraram cobrar adicional pela tremida não-programada, culpa do homem do tempo, o que é meu tá guardado. Moleques de rua sujos estouraram algumas pedras para esquecer do saculejo que marcava o roxo dos olhos. Crianças armadas xingaram a trepidação da própria fome. A neblina fedorenta manteve o peso sobre as cabeças teleguiadas. Os últimos ossos da macumba desceram a ladeira, sem rumo, com ódio de um nome rabiscado. Sonâmbulos conheceram seus panos molhados, encharcados em realidade. Acordei assustado e com saudade. Desequilibrado.
Sim, a terra tremeu.
E não mudou picas.