Das gaiolas, dos pássaros e do amor.

Você gostaria de ser um pássaro? Certamente quem cuida de aves não gostaria. Estranho ver esse gosto em manter pássaros presos, pois para mim, passarinho bonito é aquele livre, que vai voando, e mais bonito ainda são aqueles que aparecem no meu quintal sem eu esperar e canta um pouco para mim.

Mas os homens sempre inventaram prisões. Primeiro inventaram as palavras, não que palavras sejam algo ruim, não são mesmo, mas são apenas símbolos, entretanto o homem se tornou escravo do que inventou, inventamos as palavras e agora somos escravo delas. Os homens inventam deuses, céus e infernos, religião, e não conseguem se libertar destas coisas. Não tiveram mais o que fazer inventaram as gaiolas...

Rubem Alves diz que “Pássaros engaiolados são pássaros sob controle. Engaiolados, o seu dono pode levá-las para onde quiser. Pássaros engaiolados sempre têm um dono. Deixaram de ser pássaros. Porque a essência dos pássaros é o vôo”, é assim que nós vivemos também, engaiolados e sob controle. Controlados por nossas crenças (que nem são nossas), controlados pelo sistema, e o pior, controlado por nossos amores.

Amor é como pássaro, bom e bonito mesmo é aquele livre, que vê a gaiola aberta sai para dar uma voltinha, mas sempre retorna, porque a segurança é o melhor sustento. Mas a gente não gosta nem de amar e nem de pássaros. Porque não amamos como convém. Amamos o outro e não o fato de simplesmente amar. Daí criamos posse pelo objeto amado, assim como os pássaros, o aprisionamos não pelo amor a ele, mas pelo prazer que a posse nos dá. Toda posse é igual às convicções, “são prisões” (Nietzsche), certamente que o maior problema de quem ama é a convicção de que ama e de que é amado. Não consegue conviver com a dúvida e a dor da perda, não é livre nem deixa ser livre, assim é o falso amor, opressor. Citando ainda o Rubem Alves ele diz “Amar é ter um pássaro pousado no dedo. Quem tem um pássaro pousado no dedo sabe que a qualquer momento ele pode voar”, o pássaro não tem obrigação nenhuma de permanecer no dedo, mas o mão que segura a ave tem a obrigação de deixa-lo escolher. Acho que sei porque aprisionamos quem amamos e aprisionamos os pássaros, porque não admitimos a idéia de ficar só, certamente porque não aprendeu o alerta de Sartre expresso assim: “Se você sente solidão quando está só, então está em má companhia”, somos nossa melhor companhia, os outros são apenas complementos do nosso ser, somos obrigados somente a termos a nós mesmos,”Nasci para satisfazer o grande desejo que eu tinha de mim mesmo” (Sartre). Quando obrigamos alguém a ficar em nossa gaiola deixamos de nos amar e te expressar algo ao outro. Desconfio de quem me exige amor, sem a paciência da conquista.

Por isso, retorno à Rubem Alves falando que “O ódio não suporta a idéia de ver o outro longe... O ódio segura, para que o outro não seja feliz. O ódio gruda mais que o amor. Porque o amor deixa o outro voar”, esse “amor” opressor é ódio, egoísmo, medo de ser infeliz, mesmo que isso custe a felicidade do outro. É como o falso deus cristão, que está impregnado na cabeça de muita gente, um deus que cria o inferno para que atráves disso mantenha suas criaturas sempre perto dele, e ainda chamam a esse deus de “deus de amor”. É útil citar a Escritura, no texto do Tiago capítulo 4:5 quando ele diz: “Ou cuidas vós que em vão diz a Escritura: O Espirito que em nós habita tem ciúmes?”, porque um ser que ama deixa o amado livre e o ciúme são as grades da prisão. Não dá para amar e ter ciúmes pois o ciúme é aquela dor que dá quando percebemos que a pessoa amada pode ser feliz sem a gente.

Assim, se eu amo o fato de amar meu amor, então não criou para eles um inferno, uma prisão, mas criou um céu e deixo as portas abertas para que os olhos contemplem todo horizonte e possibilidades e que tenha a oportunidade da escolha, sem que isso implique em castigos. Não existe castigo maior para quem ama, do que a conciência de que não se é amado. Amamos de fato quando somos canal de libertação, muitos pensam que agem certo quando fazem de tudo para manter um amor, o verdadeiro amor precisa do mínimo de algo para se manter, na verdade só precisa de uma coisa, que aja amor, qualquer esforço maior não passa de uma construção de gaiolas.

E eu quero amar, e quero ver e ouvir os pássaros... mas que eles aparecem para mim quando desejarem, porque toda vez que meu desejo for maior do que o do meu amado então estarei fazendo uma prisão. E no final das contas o maior preso estará sendo eu.

Wagner Martins
Enviado por Wagner Martins em 22/04/2008
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